TCU autoriza e Valec vai usar aditivo de 25% em contratos

A situação dramática dos contratos firmados entre empreiteiras e a Valec levou o Ministério dos Transportes a fazer um apelo nada usual ao Tribunal de Contas da União (TCU). Para que não sejam obrigados a rescindir todos os contratos de obras que estão em andamento na Ferrovia Norte-Sul e na Ferrovia de Integração Oeste-Leste (Fiol), o ministério e Valec pediram ao TCU que “flexibilize” sua avaliação sobre os aditivos, de forma que a Valec dê andamento aos contratos, mesmo quando esses extrapolarem o limite de aditivo de 25% sobre o valor do contrato, conforme estabelece a lei de licitações.

Em uma nota técnica encaminhada ao tribunal, a estatal afirma que, “devido às dificuldades técnico-administrativas e de gestão enfrentadas no passado pela Valec, seus contratos foram celebrados com base em projetos deficientes, os quais necessitam de ajustes quantitativos e qualitativos para garantir a adequada execução das obras, gerando aditivos contratuais que visam à correção de falhas detectadas nos projeto”.

Em termos práticos, a estatal pede autorização para fazer correções, sem limitações, em determinados itens (serviços ou materiais) de um contrato. Em contrapartida, a estatal se compromete a reduzir o custo de outros itens desse mesmo contrato. Dessa forma, ela propõe uma “compensação” entre aquilo que teve o preço ampliado e reduzido e, assim, garante o limite de reajuste dentro dos 25%. Pela lei, a aplicação de aditivos não deve se basear apenas no valor total do contrato, mas sim no aumento de preços de itens específicos, independentemente de outras reduções de custos. Dessa maneira, sustenta o tribunal, evitam-se as tradicionais fraudes de “jogo de planilha”, em que um fornecedor reduz muito o preço de determinado item, mas aumenta absurdamente o custo de outros que mais lhe interessam.

Depois de analisar a gravidade da situação, porém, o TCU concluiu que o melhor seria abrir uma “exceção à regra” e atender ao pleito da Valec, sob risco de ter de obrigar a estatal a rescindir todos os contratos, para que novas licitações fossem feitas.

A Valec justificou o seu pedido. Segundo a própria estatal, todos os contratos em andamento na Norte-Sul e na Fiol sofrem do mesmo problema. A estatal apresentou a fatura, caso tivesse de encerrar os contratos atuais e fazer novas licitações: um custo total estimado em R$ 9,3 bilhões, envolvendo cerca de R$ 1,09 bilhão para bancar as novas licitações e de R$ 8,22 bilhões para os serviços remanescentes. Além disso, o prazo entre paralisação da obra por uma empreiteira e início efetivo por outra construtora foi calculado em cerca de um ano e meio.

Com a manutenção dos atuais contratos, estimou a empresa, os cálculos indicaram um custo total de R$ 7,62 bilhões, ou seja, quase R$ 2 bilhões a menos que a primeira opção. Entre o trágico e o ruim, portanto, o TCU acabou ficando com a segunda opção.

Em sua decisão, o ministro relator do processo Walton Alencar Rodrigues afirma que ficaram evidentes “os significativos prejuízos decorrentes da eventual suspensão desses contratos, não sendo possível ignorar os relevantes danos ao interesse público no caso de rescisão dos ajustes vigentes”.

Não foi a primeira vez que o TCU autorizou um diferente tratamento contábil para os aditivos das obras federais. A jusrisprudência da decisão que agora favorece a Valec surgiu em 2011, quando o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) bateu nas portas do tribunal para que pudesse calcular o percentual de seus aditivos levando em conta o resultado do aumento e redução nos preços de cada contrato. Caso contrário, comprometeria os cronogramas físico e financeiro de 101 contratos em andamento. Em vez de parar dezenas de estradas pelo país, o tribunal optou pelo “interesse público primário”.

Os aditivos passaram a ser um tema sensível para os Transportes, principalmente depois da “faxina” detonada em 2011, quando o governo mandou suspender, temporariamente, todos os pagamentos do Dnit e da Valec.

Desde a exceção feita pelo TCU ao Dnit, outro empreendimento com problemas crônicos em seus contratos também foi beneficiado com o mesmo tipo de tratamento. Para destravar parte das obras da transposição do rio São Francisco, o Ministério da Integração pediu que o mesmo entendimento valesse para parte de seus contratos. O pedido foi acatado.

Em seu posicionamento sobre a Valec, o TCU pontua que a medida vale apenas para os contratos firmados anteriormente à decisão que favoreceu o Dnit, em 2011. A decisão atende ao pedido da estatal, já que todos os contratos em vigor na Norte-Sul e na Fiol são anteriores a essa data.

Segundo o presidente da Valec, Josias Cavalcante, a autorização dada pelo TCU alivia a pressão sobre os contratos da estatal, que agora terá mais liberdade para negociar a execução de suas obras. Essas negociações, no entanto, ficarão a cargo de outro nome.

Cavalcante deixa o comando da Valec amanhã. Em seu lugar assumirá José Lucio Lima Machado, indicado pessoal do ministro dos Transportes, César Borges. A renovação na diretoria inclui ainda a entrada de Sérgio Assis Lobo, como diretor de planejamento, e de Mário Rodrigues Júnior, que será o diretor de engenharia.

Funcionário de carreira da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), Josias Cavalcante ainda não tem seu destino definido. Durante os 14 meses que permaneceu à frente da Valec, ele gastou boa parte do seu tempo em um desgastante processo judicial que envolveu a compra de trilhos pela estatal. Paralelamente, a precariedade dos estudos de engenharia que embasaram as obras da Norte-Sul e da Fiol também levaram a constantes explicações ao TCU, acertos de contas com empreiteiras e entendimentos com o Ibama.

A nova diretoria da estatal chega em um momento em que o Ministério dos Transportes corre contra o relógio para entregar, até março do ano que vem, a ligação da Norte Sul entre Palmas (TO) e Anápolis (GO). Em junho de 2014, o traçado estaria pronto até Estrela D’Oeste, abrindo uma malha de 1.537 km de extensão para operação. Na Fiol, as coisas estão mais complicadas. Apesar da expectativa do governo de concluir metade da ferrovia até dezembro do ano que vem, o fato é que hoje a Fiol é uma obra sem cronograma, dada a complexidade de seus contratos.

Fonte: Valor Econômico, 26/11/2013

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