O mundo tem fome e o Brasil, alimentos

O mundo conta com a produção de alimentos da agropecuária brasileira. Ora, nem só de pão vive o homem. A humanidade também se alimenta de asfalto, trilhos e terminais marítimos. Não basta produzir alimentos. Eles precisam da logística para chegar à mesa do consumidor. Para alimentar o planeta de forma competitiva, o novo celeiro mundial chamado Brasil começa enfim a entrar nos trilhos e transformar os caminhos da safra até seus portos.

Em 2021, o Brasil exportou um total de US$ 280,8 bilhões em produtos agrícolas, minerais e industriais. Dos cinco principais produtos exportados, três são alimentos: soja, açúcar e carne bovina. Os outros dois são: ferro, o primeiro, e petróleo, o terceiro, nas exportações.

A exportação de soja em grãos passou de US$ 28,6 bilhões em 2020 para US$ 38,5 bilhões em 2021. A exportação do resíduo de soja, o farelo resultante do processo de extração do óleo, atingiu US$ 5,9 bilhões em 2021, contra US$ 4,7 bilhões em 2020. Foi o sétimo produto em exportação, na frente do café com US$ 5,8 bilhões. O resíduo de soja é muito utilizado em rações animais. Sua composição química apresenta vantagens com relação à soja integral: teor menor de carboidratos e maior de proteínas.

O complexo soja (grãos e farelo) é hoje a principal exportação do país. Foram US$ 44,4 bilhões exportados em 2021, contra US$ 40,7 bilhões do minério de ferro. Ele alcança 29% do total dos dez principais itens das exportações. Mais de R$ 220 bilhões. E envolve mais de 250.000 pequenos, médios e grandes produtores em 20 Estados. A soja é de longe a principal cultura do país em volume e geração de renda. Ela sustenta fábricas de máquinas, implementos, fertilizantes e defensivos para as fazendas. E gera matéria-prima a indústrias de biodiesel, automobilística, agroalimentar, farmacêutica, cosmética, etc.

O açúcar, o quarto produto das exportações brasileiras, passou de US$ 7,4 bilhões para US$ 8  bilhões em 2021. E a carne bovina, mesmo com o embargo chinês, cresceu de US$ 6,7 bilhões para US$ 7 bilhões.

Em 2021, o país produziu 221,6 milhões de toneladas de soja e milho. É muito alimento. E cada vez mais essa dupla é produzida na mesma terra, em duas colheitas anuais. Só esses dois grãos atenderiam à demanda básica de calorias, por um ano, de quase 900 milhões de pessoas.

Nem só em soja e milho reside a produção de alimentos. O Brasil produziu em 2021 mais de 35 milhões de toneladas de açúcar, presente nos mais diversos alimentos. É muita caloria consumida no Brasil e mundo afora. O país é também um grande produtor de arroz, feijão, amendoim e até de trigo. Quando se fala de produzir alimentos para o mundo, todos esses grãos e o açúcar devem ser contabilizados.

E mais, além dos grãos, o Brasil produz tubérculos, como mandioca (quase 20 milhões de toneladas em mais de 1 milhão de hectares), batatas, batata-doce, inhame e outros de menor expressão (mandioquinha, cará…). E muita fruta, um alimento nobre.

fruticultura promove o desenvolvimento regional, alimenta o país e o mundo. O Brasil é o terceiro produtor mundial (mais 41 milhões de toneladas). Cada vez mais tecnificada, ela ocupa apenas 0,3% do território nacional. São mais de 940 mil estabelecimentos agropecuários (81% de pequenos produtores). Em 2021, empregou 193,9 mil trabalhadores formais, 9% a mais em relação a 2020, e correspondeu a 11,5% dos postos de trabalho na agropecuária. A exportação foi recorde em 2021: US$ 1,2 milhão.

Ainda em alimentos, o Brasil é grande produtor de hortaliças (cebola, tomate, alho, verduras, cenoura…): mais de 10 milhões de toneladas. Só de tomate são quase 4 milhões de toneladas. O país é o décimo maior produtor, atrás de China, Índia, Turquia, EUA, Egito, Itália, Irã, Espanha e México. E mais de 2 milhões de toneladas de tomates são exportadas, com variações interanuais, sobretudo ao Mercosul e aos EUA.

Parte da produção vegetal e de seus resíduos é utilizada em rações e se transforma em proteínas mais nobres, ao alimentar suínos, frangos (carne e ovos), aves em geral, peixes e ruminantes. Quando a essa enorme produção de alimentos se agrega a produção animal de carne e leite, por bovinos, bubalinos, caprinos e ovinos baseados em pastagens nativas e cultivadas, entende-se por que o Brasil participa da alimentação de cerca de 2 bilhões de pessoas, um quarto da população do planeta.

Para atender à demanda mundial, os caminhos da safra têm mudado. Em 2021, regiões acima do paralelo 16° (Norte, Centro-Oeste, Matopiba e o norte de Minas Gerais) produziram 141,9 milhões de toneladas de milho e soja: 64% do total nacional. Foram exportados 38,9 milhões de toneladas (31,1%). O resto, quase 70%, ficou no mercado interno, destinado à alimentação humana e animal, a diversos usos industriais e energéticos, armazenado e negociado como excedente.

O sistema macrologístico de exportação de grãos no Norte evoluiu e incluiu hidrovias, com portos significativos: Porto Velho em Rondônia; Itacoatiara, no Amazonas; Santarém e Barcarena, no Pará; e Santana, no Amapá. Rodovias e a Ferrovia Norte Sul levam grãos ao Porto de Itaqui, no Maranhão, responsável pelo maior volume de exportações de alimentos da região em 2021. Foram 13 milhões de toneladas de grãos exportadas, seguido de perto por Barcarena/Belém, com 12,4 milhões de toneladas.

Uma carga de soja produzida em Sorriso (Mato Grosso) segue de caminhão pela BR 163, cujo asfaltamento foi concluído há cerca de dois anos pelo atual governo federal, até Miritituba/Santarém (Pará), ao custo médio de US$ 59 por tonelada. De lá vai de barcaça a Barcarena, ao custo de US$ 18. Segue de navio para a China, a um custo de US$ 79. O custo médio do transporte dos grãos até a China é de US$ 149 por tonelada. O maior custo é transportar grãos por caminhões. O menor é por hidrovias e ferrovias. A soja argentina produzida em Córdoba segue de trem a Rosário, ao custo de US$ 19 por tonelada, e de lá à China, ao custo médio de US$ 84 por tonelada. Quase metade do custo no Brasil!

A agropecuária brasileira é das mais competitivas da porteira para dentro. Basta seus produtos colocarem o pé na estrada e lá se vai grande parte dos ganhos. O país precisa melhorar sua logística com base em trens e hidrovias. Apesar das dimensões continentais, as ferrovias estavam abandonadas, em precária conservação e operação. Após mais de 70 anos de abandono do modal ferroviário, ocorreu uma mudança de postura do governo federal, em favor da iniciativa privada, a partir de 2019. Um plano arrojado de concessões ferroviárias foi lançado: o Protrilhos.

Já são 78 requerimentos para construir e operar ferrovias, com previsão de R$ 237 bilhões em investimentos privados e 2,6 milhões de novos postos de trabalho diretos e indiretos. Desses requerimentos, 27 já tramitaram no governo, indicam R$ 133 bilhões em investimentos e quase 10 mil quilômetros de novos trilhos somados à malha ferroviária, para facilitar o escoamento de cargas minerais, agrícolas e conteinerizadas. A retomada da malha ferroviária auxiliará no crescimento de todos os setores da economia.

As novas ferrovias trarão mais opções ao transporte de carga, menores custos ao operador e ao consumidor, mais velocidade e menos danos ambientais. Assim seria com a construção da Ferrogrão, para levar a soja de Sinop até Miritituba. Apesar de todas as licenças, após anos de estudo, assumida por investimentos privados, a Ferrogrão teve sua implantação suspensa há mais de um ano, por decisão do ministro Alexandre de Moraes, do STF, atendendo a uma ação do Partido Socialismo e Liberdade (Psol). Agora em junho, o julgamento em plenário para destravar o início dessa obra foi retirado da pauta pelo presidente do STF, sem explicações. A Ferrogrão segue sem data para ser apreciada no plenário. Além do prejuízo ambiental e econômico e da insegurança jurídica, é um péssimo exemplo para qualquer investidor nacional ou estrangeiro em projetos de longo prazo.

Nos primeiros cinco meses deste Ano da Graça de 2022, as exportações brasileiras cresceram cerca de 30% em relação a 2021 e encostaram em US$ 70 bilhões! O país nos trilhos é garantia de um futuro sustentável para a produção agropecuária e à entrega de alimentos ao mundo. Isso se arbitrariedades lesa-pátria não o inviabilizarem. Se isso ocorrer, a explicação sobre a incapacidade brasileira em atender à demanda da FAO e da OMC por uma maior produção de alimentos já foi dada pelo dramaturgo Nelson Rodrigues: Subdesenvolvimento não se improvisa. É obra de séculos.

Fonte: Revista Oeste, 15/07/2022

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