A proibição de voos domésticos na França quando há uma alternativa ferroviária com menos de duas horas e meia de duração entrou em vigor após reiteradas polêmicas que barravam o projeto. Em uma tentativa de acelerar a transição energética e combater as mudanças climáticas, o plano inicialmente anunciado em 2021 foi concretizado nesta terça-feira por meio de um decreto presidencial.
A medida valerá principalmente para viagens aéreas entre Paris e pólos regionais como Nantes, Lyon e Bordeaux, e não afetará conexões. O limite fica um pouco abaixo das cerca de três horas necessárias para sair de Paris e chegar à cidade portuária de Marselha em um trem de alta velocidade.Para fins comparativos, um voo do aeroporto Charles de Gaulle, nos arredores de Paris, até Nantes emite 66,9 kg de dióxido de carbono equivalente (kgCO2e) por viajante. De Orly, o outro aeroporto da capital, até a mesma cidade, as emissões estimadas são de 49,9 kgCO2e por viajante, segundo a calculadora do próprio departamento de aviação civil francês. A média, portanto, é de 58,4 kgCO2e por passageiro.
Foto: Charly Triballeau/AFP
Para fins comparativos, cada passageiro que faz o mesmo trajeto de trem emite o equivalente a 1kgCO2e, segundo dados da Sociedade Nacional das Ferrovias Francesas. Logo, a viagem de avião polui em média 58 vezes mais do que pelos trilhos.
A proibição dos voos de curta distância havia sido incluída na Lei do Clima e Resiliência de três anos atrás e já vinha sendo aplicada na prática, mas algumas empresas aéreas haviam pedido para que a Comissão Europeia, o braço Executivo da União Europeia (UE), avaliasse sua legalidade.
A legislação especifica que os serviços ferroviários em tais rotas deve ser frequente, pontual e suficientemente conectado para atender às necessidades de quem que até então recorria aos aviões. Também devem ser capazes de absorver o incremento no número de passageiros.
A legislação determina que os passageiros devem poder ir e voltar no mesmo dia, tendo passado oito horas em seu destino. O governo já assegurou o apoio da Air France, a maior companhia aérea do país, às mudanças em troca de um pacote financeiro para ajudar a empresa durante a pandemia de Covid-19. As concorrentes foram impedidas de preencher as lacunas.
As novas regras coincidem com debates sobre como reduzir as emissões de aviões particulares. Enquanto deputados do Partido Verde defendem vetar aviões particulares como um todo, o ministro dos Transportes, Clement Beaune, no mês passado defendeu taxas climáticas a partir do ano que vem para quem optar pela modalidade.
A proposta original, apresentada pela convenção cidadã sobre o clima, era para banir quaisquer jornadas aéreas cuja rota ferroviária equivalente levasse até seis horas. Os termos, contudo, foram amenizados conforme o projeto avançava pelo Legislativo.
As medidas vêm em meio à pressão na Europa pela aceleração da luta contra as mudanças climáticas e da necessidade de cortar as emissões no setor de transportes — a aviação sozinha responde por cerca de 3,8% das emissões do bloco. As polêmicas referentes a jatos particulares, principalmente, são cotidianas.
Em setembro de 2022, por exemplo, estrelas do Paris Saint-German como Kylian Mbappé e Lionel Messi foram criticados por pegarem um avião para jogar uma partida em Nanes, cidade que fica a cerca de 2h de trem de Paris. A polêmica aumentou dias depois, quando o técnico Christophe Galtier ironizou afirmando que haviam questionado se poderiam viajar em um “carro a vela”, fazendo Mbappé, que estava ao seu lado, rir.