Apesar das dezenas de bilhões de reais que serão investidos em logística e mobilidade urbana nos próximos anos, o Brasil conseguirá uma redução bastante modesta de suas emissões projetadas de gases estufa até 2020 no setor de transportes, segundo metas que deverão ser incorporadas à Política Nacional sobre Mudanças Climáticas. Os compromissos têm caráter voluntário, mas são uma referência nas negociações internacionais sobre o aquecimento global.
Até o fim da década, a previsão do governo é de que as cidades brasileiras terão mais 165 quilômetros de metrôs e 325 de BRTs (sistemas de ônibus expressos). Enquanto isso, um total de 616 projetos para o transporte de cargas – uma lista que engloba empreendimentos como a Transnordestina e a hidrovia Teles Pires-Tapajós – deve diminuir a dependência da matriz rodoviária, aumentando a participação das ferrovias e da navegação pelos rios.
No entanto, o rápido aumento da frota de automóveis e o próprio crescimento das cargas transportadas limitará os ganhos ambientais, conforme o plano setorial de transporte e de mobilidade urbana para mitigação das mudanças climáticas. O documento, que ficará em consulta pública até agosto, estipula uma meta de reduzir em 2% as emissões de gases de efeito-estufa projetadas para 2020. A meta não é sobre as emissões verificadas atualmente, mas em relação ao crescimento projetado nos chamados “cenários tendenciais” – ou seja, se os investimentos citados não forem concretizados.
Por tratar-se de um país em desenvolvimento, o Brasil não negocia internacionalmente compromissos obrigatórios de redução das emissões, ao contrário das nações desenvolvidas. Mas tomou a dianteira, entre os emergentes, ao assumir metas voluntárias. Adotadas no fim de 2009, às vésperas da reunião sobre mudanças climáticas de Copenhague, as metas brasileiras foram convertidas em lei e preveem redução de até 36,1% em 2020 – sempre tomando por base a curva projetada de crescimento das emissões de gases estufa.
Vários setores já tinham metas específicas definidas, como o de energia elétrica e o de mudanças no uso do solo (desmatamento), mas ainda faltavam áreas como transportes, um setor que representa cerca de 75% das emissões de gases estufa nas grandes cidades. O esforço para reduzir as emissões em transportes, no entanto, soa pouco ambicioso na comparação com as demais áreas.
Nas projeções do governo, as emissões geradas pelo transporte de cargas deverão aumentar de 68 milhões de toneladas de CO2 equivalente em 2010 para 100,5 milhões de toneladas de CO2 equivalente em 2020, mas os investimentos planejados limitarão essa alta a 98,2 milhões de toneladas. Com isso, define-se uma meta de redução da curva de crescimento das emissões de aproximadamente 2%.
As emissões causadas pela mobilidade nas cidades deverão sair de 89 milhões de toneladas de CO2 equivalente em 2010 para 150 milhões de toneladas de CO2 equivalente em 2020, mas caem para 147 milhões de toneladas com os investimentos prometidos no transporte coletivo. O corte é de 2% na comparação com o que os ministérios do Meio Ambiente, dos Transportes e das Cidades chamam de “cenário tendencial”.
“Entende-se que essa redução de emissões deve ser considerada como cobenefício dos investimentos realizados em mobilidade urbana, uma vez que os projetos de transporte público coletivo têm como principal objetivo a promoção da mobilidade para toda a população, por meio de um serviço público essencial, conforme estabelecido na Constituição Federal”, afirma o plano setorial de transportes e mobilidade urbana.
No documento, o governo prevê o aumento de 5% da frota de automóveis por ano e de 1,7% do número de ônibus urbanos, além de participação constante de 50% do uso de etanol pelos veículos “flex fuel”. Há ressalvas no texto submetido à consulta pública sobre o alcance de medidas que só podem ser tomadas por governos municipais, como restrições à circulação de carros em dias ou horários específicos, no sistema de rodízio. Isso pode até ter efeito sobre as emissões totais, deslocando a demanda para o transporte público, mas não pode ser incluído nos cálculos por não ser de prerrogativa da União.
No caso do transporte de cargas, investimentos em expansão das ferrovias e das hidrovias deverão reduzir a participação das rodovias na matriz brasileira, que passará de 58% para 45%, entre 2010 e 2020. No entanto, segundo as estimativas oficiais, a explosão da demanda impedirá que a nova infraestrutura possibilite uma diminuição mais forte dos gases que causam o aquecimento global. Só o transporte de petróleo e derivados aumentará 253% no período, conforme as projeções contidas no documento.
Fonte: Valor Econômico, 19/06/2012