Em busca de novas fontes de financiamento de longo prazo, especialmente para os programas de infraestrutura, o governo vai alterar regras do chamado mercado de dívida corporativa, apurou o Estado. Esse mercado inclui a emissão de títulos como debêntures, fundos creditórios, notas e recebíveis imobiliários e do agronegócio.
Embora o momento esteja desfavorável, principalmente em razão da elevação dos juros básicos da economia (Selic), a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e o Ministério da Fazenda costuram com agentes do mercado, associações, bancos e a BMFBovespa detalhes da alteração para desamarrar esses negócios. As mudanças tentam antecipar um novo cenário de juro baixo, o que tornará os papéis mais atrativos ao reduzir custos de financiamento e criar alternativa ao BNDES, inclusive poupando o Tesouro Nacional, como fonte de recursos de longo prazo.
O governo avalia permitir a ampliação da oferta de debêntures com os chamados “esforços restritos de distribuição”. Assim, um público maior de investidores poderia adquirir os papéis em uma mesma operação. Hoje, as emissões estão limitadas a 20 aquisições ou subscrições por operação. As negociações incluem, ainda, permitir aos fundos de pensão a compra de dívidas de sociedades anônimas de capital fechado, hoje limitada às companhias abertas listadas na Bolsa. Governo e mercado também conversam para incluir mais empresas, além das 20 companhias atualmente contempladas, no conceito de “emissores frequentes” desses papéis de dívida.
As costuras são parte da discussão mais ampla sobre maior acesso de empresas ao mercado de capitais, inclusive de ações. Fazenda e CVM conduzem as tratativas. “O tema está sendo avaliado/estudado pela autarquia internamente e junto a participantes do mercado”, informou, em nota, a CVM. E diz que busca modernizar a regulamentação do mercado de capitais com “estruturas inovadoras, experiência de supervisão e demandas de agentes de mercado”.
Papéis. As mudanças também reforçariam a tentativa do governo em usar debêntures na infraestrutura. Em 2011, a Fazenda zerou o Imposto de Renda sobre esses papéis. Mas não agradou. O modelo é considerado burocrático, exigindo criação de consórcios, aprovação de cada projeto no ministério setorial, desde que classificado como prioritário. Resultado: desde então, apenas R$ 5 bilhões de títulos foram para essa modalidade.
Envolvida nas negociações desde o início, a Cetip aposta na reforma desses títulos para tornar mercado de capitais a principal fonte de financiamento de longo prazo e aumentar a competitividade das empresas. “É preciso levar a poupança privada para investimento em produção. Mais dinheiro circulando é mais crescimento econômico”, diz o diretor-executivo comercial e de produtos, Carlos Ratto. “O governo é sensível a isso e vemos muita boa vontade”. Mercado. O estoque de títulos privados registrado na Cetip soma R$ 210 bilhões, mas ainda é tem pequena participação no PIB, equivalente a 5% da riqueza nacional – no Chile, a fatia chega a 11,7% e nos Estados Unidos, a 54% do PIB. Há US$ 45 bilhões de dívida corporativa de empresas nacionais emitidas no exterior.
No Brasil, ainda é um mercado em maturação. Até 2009, essa alternativa de financiamento era reservado apenas a companhias abertas. Em 2010, o governo começou a desonerar tributos sobre esses títulos. No ano passado, 53% das SAs abertas usaram esses instrumentos para se financiar – 77,5% com debêntures. As SAs fechadas já detêm 64% das operações.
E são justamente as concessionárias de serviços públicos, sobretudo de rodovias, energia, logística e petróleo, as maiores emissoras de dívida corporativa: 42% delas entraram nesse mercado em 2012, segundo o Centro de Estudos de Mercado de Capital (Cemec-Ibmec). O custo médio desses títulos ficou em 9,9% ao ano em 2012. Como comparação, os desembolsos do BNDES custaram 6,5%. Nos bancos comerciais, não sai por menos de 18,5%.
A ponta compradora da dívida corporativa é dominado por 1.030 fundos de investimento, mas os fundos de pensão querem uma fatia maior, já que têm que diversificar carteira e cumprir metas de rentabilidade mínima a seus participantes. Em 2012, os chamados investidores institucionais tinham apenas 8% de suas carteiras compostas por títulos corporativos em geral. Os investidores estrangeiros, apenas 1,2%, segundo dados do Cemec-Ibmec. “Mas não tem bala de prata para estimular isso. Não vamos resolver tudo de uma vez. Essas mudanças são um bom começo”, diz o diretor-executivo comercial e de produtos, Carlos Ratto.
Fonte: O Estado de S. Paulo, 05/09/2013
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