Em meio à expectativa da divulgação do edital de licitação do trem de alta velocidade (TAV), que estava programada para hoje pelo governo federal e foi adiada pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) na sexta-feira – pois aguarda a aprovação do Tribunal de Contas da União (TCU) -, especialistas e entidades de classe já falam sobre o impacto social e econômico que a obra poderá trazer ao País, como a redução de custos do transporte de commodities.
Apesar dos atrasos, que acabarão por impedir que a obra fique pronta antes da Copa do Mundo e dos Jogos Olímpicos, o clima é de otimismo, principalmente no que diz respeito ao possível transporte de cargas. “O grande problema do Brasil, quando se fala em Logística, é que o transporte para longas distâncias e com alto volume sai muito caro por causa da falta de alternativas; isso impacta negativamente no preço final dos produtos”, explica o especialista em Logística e Transportes da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Dênis Borenstein. Com a construção do TAV, porém, a economia pode ter reflexos positivos, com aumento de até 30% dos lucros a longo prazo.
“Nenhum país do tamanho do Brasil atinge o desenvolvimento sem investir em ferrovias e outros modais. Mesmo em países pouco desenvolvidos o transporte é fundamental. É o caso da Índia, por exemplo, que tem a maior rede ferroviária do mundo”, afirma. Borenstein explica ainda que, até agora, o transporte rodoviário predomina no Brasil devido ao baixo custo de construção, mas que a longo prazo fica desvantajoso. “O custo por quilômetro mais barato para construção ainda é a rodovia, mas o custo de utilização é muito alto. Além disso, a manutenção e o combustível também são mais caros e existe o problema da falta de segurança. Roubos de cargas são cada vez mais frequentes nas rodovias brasileiras”, diz Borenstein.
Logística
De acordo com um levantamento realizado pela Fundação Dom Cabral, publicado em outubro passado, cerca de 13% do capital das principais empresas do Brasil é atualmente comprometido justamente por custos na área de transporte e logística.
Para compor a estatística, a Fundação afirma ter coletado dados com 126 empresas, que somadas representam cerca de 20% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional, para se ter ideia da representatividade do estudo.
Os setores que mais sofrem são as indústrias de Bens de Capital (22,69%), Construção (20,88%) e Mineração (14,63%), que estão acima da média ponderada de custo logístico para o agregado de setores. Além disso, o Brasil tem um custo logístico de aproximadamente 12% do PIB, enquanto nos Estados Unidos, por exemplo, o custo é de 8%.
Comparando-se os custos dos dois países, a pesquisa conclui que o Brasil perde US$ 83,2 bilhões por ano por conta de problemas ligados a transporte de cargas. Questionadas sobre quais fatores tendem a aumentar o custo logístico no Brasil, 54,5% das empresas declararam que as “Estradas em más condições” representam a maior causa deste aumento nos gastos. Também foram citadas como fatores que aumentam o custo logístico: “burocracia governamental” (51,2%), “restrição de carga e descarga nos grandes centros urbanos” (49,6%) e “falta de concorrência entre modais de transporte” (48,3%). Para reduzir o custo logístico, 70,7% das empresas entrevistadas apontam como solução a “melhor gestão das ferrovias com integração multimodal”.
Desenvolvimento
A Associação Nacional de Transportadores de Passageiros Sobre Trilhos (ANPTrilhos) diz que a principal expectativa do órgão sobre a publicação do edital do TAV é que ele seja “bem assinado”. A entidade se queixa de problemas no primeiro edital, publicado (001/2010), que teria sido “mal formulado”. “Tudo estava no mesmo edital, empreiteiras, grupos de projetos básicos, executivos, sinalização, equipamentos. Isso dificulta a contratação”, defende a gerente-executiva da ANPTrilhos, Roberta Marchesi.
Com relação à realização do projeto, porém, não há dúvidas: será extremamente benéfico sob todos os aspectos sociais e econômicos. “Hoje nós temos grupos privados que têm interesse em formar consórcios e investidores internacionais interessados na concessão. O projeto vai trazer ao país uma nova tecnologia, que vai impulsionar toda a indústria”, explica Roberta Marchesi, que comemora o fato de a empresa contratada ser obrigada a transferir a tecnologia de alta velocidade para o Brasil. Roberta destaca ainda outros reflexos da construção: “Vai gerar crescimento do mercado imobiliário, formação de mão de obra, surgimento de indústrias e de comércio nos arredores”, diz.
Apesar do otimismo, especialistas ainda alertam para a necessidade de um acompanhamento rígido do projeto: “É preciso que tudo seja bem projetado, bem estudado e acompanhado, senão vira uma Transamazônica. Por isso interessa a parceria com a iniciativa privada, para que ninguém jogue dinheiro fora”, como argumenta o professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Dênis Borenstein.
Entre as empresas citadas pela ANTPTrilhos como principais concorrentes à licitação do TAV estão as multinacionais Alston (França), Caf (Espanha) e Bombardier (Canadá), vinculadas à associação. O interesse, segundo o especialista em Logística e Transportes da UFRGS Dênis Borenstein, é saudável. “É um investimento confortável, já que o Governo propõe a compra da capacidade de transporte da empresa e se responsabiliza por possíveis prejuízos”, explica.
Por DCI – São Paulo/SP – Luiza Silvestrini, 26/11/2012