Os limites do BRT

Não é a solução adequada para o corredor Niterói-São Gonçalo (com extensão até Itaboraí), para o qual está programada e projetada a Linha 3 do metrô

O professor Luis Antonio Lindau, em artigo publicado no GLOBO segunda-feira passada, aponta o transporte coletivo sobre pneus como componente essencial do sistema de mobilidade urbana. Quanto a tal afirmação, não há qualquer discordância nos meios especializados no assunto. No entanto, é preciso explicitar algo ainda pouco discutido no Brasil: os limites da opção sobre pneus. O que remete, sobretudo, à questão da capacidade de transporte dos sistemas alternativos, especialmente relevante no caso do BRT — segundo a boa literatura, um sistema de média capacidade quando cotejado com o transporte metroviário. Neste ponto, um esclarecimento: nenhum sistema de transporte é ruim; todos são bons, dependendo do caso em que seja utilizado.

O BRT é um ótimo sistema, indicado para corredores de transporte críticos em cidades médias e metrópoles pequenas (como Curitiba e Toronto). E também em corredores não críticos nas grandes metrópoles (como Rio e São Paulo), definidos tais corredores não críticos como aqueles com demanda de até 250 mil passageiros por dia, quando de sua implantação.

No caso do Rio, o BRT é uma solução perfeita para as linhas Transoeste e Transolímpica. Mas não era, tecnicamente, a resposta recomendável para o corredor T5 (da Transcarioca) da antes projetada Linha 6 do metrô. Tampouco é a solução adequada para o corredor Niterói–São Gonçalo (com extensão até Itaboraí), para o qual está programada e projetada a Linha 3 do metrô. Isso porque esses dois últimos corredores já apresentam, com integração, demandas que ultrapassam os limites indicados para atendimento por BRT. No T5 a demanda passa de 600 mil passageiros por dia. E entre Niterói e São Gonçalo, o número de passageiros é de mais de 500 mil por dia. Para se ter uma ideia das escalas em jogo, basta lembrar que o corredor mais crítico de Curitiba, o Corredor Sul, onde opera a Linha Verde Sul , tinha uma demanda de pouco mais de cem mil passageiros por dia quando de sua inauguração. Hoje, esse corredor apresenta uma demanda de perto de 250 mil passageiros por dia. Por isso, já há quem fale na implantação de metrô por lá.

O principal argumento apresentado para implantação de BRT em corredores de maior demanda é de natureza financeira. “O BRT é mais barato e resolve satisfatoriamente o problema”, alegam. “É melhor o BRT do que nada, enquanto não houver recursos para metrô”, dizem. É precisamente esse tipo de discussão que ocorre atualmente em relação ao corredor São Gonçalo–Niterói.

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No que tange aos custos, é preciso que a análise não se restrinja à implantação. É fundamental que ela abranja todos os custos. O relevante é o custo social do transporte por passageiro-quilômetro, ao longo da vida útil do projeto, “trazido a valor presente”, como dizem os técnicos. Quanto à segunda alegação, há especialistas inclinados a achar que, no caso, pode ser melhor atrasar o projeto até que haja meios para implantação do sistema correto do que providenciar, como falam alguns, uma “meia-sola”. Isso porque, nos projetos de BRT, tudo é calculado, de forma mais leve, para o ônibus: o traçado, as rampas, as pontes, os viadutos, a capacidade de suporte da via etc.

Se não for assim, a vantagem dos custos de implantação em relação ao metrô fica muito reduzida. Depois, para se botar o metrô no lugar, tem que se jogar quase tudo fora e se fazer um projeto totalmente novo. Resultado: é alta a probabilidade de que nunca mais se faça metrô ali. Este é um dos pontos mais relevantes a serem levados em conta na decisão de nossos governantes.

Marcos Poggi – Consultor na área de transporte e foi subsecretário estadual de Transportes do Rio

O Globo, 01/06/2015

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