Anúncio de fusão não impede ALL de acionar Rumo

A América Latina Logística (ALL) pediu à Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) o descredenciamento da Rumo Logística como usuária de sua ferrovia. O requerimento foi protocolado antes do Carnaval sob confidencialidade. A iniciativa mostra que, apesar do anúncio de fusão feito há dez dias pelas duas empresas, a ALL continua acionando judicial e administrativamente a Rumo, empresa controlada pelo empresário Rubens Ometto, dono da Cosan.

A companhia já havia questionado, na Justiça e no Cade, o contrato com a Rumo para transporte de açúcar. Agora, resolveu ir à ANTT para reclamar que a empresa teria requisitado transporte de carga “em volumes irreais, de modo a forçar a incidência de multas contratuais milionárias”. A discrepância estaria entre uma demanda requerida de 900 mil toneladas de açúcar por mês e uma suposta capacidade da Rumo para descarregar apenas 200 mil.

De acordo com a ALL, a exigência leva ao pagamento de multas por “demanda não atendida”. A empresa entrou na Justiça para não pagar essas multas, que segundo estimativas já teriam ultrapassado R$ 700 milhões.

Soja teme perder espaço para açúcar

Responsável por 60% da soja processada no Brasil e um quarto da comercializada no mundo, as empresas representadas pela Associação Brasileira das Indústrias de óleos Vegetais (Abiove) passaram a integrar o inquérito em que o Cade apura supostas práticas abusivas da Rumo Logística no contrato para o transporte de cargas com a ALL.

A entidade reclama por mais espaço na ferrovia para a indústria de óleos vegetais e se diz preocupada com uma eventual fusão entre a ALL e a Rumo. “O setor de óleos vegetais está profundamente preocupado com a proposta recém divulgada de combinar as atividades da ALL com a Rumo, por meio da incorporação da concessionária ferroviária pela empresa Rumo, controlada pelo grupo Cosan “, disse a associação em nota.

“Essa concentração de poder em um importante usuário do sistema de transporte da ALL poderá resultar em estratégias empresariais que causem forte impacto negativo na competitividade do complexo soja, no nível de emprego setorial e na balança comercial brasileira.”

Caso o pedido da Abiove seja aceito, a entidade poderá atuar como parte interessada no inquérito que foi aberto pelo Cade para apurar se a Rumo estaria utilizando um espaço de cargas na ferrovia muito além das cotas de açúcar que ela consegue descarregar. Outros setores da economia, como agricultores do interior do Paraná, de São Paulo e do Centro-Oeste, gostariam de obter mais cotas para escoar as suas respectivas produções até o Porto de Santos.

A associação que representa os produtores de soja do Brasil (Aprosoja) protocolou, em fevereiro, manifestação oficial ao Cade demonstrando preocupação diante do contrato de transporte de açúcar feito entre a ALL e Rumo. O receio existe, segundo a associação, porque se de fato dobrar o volume de açúcar transportado pela Rumo dentro da mesma malha ferroviária (a ALL não conseguiu duplicar o trecho que havia contratado com a Rumo) pode haver redução no transporte de grãos.

Na petição enviada ao Cade, a Abiove utilizou dados da ANTT segundo os quais, entre janeiro e outubro de 2013, passaram pelos trilhos da ALL 9,2 milhões de toneladas de soja, 2,8 milhões de toneladas de farelo e 6,7 milhões de toneladas de milho. “Ou seja, para atingir os mercados internacionais, 22% das exportações de soja, 21% de farelo e 26% de milho dependeram diretamente da ferrovia da ALL”, diz a Abiove.

Justiça nega recurso em ação contra ANTT

O grupo de concessões de ferrovias América Latina Logística (ALL) obteve nova vitória em sua disputa judicial com a Rumo Logística, braço de transportes do grupo Cosan. A Justiça negou ontem um recurso que questionava um “habeas data” concedido em favor da ALL.

O “habeas data” é uma garantia constitucional que assegura o acesso a dados registrados por entidades governamentais. O pedido, feito pela ALL, foi atendido pela Justiça no dia 20 de fevereiro e determinava que a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) divulgasse em três dias documentos sobre auditoria iniciada em outubro de 2013 no sistema logístico do porto de Santos. Na liminar, a Justiça requereu a exibição do relatório final da comissão técnica da agência.

Acreditando que poderia ser afetada pela decisão, a Rumo pediu um embargo de declaração (espécie de pedido de esclarecimento sobre a decisão) no dia 24 de fevereiro. Ontem, a juíza negou o pedido feito pela Rumo e a ANTT deve ser notificada oficialmente em breve sobre a decisão.

A documentação pode ajudar a argumentação da ALL de que a Rumo fez demandas de movimentação de carga acima do que os seus próprios terminais no litoral de São Paulo suportavam. A demanda, que não foi atendida integralmente pela ALL, causou a contabilização de multas a serem pagas pelo grupo de ferrovias – conforme previa um contrato firmado em 2009. As multas somam hoje ao menos R$ 340 milhões.

É justamente para dar uma solução a esse contrato que os acionistas das duas companhias começaram a negociar uma fusão. A Cosan divulgou, em 24 de fevereiro, uma proposta à ALL para que a subsidiária Rumo incorpore toda a companhia de ferrovias. Os atuais acionistas da Rumo ficariam com 36,5% das ações e os atuais acionistas da ALL ficariam com 63,5% do capital.

Procurada, a Rumo disse desconhecer a decisão da Justiça e afirma que, até onde sabe, a comissão técnica da agência reguladora ainda não terminou os trabalhos, “de modo que não existe um relatório final da ANTT sobre o tema”. “Desta forma, o documento pretendido pela ALL certamente não existe, sendo claro que qualquer documento a ser prematuramente apresentado pela ANTT seria meramente provisório e não conclusivo”. Procurada para comentar o assunto, por meio da assessoria de imprensa, a ALL não se manifestou.

Fonte: Valor Econômico, 07/03/2014

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