Novas regras para renovação de ferrovias

A revisão dos parâmetros de renovação das concessões de ferrovias, conduzida pelo Ministério dos Transportes, será concluída na próxima semana. A nova percepção sobre como deve ser usado esse mecanismo será aplicada aos quatros pedidos das concessionárias Ferrovia Centro-Atlântica (FCA), Rumo Malha Sul, Transnordestina Logística e Ferrovia Tereza Cristina (FTC). Em seguida, a discussão será com concessionárias que assinaram a renovação no governo Jair Bolsonaro.

No dia 25 de maio, serão concluídos os relatórios do grupo de trabalho criado pelo ministério para tratar do tema. Os pontos críticos levantados consideram pareceres do Ministério da Fazenda que foram ignorados, em 2018, quando o governo analisava os primeiros pedidos de renovação de contratos no setor.

Há cinco anos, a equipe econômica defendeu que não se justificava a opção pela renovação dos contratos, considerada uma excepcionalidade, pois o caminho usual é a licitação. O mecanismo era contestado em razão do volume de investimentos adicionais propostos pelas concessionárias, aquém do esperado.

Foto: Luiz Santana – JM1 (Jornal das Montanhas)

 

A precificação dos ativos da concessionária é, por exemplo, um dos cálculos que o governo tem revisitado. Se for constatado que o valor está subestimado, pode ser exigido um aumento do volume de investimento.

Dois assessores diretos do ministro dos Transportes, Renan Filho, foram escalados para coordenar a preparação dos estudos econômicos e fazer a interlocução com o setor. Ao Valor o secretário-executivo, George Santoro, e o secretário nacional de ferrovias, Leonardo Ribeiro, disseram que o objetivo do governo é fazer a conta correta e melhorar o funcionamento das ferrovias com medidas para elevar produtividade e qualidade do serviço, além de ampliar a competição com novos operadores.

“Talvez precise de nova legislação, mas a gente está pensando agora em ter um portfólio normativo infralegal, com decreto e portarias”, disse Ribeiro. O secretário-executivo sinalizou que boa parte das novas normas será lançada ainda no primeiro semestre.

Não queremos gerar insegurança nenhuma sobre o que foi decidido no passado” — George Santoro

Além de estabelecer novas condições para a renovação dos contratos, o governo quer chamar as concessionárias que já prorrogaram as concessões para “ajustar” obrigações definidas por governos anteriores. Santoro explicou que a ideia é, em comum acordo com as ferrovias, usar a margem de ajuste oferecida pelos contratos renovados.

Até o fim de 2022, foram renovados os contratos das Estradas de Ferro Carajás e Vitória-Minas, da Rumo Malha Paulista e da Malha Sudeste (MRS Logística).

“Não queremos gerar insegurança nenhuma sobre o que foi decidido no passado. Não é isso. Vamos cumprir o contrato”, ressaltou Santoro. “As concessões passadas têm os mecanismos contratuais, que é revisão após 18 meses para se verificar algumas situações, além de vários mecanismos de reequilíbrio contratual. Se não houver acordo, o contrato tem mecanismos de arbitragem”, alertou.

Ribeiro afirmou que as próprias concessionárias já estão apresentando pedidos para rever “alguns dispositivos” nos contratos renovados. Algumas demandas, segundo ele, foram levadas pelas entidades que reúnem concessionárias.

A mudança na dinâmica do setor ferroviário pretendida pelo governo deve afetar também a carteira de projetos dos contratos de autorização, possibilidade criada com o marco legal das ferrovias (Lei 14.273/21).

Se de um lado, o ministério pretende ser mais rigoroso com as concessionárias que administram os grandes troncos de malha ferroviária, por outro, quer ajudar a viabilizar “ramificações” na malha, especialmente as chamadas “short lines”.

A classificação das ferrovias de acordo com seu papel e importância para o sistema logístico constará na proposta de regulação preparada pelo governo. Para Ribeiro, a rede ferroviária tem que começar a trabalhar de forma “funcional e integrada” para começar a reduzir custos de logística.

Neste sentido, Santoro defende que, neste momento, mais importante que expandir as ferrovias no Brasil é ampliar a participação do segmento na matriz de transportes, que hoje é inferior a 30%. “Temos uma malha de 30 mil quilômetros que não tem capacidade operacional nem de dois terços dela. Temos que aumentar a capacidade operacional”.

O secretário de ferrovias ressalta que os quatro contratos de renovação, concentram 75% do total de toneladas por quilômetro útil (TKU) transportadas no país. Ele pontua que, além disso, quase a totalidade do que é transportado é de carga própria.

Para diversificar cargas e operadores, os secretários fazem coro na defesa de uma regulação que quebre “barreiras de entradas” para novos grupos.

O economista Claudio Frischtak, especialista em infraestrutura, afirma que a motivação do governo está correta, mas resta saber qual será o “modus operandi” para alcançar os objetivos. “É importante aumentar a eficiência do sistema, utilizar de forma mais racional os ativos existentes e, para tanto, é preciso fazer uma integração inter e intramodal, mas desde que não haja o rompimento de contrato ou isso gere insegurança jurídica.”

Marcus Quintella, diretor da FGV Transportes, também chama a atenção para o risco de “inviabilizar” as concessões existentes ou os avanços do modelo de autorização. “É uma discussão que precisa ser colocada na mesa com todos os players envolvidos. Não pode ser discutida só em nível de governo.”

Fonte: valor.globo.com, 16/05/2023

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