CLUSTERS – UMA FERRAMENTA DE SEGMENTAÇÃO PARA OS TRENS TURÍSTICOS BRASILEIROS

CLUSTERS – UMA FERRAMENTA DE SEGMENTAÇÃO PARA OS TRENS TURÍSTICOS BRASILEIROS

Engª Rosemberg de Oliveira Fernandes

Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ/COOPE

 

RESUMO

Este trabalho apresenta uma ferramenta para segmentação de trens turísticos – a “analise de cluster” técnica multivariada que permite identificar entidades similares nas características analisadas, importante para a definição de estratégias competitivas de mercado e na formulação de modelos de previsão de demanda específicos.

As variáveis selecionadas para utilização na análise de “cluster” referem-se à atratividade do passeio, às características internas do próprio sistema e sócio-econômicas representativas do turismo da região receptora de viagens.

Como contribuição complementar ao estudo, incluiu-se uma proposta de classificação para os trens turísticos nacionais, necessária à identificação e coleta das variáveis associadas à atratividade do passeio.

Das ferrovias turísticas selecionadas para o estudo, em função da disponibilidade de informações por parte das operadoras, foram identificados quatro grandes grupos ou “cluster” de ferrovias turísticas com características homogêneas. Percebe-se, na análise dos resultados, uma estreita relação entre a demanda e as características apresentadas, com ênfase não só nas características sócioeconômicas do município, mas também na atratividade do próprio passeio.

 

 

1. INTRODUÇÃO

 

O turismo nacional vem crescendo vertiginosamente nas últimas décadas. Pesquisas anuais realizadas pela Organização Mundial do Turismo- OMT (1999) mostram que o Brasil ocupava, nesta época, a 290 posição no “ranking” internacional dos países mais visitados do mundo.

Os trens turísticos, parte integrante desta indústria turística, ainda estão num processo inicial de desenvolvimento. Apenas na última década, o serviço adquiriu uma gestão mais comercial, preocupando-se em oferecer serviços complementares e em formar parcerias que redundem em benefícios para todos os setores envolvidos. Este crescimento também pode ser atribuído à recuperação econômica do período de 1996/2000, referente ao plano de ajuste do Governo Federal, conhecido como Plano Real, ocorrido desde 1994, elevando e distribuindo a renda nacional, com reflexos positivos em vários setores da sociedade, inclusive no turismo.

Embora toda esta gama de características seja fundamental, o ponto mais importante de toda a estratégia de desenvolvimento dos trens turísticos e condição básica para sua competitividade residem no foco do negócio, em sua gestão voltada para o campo turístico, em consonância com suas diretrizes. A adequada articulação entre os setores de transporte e turístico é, portanto, condição essencial para que os trens turísticos possam desempenhar seu papel multiplicador, ou seja, atrair cada vez mais serviços e turistas nas regiões onde atuam.

 

A análise do conjunto das características dos trens turísticos, entre os vários segmentos nacionais que o compõe, auxilia na definição e estruturação do setor, sendo importante para o direcionamento das políticas públicas de turismo, beneficiando não só as empresas, mas, e, principalmente, melhorando a qualidade do produto turístico nacional, o que, em outras palavras, significa retorno em demanda e financeiro para o país e suas respectivas regiões.

Se esta visão conjunta do setor apresenta benefícios, também a setorial ou segmentada é igualmente importante. Segmentar o setor pressupõe a identificação de grupos homogêneos e possuem vantagens, citadas por BENI (2000): como: as economias em escala para as empresas turísticas, aumento da concorrência, criação da política de preços e propaganda especializada, modelo de gestão e produtos prioritários, promoção de maior número de pesquisas científicas, dentre outras.

Além da contribuição mercadológica, o uso de segmentações também pode subsidiar o desenvolvimento de estudos específicos, como, por exemplo, os de demanda.

 

Este trabalho apresenta uma proposta de segmentação objetivando a definição de grupos homogêneos de trens turísticos, utilizando, como ferramenta, a análise de “cluster.

 

 

2. ASPECTOS METODOLÓGICOS

 

Dentre as técnicas de análise multivariada, para a segmentação dos Trens Turísticos em grupos ou conglomerados homogêneos, optou-se pela análise de “cluster”.

 

Análise de cluster

“Cluster Analysisé a denominação de um grupo de técnicas multivariadas cujo principal propósito é identificar entidades similares nas características que elas possuem.

O propósito da Análise de “Cluster é alocar objetos em grupos ou conglomerados sugeridos pelos dados, não definidos a priori, tal que objetos em um dado “cluster tende a ser similar a cada outro em algum sentido, e objetos em conglomerados diferentes tendem a ser dissimilares.

“Cluster” pode ser usado para revelar estruturas e relações na amostra. Segundo JOHNSON et al (1994) é uma ferramenta de prospecção de relações tanto entre variáveis como entre elementos. É uma das poucas técnicas sistemáticas que podem ajudar a busca de similaridades ou homogeneidade entre variáveis.

A técnica de análise de “cluster” foi escolhida por simplificar o processo de segmentação, uma vez que não exige a ponderação entre os indicadores selecionados, ou seja, não diferencia variáveis relevantes das irrelevantes.  Encontra os mais consistentes grupos de objetos, ou seja, os mais similares, distintos através de todas as variáveis utilizadas.

 

3. DEFINIÇÃO DAS VARIÁVEIS

 

A técnica da análise de cluster pressupõe a definição e quantificação de variáveis. Para efeito deste trabalho, optou-se em escolher aquelas que estivessem associadas à oferta local, como os atrativos turísticos do passeio, a infraestrutura urbana e as características do próprio sistema ferroviário, que foram denominados “fatores de atratividade” das ferrovias turísticas.

A figura abaixo demonstra os passos metodológicos para obtenção das variáveis respectivas a cada um destes fatores.

 

Figura 3.1 – Etapas Metodológicas da Segmentação

FATOR      1

Atratividade      do Passeio

ITENS

Provenientes      da Classificação Proposta

ATRIBUTOS

VARIÁVEIS      DE ATRATIVIDADE

(VH,      VC, VE, LS)

SEGMENTAÇÃO

ESCOLHA      DE UM SEGMENTO

(Trem      Turístico no qual será aplicado um Modelo)

DEFINIÇÃO DE MODELO ESPECÍFICO

FATOR      2

Internas      do Sistema

FATOR      3

Socioeconômicos      Municipais

VARIÁVEIS      INTERNAS DO SISTEMA

(PAX,      TAR)

VARIÁVEIS      SÓCIO-ECONÔMICAS

(NHOT,      NREST, NMUS, ECO, ETO)

FASE      POSTERIOR

À      SEGMENTAÇÃO

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Embora grande parte destas variáveis pudesse ser obtida diretamente nos próprios sistemas ferroviários ou registros dos municípios, outras, associadas ao “fator de atratividade do passeio” tiveram que passar por uma adaptação, uma vez que representam características qualitativas. Partiu-se, então, para a coleta, nos registros disponíveis, de informações que melhor exprimissem este fator. Nestes termos, foram encontradas algumas classificações nacionais (EMBRATUR) e internacionais (BENI 2000) turísticas, só que para a área de transporte hidroviário. Após uma nova adaptação chegou-se a uma classificação própria para o sistema ferroviário turístico, descrita a seguir:

 

 

 

 

 

4. CLASSIFICAÇÃO PROPOSTA PARA O SISTEMA TURÍSTICO FERROVIÁRIO

 

São propostas, a seguir, seis categorias para a classificação dos trens turísticos nacionais, provenientes de classificações internacionais e nacionais, ligadas ao setor hidroviário, que foram adaptadas ao setor ferroviário em consonância às características operacionais e aos serviços turísticos oferecidos.

Cada uma das categorias é, por sua vez, subdivida em subgrupos ou espécies. As categorias funcionam matricialmente, isto é, cada trem turístico possuirá, necessariamente, pelo menos uma espécie entre as categorias abaixo discriminadas:

 

 

I – Âmbito de Atuação – refere-se à área de abrangência da viagem, sendo classificada pelo número de unidade política que atravessa, quais sejam:

 

¨      Local (dentro de um único município).

¨      Intermunicipal (abrangendo mais de um Município)

¨      Interestadual (mais de um Estado)

¨      Internacional (trafegando entre países distintos)

 

 

II – Uso da Linha Turística – a utilização da ferrovia para fins turísticos nem sempre é exclusiva, podendo conviver com trens de carga ou de passageiros urbanos.

 

¨      Exclusivamente turística (apenas para o deslocamento de turistas). Operam em linhas exclusivas permitindo a existência de vários horários diários.

¨      Turística compartilhada (quando o uso turístico é alternado ao de passageiros em rotas comerciais ou com o transporte de carga). Neste caso, ainda que o uso não seja exclusivo, permite que se estabeleçam roteiros em função da grade horária destes serviços.

¨      Eventualmente turística (quando a operação também é compartilhada com outros sistemas, porém o uso para o turismo só ocorrem em épocas especiais, durante o ano). A circulação, neste caso, é predominantemente efetuada por outras categorias ferroviárias, de passageiros ou carga, mas permite, em determinadas ocasiões, o uso para o turismo.

 

III – Sistema de Propulsão – refere-se ao uso predominante de uma formas de tração dos trens turísticos brasileiros.

 

¨      Vapor – também chamada de “Maria-Fumaça”. São as mais antigas do sistema, por isso considerada de inegável valor histórico;

¨      Diesel – Utiliza derivado de petróleo.

¨      Elétrica – Cabos aéreos alimentam os trens. São as mais modernas do sistema.

 

 

 

IV – Categoria dos Trens -refere-se ao padrão de conforto dos carros de passageiros.

 

¨      Convencional ou Standard (módulo turístico simples)

¨      Executivo ou Luxo (com alto padrão de conforto)

¨      Camarote ou Superluxo (quando uma área específica é destinada ao cliente)

 

 

V – Serviços Internos – considera-se como serviço interno, tudo aquilo que é realizado ou oferecido aos turistas no interior dos trens

 

¨      Serviço à Bordo –  fornecimento de lanches e bebidas, vagão-restaurante

¨      Explanação – guias turísticos internos para apresentação da história da ferrovia e panorama externo;

¨      Recreação – atividades folclóricas, religiosas, recreadores infantis, dentre outros;

¨      Música Ambiente – sonorização interna ou apresentação de grupos musicais.

 

 

VI – Interação na Viagem – nesta categoria os usos se diferenciam pela forma com que o turista interage com os serviços, durante o passeio.  Não se refere aos tipos, mas à forma com que o turista se comporta durante a viagem. Se, de maneira pacífica, inercial ou contemplativa ou de forma intensa, interagindo diretamente com os serviços oferecidos, seja, internamente, ou externamente, afastado do sistema sobre trilhos.

 

¨      Circuito ou Descoberta – é um roteiro no qual pode ser encaixada uma estada ou um circuito a partir de uma de suas estações. Nesta categoria o turista participa, durante a viagem, ativamente do meio externo, fora das imediações do sistema ferroviário.

 

¨      Turístico-Transporte – O turista, de maneira geral, permanece em atitude inercial ou contemplativa. Sua função principal é o deslocamento misto de passageiros e turistas, não havendo escalas intermediárias durante percurso, embora possam existir estações e paradas para embarque e desembarque, durante o trajeto.

 

¨      Temático Interno – Nesta categoria o turista interage de forma intensa no interior do trem, sendo a estação ferroviária seu raio máximo de ação. Acontece em função de uma animação ou de um tema sobre o qual se organiza a vida à bordo, como o trem musical, gastronômico, religioso, natalino, de saúde, dentre outros.

 

VII – Principal Atração – esta categoria se refere ao tipo de atividades que podem ser oferecidas, geralmente relacionadas aos atrativos locais das cidades onde estão inseridos os trens turísticos. Muitos sistemas ofertam mais de um tipo de atividade, o que deve ser adotado com cautela, sob pena de se perder o foco do negócio. Ainda assim, mesmo quando são verificadas várias atividades, deverá ser evidenciado qual delas predominará para efeitos de divulgação externa. É também chamada de vocação da ferrovia.

 

¨      Cultural Histórica – considera-se o conjunto de construções e fazendas centenárias, pontes, túneis e viadutos históricos, incluindo-se, ainda, museus, trens e estações preservadas pelo patrimônio público.

 

¨      Cultural Contemporânea – sua função essencial é integrar todos os benefícios de uma viagem às atividades e serviços culturais do entorno. Percorre, geralmente, as zonas urbanas da cidade, onde se encontram restaurantes, centro culturais, comerciais, teatros, boates, podendo também acessar à parques de diversão, dentre outros.

 

¨      Ecológica – agrega uma série de locais naturais, com ou sem equipamentos receptivos, motivados pelo desejo e necessidade de fruição ou observação da natureza, sua fauna, flora, quedas d’água, relevo da paisagem e aspectos cênicos do entorno.

 

 

 

4.1 UMA SEGMENTAÇÃO PARA OS TRENS TURÍSTICOS BRASILEIROS

 

A partir das informações obtidas na classificação proposta para os trens turísticos foram definidas as variáveis deste fator que serão utilizadas na segmentação.

Embora esta nova classificação esteja em consonância com a legislação turística, verificou-se, posteriormente, que estes atributos deveriam ser agrupados de outra forma, voltados para as características relativas do passeio, isto é, para aquilo que o turista valoriza e que poderia interferir na divulgação da viagem a terceiros e, portanto, no fluxo turístico ferroviário.

Desta forma chegou-se às seguintes variáveis: Valor Histórico (VH), Valor Cultural (VC), Valor Ecológico (VE) e Logística do Serviço (LS).

Para obtenção destas variáveis foram utilizados os mesmos atributos obtidos na classificação proposta, sendo atribuída a cada um deles uma pontuação. A forma de pontuação varia de acordo com a variável. Em algumas delas, a presença de um atributo ou sua ausência significa, respectivamente, valor 1(um) ou 0(zero). Em outras se pontua a quantidade de atributos existentes, isto é, a quantidade de serviços disponibilizados ao turista. Assim, quanto mais serviços maiores o número de pontos obtidos.

Alguns atributos, por serem demasiadamente genéricos, foram ainda subdivididos em características, tendo sido a pontuação efetuada sobre elas.

 

 

4.1.1 VARIÁVEIS DE ATRATIVIDADE DO PASSEIO

 

Valor Histórico (VH) – Dos atributos da classificação proposta, os que melhor configuram esta variável são: sistema de propulsão a vapor e construções históricas e obras de arte especiais, como, pontes, viadutos e túneis, desde que construídas em épocas remotas.

 

Valor Cultural (VC) – formado pelo atributo cultural-contemporâneo, que corresponde aos serviços comerciais, culturais e gastronômicos que podem ser acessados pelos turistas, bem como, pelas paisagens urbanas que podem ser contempladas durante a viagem, ou seja, museus, restaurantes e demais estabelecimentos comerciais. Assim os atributos selecionados para compor esta variável foram: acesso as áreas culturais, comerciais e gastronômicas e paisagens urbanas.

 

Valor Ecológico (VE) – Dos atributos da classificação proposta, os que melhor configuram esta variável são: acesso às áreas naturais e paisagens fauna e flora e relevo observadas durante a viagem.

 

Logística do Serviço (LS) – formado pelos atributos da classificação que interferem positivamente na viagem ou que agreguem valor ao serviço. São características e padrões cujos operadores possuem maior controle. Relacionam-se às atividades internas oferecidas (serviço à bordo, explanação, recreação e música ambiente), à interação do turista durante o passeio (trem-temático), categoria dos trens (convencional, luxo ou superluxo), uso da linha turística (exclusiva ou compartilhada) e o âmbito de atuação (local, intermunicipal etc) da linha turística.

 

Tabela 4.1.1.1 – Variáveis do Fator Atratividade do Passeio – Pontuação dos Trens

ATRIBUTOS

TRENS TURÍSTICOS

A

B

C

D

E

F

G

H

I

J

K

VH = VALOR HISTÓRICO

Trem   à Vapor

1

1

0

1

0

0

0

0

0

0

1

Obras   de Arte especiais

0

0

1

0

1

1

0

0

0

0

0

Construções   Históricas

1

0

0

1

0

0

1

1

1

1

1

TOTAL

2

1

1

2

1

1

1

1

1

1

2

VC = VALOR CULTURAL

Acesso   áreas Culturais

0

0

1

0

1

1

1

0

1

1

1

Acesso   áreas Comerciais

1

0

0

0

1

1

1

0

1

0

1

Acesso   áreas Gastronômicas

1

0

0

0

1

1

1

1

1

0

1

Paisagens   Urbanas

0

0

1

0

1

1

1

1

1

0

0

TOTAL

2

0

2

0

4

4

4

2

4

1

3

VE = VALOR ECOLÓGICO

Acesso   às Áreas Naturais

0

1

1

0

1

1

1

1

0

1

0

Paisagens   Flora-Fauna

1

1

1

1

1

1

1

1

0

1

1

Paisagens   Relevo

0

0

1

0

1

1

1

1

0

0

0

TOTAL

1

2

3

1

3

3

3

3

0

2

1

LS = LOGÍSTICA SERVIÇO

Âmbito   Atuação(Local)

2

1

2

2

0

0

1

2

2

2

2

Uso   da Linha Exclusiva

0

0

1

1

0

0

1

1

1

1

1

Categoria   do Trem (Luxo ou Superluxo)

1

0

1

0

2

2

1

1

0

0

0

Serviço   à Bordo

1

1

0

0

1

1

0

0

0

0

0

Explanação

0

0

0

1

1

1

1

1

0

0

0

Recreação

1

0

0

0

0

0

0

0

0

1

0

Música   Ambiente

1

0

0

0

1

1

1

1

0

0

0

Trem-Temático

1

0

0

0

0

0

0

0

0

0

0

TOTAL

7

1

2

2

5

5

4

4

1

2

1

Trens Turísticos selecionados:

A – Bento Gonçalves               B – Tubarão             C – Corcovado          D – Campinas

E – Litorina Curitiba               F – Trem Curitiba     G –Pindamongangaba/Campos Jordão

H – C.Jordão/S. A Pinhal         I – C.Jordão/Abernéssia

J – Pindamonhangaba/Reino Águas Claras K – São João Del Rey

 

 

4.1.2  VARIÁVEIS INTERNAS DO SISTEMA DE TRANSPORTE FERROVIÁRIO       TURÍSTICO

 

Outro fator relativo à demanda turística ferroviária refere-se às variáveis internas do sistema. Estas variáveis foram obtidas a partir de dados operacionais para o ano de 2000, coletados junto às operadoras de trens turísticos. Considerando-se que muitas informações não puderam ser obtidas pela inexistência das mesmas em alguns sistemas, foram selecionadas apenas três que estão, diretamente, associadas aos fluxos turísticos. São elas:

 

¨      Passageiros transportados – total de passageiros transportados pelo sistema durante o ano. Esta variável poderia ter sido a única selecionada para a segmentação entre os trens turísticos, porém, como se acredita que outros fatores também contribuem para a composição da demanda turística ferroviária, foram selecionados uma série de outras variáveis associadas ao tema em questão. A inclusão desta variável serve de parâmetro para as demais, inclusive de outros fatores.

 

¨      Tarifa –. Sendo a viagem um movimento entre dois pontos, verifica-se que a demanda turística depende tanto das características relativas a estes dois pontos quanto do custo deste movimento Considerando-se que, em alguns sistemas, existem tarifas diferenciadas por tipo de viagem, percurso, composição etária, para simplificação deste estudo, optou-se pela maior tarifa praticada no ano, no percurso de ida, para representar esta variável.

 

 

 

 

 

 

Tabela 4.1.2.1 – Variáveis Internas dos Trens Turísticos – Ano 2000

SISTEMAS

Pass Transp. (ano)

Tarifa (R$)

Bento Gonçalves

81.347

20,00

Tubarão

4.531

5,00

Corcovado

377.716

20,00

Campinas

54.491

16,00

Litorina Curitiba

21.919

70,00

Trem Curitiba

115.075

43,00

Pindam./C Jordão

11.137

30,00

C.Jordão/SAP

43.760

20,00

C.Jordão/Abernéssia

33.670

5,00

Pindamongangaba/RAC

10.298

4,00

S.João Del Rey

49.434

10,00

 

 

 

4.1.3  VARIÁVEIS SOCIOECONÔMICAS DO MUNICÍPIO

 

O terceiro fator que se acredita estar associada à demanda ferroviária turística refere-se às características sócio-econômicas dos municípios nos quais estão inseridos estes sistemas.

RABAHY (1990) aponta a existência de certa correlação entre o tamanho das cidades e o número de turistas. A força de atração de uma cidade está associada, dentre outros fatores, à sua infraestrutura urbana e turística e se comporta como fonte geradora de fluxos a todos os atrativos nela instalados.

Para BENI (2000) a demanda de uma atividade turística particular, ligada a certa distribuição no espaço (como os trens turísticos), é derivada da demanda turística final. Esta demanda final é composta, por sua vez, do somatório das demandas das atividades e equipamentos instalados, como alojamentos, equipamentos de alimentação, de animação, dos recursos naturais, culturais.

Desta forma, a composição dos aspectos sócio-econômicos do município, onde estão inseridas as ferrovias turísticas, pode ser expressa pelas seguintes variáveis:

 

 

– Variáveis da Infraestrutura Turística

 

¨      Número de Hotéis (NHOT)

¨      Número de Restaurantes (NREST)

¨      Número de Museus (NMUS)

 

A fonte utilizada neste subgrupo GUIA QUATRO RODAS BRASIL/2000, embora não represente a totalidade dos dados de uma cidade, possui critérios próprios. Como a base utilizada foi a mesma para todos os municípios, as eventuais falhas existentes são compensadas mutuamente.

 

 

– Variáveis da Infraestrutura Urbana (dados obtidos nos Anuários Estatísticos Municipais 1998 – IBGE)

 

¨      Energia Comercial (ECO) – consumo de energia elétrica comercial no Município

¨      Energia Total (ETO) – consumo de energia total no Município (comercial, residencial, industrial e outras)

 

Embora uma série de variáveis componha este fator, foram selecionadas, neste trabalho, apenas aquelas disponíveis para todos os sistemas de trens turísticos, expressas com seus respectivos valores na tabela 4.6.

 

Tabela 4.1.3.1 – Variáveis Socioeconômicas dos Municípios dos Trens Turísticos

SISTEMAS

NHOT (*)

NREST (*)
(No)

NMUS (*)
(No)

ECO (**)
(MWh)

ETOT (**)
(MWh)

Bento Gonçalves

17

4

1

15.565

168.339

Tubarão

5

2

1

16.309

141.589

Corcovado

97

157

77

3.406.808

13.386.636

Campinas

24

19

8

351.360

1.567.185

Litorina Curitiba

58

59

18

533.934

2.324.386

Trem Curitiba

58

59

18

533.934

2.324.386

Pindam./C Jordão

3

1

1

13.558

762.676

C.Jordão/SAP

46

16

2

21.400

59.970

C.Jordão/Abernéssia

46

16

2

21.400

59.970

Pindamongangaba/RAC

3

1

1

13.558

762.676

S.João Del Rey

23

4

7

10.344

69.340

(*) Dados Guia 4 Rodas (2000)

(**)Dados IBGE – Anuários Estatísticos Municipais (1998)

 

 

5.  SEGMENTAÇÃO DO SETOR

 

Uma vez compiladas todas as variáveis relativas à demanda turística ferroviária, referentes aos fatores de atratividade do passeio, internas do sistema e sócio-econômicas dos municípios onde estão inseridas as ferrovias, se dará prosseguimento à metodologia deste trabalho, passando para a segmentação dos trens.

 

 

5.1 TRATAMENTOS DOS DADOS UTILIZADOS NA ANÁLISE DE CLUSTER

 

As variáveis utilizadas possuem diferentes unidades, por exemplo: tarifa, número de hotéis, dentre outros. Para que as variáveis possam ser mais bem comparadas entre si, e que nenhuma exerça maior influência no resultado final do “cluster”, devido a sua maior escala, elas foram transformados em índices, cujos valores variam entre 0 e 1. A fórmula geral para a construção destes índices é:

 

Índice= (valor observado – pior valor) / (melhor valor – pior valor)

 

Onde o melhor valor correspondente ao resultado observado para um trem turístico que obteve o nível mais satisfatório para o indicador em relação aos demais, recebe índice 1(um).

O pior valor correspondente ao resultado observado para o trem turístico que obteve o nível menos satisfatório para o indicador em relação aos demais, logo este trem turístico receberá índice zero (0) para este indicador.

 

Em seguida é investigado o grau de correlação entre os indicadores transformados, na tentativa de eliminar os indicadores que apresentam altas correlações, uma vez que o grau de explicação desses, já estaria sendo resumido por outro indicador. As variáveis de consumo de energia elétrica, número de hotéis e restaurantes foram retiradas do estudo.

 

 

 

Tabela 5.1.1 – Matriz   de correlação entre as variáveis do estudo

NHOT

NREST

NMUS

ECO

ETO

TAR

PAX

VH

VC

VE

LS

NHOT

1,00

NREST

0,90 1,00

NMUS

0,82 0,98 1,00

ECO

0,79 0,96 0,99 1,00

ETO

0,76 0,95 0,99 1,00 1,00

TAR

0,38 0,34 0,19 0,13 0,13 1,00

PAX

0,78 0,91 0,95 0,94 0,96 0,02 1,00

VH

-0,29 -0,30 -0,20 -0,21 -0,23 -0,24 -0,07 1,00

VC

0,33 0,15 0,05 -0,02 -0,02 0,53 0,00 -0,29 1,00

VE

0,33 0,45 0,39 0,37 0,40 0,60 0,27 -0,59 0,17 1,00

LS

0,07 0,02 -0,09 -0,10 -0,09 0,62 -0,02 0,08 0,34 0,36 1,00

OBS: As   variáveis em negrito foram retiradas da análise de cluster devido à alta   correlação com alguma(s) outra(s) variáveis.

 

 

5.1.1        RESULTADO DA SEGMENTAÇÃO

 

O dendograma a seguir, da figura 4.3, foi obtido com os resultados das variáveis finais, após teste de correlação das variáveis. Neste caso, observa-se que dois grandes conglomerados distintos foram formados (A e B). O grupo A, por sua vez, originou, os grupos A1 e A2 e, este último, os subgrupos A21 e A22. O grupo B deu origem aos grupos B1 e B2. Alguns outros subgrupos ainda poderiam ser identificados, porém, para esta análise, optou-se em restringir o número de “clusters” aos principais grupos, a saber: grupo 1 (A1); grupo 2 (A21), grupo 3 (A22) e grupo 4 (B1 e B2).

 

A

B

A1

A2

A21

B1

B2

A22

Grupo      1

Grupo      2

Grupo      3

Grupo      4

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Figura 4.3 – Dendograma dos Trens Turísticos

 

 

 

6. COMENTÁRIOS E CONCLUSÕES

A segmentação dos trens turísticos mostrou-se uma importante ferramenta na análise do setor. As comparações estabelecidas, através de similaridades e divergências entre os sistemas, permitem que sejam evidenciadas características próprias, comuns aos segmentos, úteis para a elaboração de estratégias de concorrência de mercado, bem como, para futura elaboração de modelos de previsão de demanda mais específicos.

A crescente utilização da análise de cluster, em várias áreas como, na biologia, medicina, marketing, pode estar associada, dentre outros fatores, às vantagens provenientes do esquema de classificação resultante do método, bem como, à facilidade de se agruparem diferentes elementos sem a necessidade de se estabelecerem relações de dependência entre eles. A classificação, ao limitar o número de variáveis em cada extrato, também denominados de nichos de mercado, facilita a observação, manipulação e controle das mesmas.

A técnica de segmentação selecionada, análise de cluster, evidenciou, através da construção gráfica denominada de dendograma, quatro grupos (conglomerados) de trens turísticos, diferenciados em função das características socioeconômicas dos municípios onde estão inseridos (no de hotéis e consumo de energia comercial), da atratividade do passeio (valor histórico, cultural, ecológico e logística dos serviços) e dos aspectos internos dos sistemas (passageiros transportados e tarifa), fatores estes estabelecidos nos objetivos deste trabalho. Das diversas variáveis selecionadas para a composição destes três fatores, algumas foram descartadas pela alta correlação apresentada. A análise dos resultados, a seguir, representa, dentro de cada grupo, os aspectos mais significativos que servem para caracterizar as potencialidades de cada um destes clusters.

O primeiro conglomerado, chamado de cultural contemporâneo, é composto somente pelo trem do Corcovado. Este sistema se destaca não só em termos de demanda, como também, em relação às expressivas características socioeconômicas do município do Rio de Janeiro, no qual está inserido. Este posicionamento permite o desenvolvimento de outras atividades através de parcerias, como por exemplo, em projetos de integração com os bondes de Santa Teresa, repercutindo, por conseguinte, na cadeia logística do setor turístico do município.

O segundo cluster, chamado ecológico, é composto por dois subgrupos, um formado pelos trens de Campos do Jordão/Sto Antônio do Pinhal e Pindamonhangaba/Campos do Jordão; e outro pelo Trem e Litorina de Curitiba. As características mais importantes deste conglomerado referem-se à atratividade do passeio, possuindo elevado valor ecológico, histórico, cultural e logística dos serviços. Também são significativas as variáveis socioeconômicas dos municípios onde estão inseridos, principalmente em relação ao número de hotéis. Quanto às características internas verifica-se que os trens que possuem menor tarifa são mais expressivos em relação à demanda. Entretanto, quando as características socioeconômicas são diferentes, como número de hotéis, o volume de passageiros transportados também se altera. Assim, para este conglomerado, passam a ser consideradas variáveis relevantes a tarifa, o no de hotéis e os atrativos do passeio. Como estratégia de mercado o aproveitamento destes recursos naturais, poderia contribuir de forma consciente e adequada à sua perpetuação e a manutenção do bem estar humano, através do emprego de atividades ecoturísticas em áreas potencialmente aptas para tal, sempre levando em consideração o correto planejamento e manejo dessas áreas.

O terceiro grupo, chamado cultural histórico e contemporâneo, é formado também por dois subgrupos, a saber: um representando por Campos do Jordão/Abernéssia e outro composto pelos trens de Pindamonhangaba/Reino das Águas Claras e Tubarão. Se os outros conglomerados, já citados, podiam ser caracterizados como altamente produtivos e com uma variedade de atrativos, este reuniu os sistemas de baixa demanda, logística, reduzida atratividade do passeio e pouca significância em relação às características municipais. Mesmo com baixas tarifas, os volumes de passageiros transportados são os menores entre todos os sistemas. Verifica-se, no entanto, que segmentos, mesmo que localizados em cidades de médio porte, mas que apresentam infraestrutura hoteleira significativa, assim como, maior número de atividades (culturais, ecológicas), produzem melhores resultados em termos de demanda. Assim, passam a serem expressivas, neste grupo, as variáveis relacionadas aos atrativos do passeio, incluindo a logística dos serviços, assim como, o número de hotéis. Neste grupo de operação eventual, a estratégia de mercado deveria se concentrar na divulgação e promoção do calendário de eventos dos municípios envolvidos.

O quarto e último grupo, chamado de cultural histórico, é diferenciado de todos os demais, principalmente, por seu expressivo valor histórico. É formado por dois subgrupos: um composto pelo trem de Campinas e o outro pelos sistemas de Bento Gonçalves e S.João Del Rey. Embora as características municipais (hotéis e consumo de energia),não sejam tão significativas como as dos 1o e 2o conglomerados, são suficientes para justificar os expressivos números de passageiros transportados. Isto porque souberam associar esta infraestrutura aos atrativos do passeio. Como exemplo, cita-se Bento Gonçalves, 3o em número de passageiros, entre todos os trens turísticos estudados, que além de suas características históricas, reúne as culturais, ecológicas com a melhor logística entre todos os demais trens. A tarifa, embora importante economicamente, nestes sistemas torna-se menos significativa. Prova disto são os valores superiores cobrados por Bento Gonçalves, mostrando a relação que existe entre esta e a qualidade oferecida. Assim, considera-se relevante para estes segmentos a variável relacionada aos atrativos do passeio e à logística dos serviços. A estratégia competitiva deveria ter como finalidade, neste grupo, a promoção de valores históricos regionais utilizando a ferrovia como meio de transporte e atrativo histórico cultural vivo, um trem temático histórico.

 

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