Empresas do setor ferroviário olham para 2013 com a expectativa de que o governo federal dará garantias claras de que vai absorver todo o risco de falta de demanda na malha a ser construída até 2018. Para entidades do setor, o novo modelo de concessão de ferrovias, chamado de open access, carece de atos regulatórios pontuais que expliquem ao mercado como será assegurada essa garantia ao longo dos próximos anos, independente de quem estará na Presidência da República a partir de 2015. A aceitação do mercado sobre essas garantias deve determinar o sucesso ou o fracasso dos leilões.
“O setor privado investirá bilhões de reais em ferrovias e ele precisa de garantias de que esse dinheiro será recuperado”, afirma o presidente da Associação Nacional dos Usuários do Transporte de Carga (Anut), Luis Henrique Baldez. O dirigente pede que as propostas sejam apresentadas aos empresários nas audiências públicas dos empreendimentos, a serem realizadas a partir de janeiro. “Ficaremos atentos à definição clara da modelagem. Se começar errado, para corrigir lá na frente é muito difícil”, alerta. Na sua opinião, o novo sistema deve provocar a queda de, no mínimo, 20% do custo médio do transporte ferroviário do País.
O presidente-executivo da Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários (ANTF), Rodrigo Vilaça, diz esperar explicações sobre como o operador vai atuar. “Carecemos de detalhamento desse processo de compra e venda do frete”, afirma. Para ele, ainda não está claro quanto o governo pagará pela capacidade da nova malha e quais as normas técnicas para o transporte dos diferentes tipos de mercadoria, do minério de ferro à produtos industrializados.
A presidente Dilma Rousseff anunciou em agosto o pacote de concessões de 10 mil quilômetros de estradas de ferro com investimentos de R$ 91 bilhões, sendo R$ 56 bilhões nos próximos cinco anos. No modelo, o governo, por meio da estatal Valec Engenharia, Construções e Ferrovias S.A., vai comprar toda a capacidade da malha e vender direitos de passagem (slots) a quem desejar fazer o transporte de carga. “Certamente será necessário dinheiro do Tesouro Nacional nos primeiros anos para suportar a diferença dos fretes, porque uma coisa é comprar a capacidade de quem construiu a ferrovia e outra coisa é revender”, diz Vilaça.
A compra da capacidade pela Valec servirá de proteção contra eventual falta de demanda das vias. “O modelo vai atrair investimentos porque há certeza do ressarcimento”, diz o diretor de Operações da estatal, Bento José de Lima. “Caso a demanda efetiva seja inferior à capacidade de movimentação da ferrovia, a Valec vai absorver a diferença e isso vira um subsídio do governo em nome de todo benefício do sistema”, completa Fábio Coelho Barbosa, gerente de Regulação e Outorgas Ferroviárias de Cargas da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT). Para Barbosa, porém, não haverá baixa procura pelas linhas. “Nosso estudos dizem que teremos índices de utilização superiores aos verificados hoje”, conta.
Fim de monopólios
O objetivo do novo modelo é acabar com as preferências das concessionárias na passagem de seus produtos pelas ferrovias e permitir o acesso de diversas companhias ao modal. “Qualquer empresa que queira ter locomotiva e vagões poderá circular mediante o pagamento à Valec e os concessionários atuais vão atuar nas mesmas regras”, explica Lima, da estatal.
A princípio, o acesso às ferrovias por novos operadores poderia abrir a possibilidade da indústria de vagões e locomotivas também ser beneficiada pelo modelo. No entanto, o presidente da Associação Brasileira da Indústria Ferroviária, Vicente Abate, explica que o crescimento das empresas dependerá da expansão da malha, e não do número de operadores.
“A necessidade de vagões e locomotivas virá da expansão do sistema e, eventualmente, do transporte de novos tipos de carga em determinada via; não interessa se existe um ou vários operadores”, completa.
Há, ainda, quem tenha ficado insatisfeito com o open access. Vilaça, da ANTF, afirma que o modelo vai na contramão do que é adotado em países com matriz logística eficiente – no sistema de integração vertical, instalação e administração da linha ficam concentradas em um único agente. “Gostaríamos de ter participado mais efetivamente do processo e tido, também, o direito de avaliar a possibilidade de investir onde o governo não foi capaz de fazer para que pudéssemos ter o alongamento das concessões existentes”, reclama.
O gerente-geral de Linha e Estrutura da Canadian Pacific Railway, Mike Roney, diz que o governo brasileiro fez o possível para tornar as concessões atrativas. “É sempre importante para investidores acreditar que haverá estabilidade e prioridades de longo prazo”, diz. Mesmo assim, avalia que existe o risco de haver poucos interessados nos leilões por conta dos prazos agressivos do processo de licitação.
A previsão é de que os contratos das obras do chamado Grupo 1, que inclui o Ferroanel de São Paulo, o acesso ao Porto de Santos e mais quatro trechos, sejam assinados até julho de 2013. Para o grupo 2, um total de 7,4 mil quilômetros de ferrovias, as assinaturas devem ficar para o terceiro trimestre. “A janela de tempo para a concessão pode ser pequena para alguns potenciais operadores”, afirma.
Fonte: Agência Estado, 11/01/2013