Laboratório inédito no estado desenvolve pesquisas sobre o setor ferroviário

Em setembro, o governo federal lançou um pacote de concessões de 91 bilhões de reais a serem investidos na reforma e construção de ferrovias brasileiras ao longo dos próximos 25 anos. Desse total, o Ministério dos Transportes se comprometeu a aplicar cerca de 56 bilhões até o ano de 2017. “Para que estes recursos sejam bem aproveitados, torna-se essencial o desenvolvimento de pesquisas na área de transporte ferroviário”, afirma o engenheiro civil, Luiz Antônio Silveira Lopes, professor e pesquisador do Instituto Militar de Engenharia (IME), onde coordena o Laboratório de Ensino e Pesquisa em Engenharia Ferroviária do Estado do Rio de Janeiro (Labfer). Inaugurado no final de 2011, com auxílio do edital Apoio às Engenharias, da FAPERJ, o laboratório é o único de uma instituição de ensino superior voltado para o desenvolvimento de pesquisas no setor.

País de dimensões continentais, o Brasil tem uma rede de ferrovias bem pequena, se comparada a países de dimensões semelhantes. Para se ter uma ideia, enquanto os Estados Unidos contam com 228.464 km, a Rússia com 87.157 km e o Canadá com 48.909 km, o Brasil tem apenas uma extensão 29.798 km. Silveira Lopes explica que durante a segunda metade do século passado, o País investiu muito pouco em suas ferrovias, que se tornaram velhas e perderam mercado para o transporte rodoviário e aéreo. O investimento em trens só foi retomado no final dos anos 1990, com a privatização do setor. “As empresas que assumiram melhoraram muito o desempenho das ferrovias existentes, mas não puderam construir novas vias férreas nem atualizar milhares de quilômetros de linhas antigas sob sua gestão. Além disso, dois terços da malha ferroviária brasileira passaram a ser subutilizados”, complementa. Assim, o transporte ferroviário de passageiros entre os estados praticamente acabou e o de cargas passou em grande parte a ser feito nas rodovias. As concessionárias das ferrovias passaram, então, a se concentrar em setores mais lucrativos, como o transporte de minério, soja e outros grãos para exportação.

Em consequência desses fatores, as instituições de ensino superior fluminenses passaram a desenvolver estudos na área de pavimentação de estradas, ignorando o setor ferroviário. “O resultado disso é que, hoje, assistimos a um congestionamento do espaço aéreo e dos aeroportos, além de um excesso de veículos nas estradas, o que prejudica tanto os passageiros quanto a economia como um todo. Assim, é essencial investirmos na melhoria do sistema ferroviário existente e encontrarmos maneiras para ampliá-lo”, explica o coordenador do Labfer. Para as empresas ferroviárias de transporte de cargas, os principais gastos são o consumo do diesel, o desgaste do conjunto roda-trilho e o custo de mão de obra. “No caso do transporte de passageiros, que em sua maior parte é movido por tração elétrica, a importância do diesel diminui, mas os outros dois itens se mantêm entre os mais importantes”, completa.

Silveira Lopes destaca que poucas pessoas sabem da tradição do exército em obras ferroviárias. “Até a década de 1980, o 10º e o 11º Batalhões de Construção eram denominados Batalhões Ferroviários. Eles foram responsáveis pela construção de três mil quilômetros da malha ferroviária brasileira, o equivalente a mais de 10% do total das nossas ferrovias. A título de comparação, tal extensão, na Europa, se construída de forma contínua, permitiria ligar as cidades de Madrid, na Espanha, a Moscou, na Rússia”, afirma. Em 2005, uma equipe da MRS Logística, empresa de transporte ferroviário de cargas, responsável pelo mercado de Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo – o mais importante do País – procurou o IME para desenvolverem um curso de especialização nessa área, retomando pesquisas paradas e formando novos técnicos. “O curso foi um sucesso e passou a contar, no ano seguinte, com profissionais da empresa siderúrgica Vale. Assim, passamos a incluí-lo em nossa pós-graduação, além de submeter a ideia de um laboratório para desenvolvimento de pesquisas na área a um dos editais da FAPERJ”, recorda

No Labfer, professores e pesquisadores do IME, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), do Centro de Estudos e Pesquisas Ferroviárias (Cepefer) e de empresas ferroviárias contam, para seus estudos, com uma infraestrutura de computadores adequados à aquisição e armazenamento de dados numéricos e softwares de simulação de engenharia de transportes. “Nosso objetivo principal é desenvolver pesquisas para uniformizar ao máximo a frota de trens, aumentar-lhes a velocidade e, com isso, diminuir o intervalo entre a chegada de uma composição e outra nas plataformas”, destaca Silveira Lopes. “Esperamos expandir a capacidade de transporte de carga através da ampliação de pátios de cruzamentos e de terminais, do aumento da capacidade de transporte por eixo, de reparos nos vagões e em toda estrutura das ferrovias, além de promover estudos de ligas especiais para aparelhos de choque e de tração, trilhos, rodas e estruturas responsáveis por suportar os eixos – os chamados mancais”, acrescenta.

Silveira Lopes explica que as pesquisas desenvolvidas no Labfer se dividem em três áreas: análise da dinâmica ferroviária, simulação computacional aplicada a sistemas ferroviários e manutenção baseada na confiabilidade. “No primeiro caso, as pesquisas vem se concentrando em analisar os veículos, investigar o centro de gravidade e outros problemas que eles possam ter, além de pesquisar o desenvolvimento de novos tipos de vagão”, afirma. Na simulação, os pesquisadores buscam reproduzir em computador o funcionamento dos pátios de cruzamento de trechos das ferrovias. “A manutenção também é foco de nossos estudos. Importamos da aviação o conceito de prever o que deve ser trocado antes que isso seja necessário”, completa.

 

Apesar de o Labfer existir há pouco mais de um ano, suas pesquisas já vêm apresentando resultados. No ano passado, 16 trabalhos desenvolvidos em seus cursos, assim como no mestrado, foram selecionados para participar do maior congresso mundial do setor, o International Heavy Haul Association (IHHA), na China. “Além disso, um dos projetos dos nossos alunos foi vencedor do Prêmio Maxion de Tecnologia Ferroviária, oferecido pelo maior fabricante nacional de vagões. Outros seis alunos receberam menção honrosa”, complementa. “A ideia agora também desenvolvermos parcerias com empresas de transporte de passageiros, como a Supervia e o Metrô, aqui do Rio de Janeiro. Esperamos contribuir para a futura implantação do trem de alta velocidade que o governo federal pretende construir nos próximos anos para ligar o Rio de Janeiro a São Paulo”, conclui.

Fonte: FAPERJ – extraído da ANPTRILHOS, 17/12/12

 

 

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