Quando o governo federal anunciou o programa de concessões de Ferrovias em 2012 – com aportes de R$ 91 bilhões -, empresários e consultores projetavam que, em 2014, as obras já estariam em ritmo acelerado. Sem sair do papel, os editais frustraram os empresários do setor logístico e, somado às incertezas da economia e ao calendário apertado, afastaram o otimismo de possíveis investidores.
Na contramão dessa perspectiva, o governo segue otimista com a concessão, e garante que os editais sairão o quanto antes, com o apoio do empresariado. “Estamos modernizando os contratos e garantindo que seja interessante ao empresário”, diz o diretor da Agência Nacional De Transportes Terrestres (ANTT), Carlos Nascimento, na feira Intermodal, que terminou ontem (3) em São Paulo.
O cronograma inicial da ANTT, que previa editais liberados em abril do ano passado, ainda esbarra em resistência do mercado e do Tribunal de Contas da União (TCU). A ideia do governo era acabar com o sistema verticalizado (em que o construtor da Ferrovia é único a usar o modal) adotando um conceito chamado open access – em que o operador que ganha a concessão é responsável pela infraestrutura da Ferrovia, podendo controlar o tráfego de outros operadores. Sistema, aliás, semelhante ao modelo aeroportuário brasileiro.
De acordo com Nascimento, a adequação dos modelos de contrato para o open acess não resultará, necessariamente, em mais investimento dos empresários. A perspectiva da ANTT é que toda a demanda das Ferrovias seja comprada pela estatal Valec, que posteriormente revenderá as janelas de passagem (slots) de trens ao mercado. “Os empresários se mostram receosos com a condição da Valec que de revender os slots, além da possibilidade de um calote”, disse Roger Menezes Filho, professor de engenharia civil da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). “São obras que demandam muito investimentos e o governo ainda não deu soluções sobre questões ambientais, regras de conteúdo nacional e desapropriações”, completou ele.
Primeira concessão
A perspectiva de Nascimento é que ainda no primeiro semestre seja lançado o edital para a Ferrovia entre Campinorte (GO) e Lucas do Rio Verde (MT), trecho que soma pouco mais de 880 quilômetros. O edital, já aprovado pelo TCU, passa agora por ajustes com a iniciativa privada. O presidente da Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários (ANTF), Rodrigo Vilaça, avalia que as concessões precisam avançar este ano. A perspectiva do empresário é que duas Ferrovias sejam licitadas em 2014. “Independente da questão política, o País tem de reagir”, diz.
Na opinião do presidente da Associação Brasileira da Indústria Ferroviária (Abifer), Vicente Abate, a concessão de Ferrovias é mais complexa que a de aeroportos e rodovias. Assim, o executivo acredita que será mais complicado a liberação do primeiro edital. “Depois que o primeiro edital sair, com apoio do mercado, as concessões irão destravar”, disse ele. Outro ponto destacado por Abate é a competitividade que as Ferrovias trazem à demanda da logística brasileira, no entanto, o executivo ressalta que é preciso desenvolver um planejamento que contribua com as malhas e, a partir daí, dar continuidade ao processo para não atrasar o desenvolvimento do País. “O País precisa evoluir nesse modal”.
O balanço de 2012 ANTF, último feito do setor ferroviário, apontou que as companhias injetaram mais de R$ 4,9 bilhões em 2012, alta de 6,6% ante a 2011. Já a movimentação de cargas das Ferrovias foi 1,3% maior em 2012 em relação a 2011, passando de 475 para 481 milhões de toneladas. “Diante do quadro de crise mundial, em especial nos país europeus, o volume de movimentação foi boa”, diz Vilaça. A Malha Ferroviária que corta trechos no Brasil soma 28.366 quilômetros. Deste número, 22.822 quilômetros estão em operação.
Na onda Ferroviária
O plano de concessão Ferroviária, que faz parte do Programa de Investimentos em Logística (PIL), prevê concessão de 16 trechos, que somam 11 mil quilômetros. Além de beneficiar todo o escoamento de grãos e otimizar o transporte de cargas, as concessões devem impulsionar empresas de tecnologia para trens, além de grupos logísticos que poderão operar no modal.
Exemplo disso, a MRS Logística lançou a ferramenta Comunication – basead Train Control (CBTC), sistema automatizado de controle dos trens de alta segurança. “O sistema é utilizado nos trens de passageiros nos EUA e Europa e, no Brasil, aplicaremos de forma inédita no transporte de cargas”, diz o gerente da área comercial do grupo, Marcio Aramy. Quem também vê ampliação dos negócios com a implementação de Ferrovias é a Brado Logística – que nasceu em 2011 na fusão dos ativos da Standard Logística com a unidade de negócios da América Latina Logística (ALL). A empresa projeta o uso de Ferrovia para ações de logística reversa, e projeta iniciar a ação com operações de fertilizantes.
“O mercado de contêineres é enorme e o nosso foco é personalizar este serviço para o Transporte Ferroviário”, diz o presidente da Brado, Alan Fuchs, lembrando que o mercado de commodities no Brasil saltou 270% na comparação do primeiro trimestre de 2013 com 2014, apontando um mercado em potencial.
TAV ainda é desafio
Outro ponto de receio dos empresários brasileiros quando o assunto são Ferrovias é o Trem de Alta Velocidade (TAV). Enquanto o governo garante que o desempenho do estudo de viabilidade do projeto estejam bem encaminhados, o professor de engenharia civil da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Roger Menezes Filho, garante que as dificuldades estão apenas no início. “O TAV é caro, compete diretamente com aeroportos que acabaram de ser concedidos e o governo ainda exige das empresas contra partidas consideradas muito altas”, disse.
Para o professor, o TAV será desafio para o próximo governo. “É preciso passar as eleições para retomar esse assunto”, disse ele. Em agosto do ano passado, o governo adiou, em um ano, a primeira etapa do leilão do TAV, que deverá ligar as cidades do Rio de Janeiro, de São Paulo e Campinas. Antes disso, já tinha sido adiado duas vezes. “Questões prioritárias como desapropriação, licenças ambientais e reais custos de operação ainda foram poucos discutidos”, disse o acadêmico.
Fonte: DCI, 04/04/2014
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