No primeiro dia útil, VLT superlota e para por falta de energia

RIO – O primeiro dia útil de funcionamento do VLT, um dos principais legados olímpicos do Rio, foi de festa nesta segunda-feira, com muita gente curiosa para embarcar no novo meio de transporte no Centro. Foi tamanha a procura, que a prefeitura precisou pôr mais um veículo nos trilhos. O dia, no entanto, teve também um contratempo. Pouco antes das 15h, perto do Aeroporto Santos Dumont, uma falha no sistema de energia provocou a interrupção da penúltima viagem. Os passageiros tiveram que desembarcar dos sete vagões no meio do caminho, logo depois de passar pela Parada Antônio Carlos. As causas do problema ainda estão sendo investigadas pela prefeitura, que afirmou, em nota, que o serviço foi retomado após 20 minutos e que “novos eventos podem ocorrer, pois a fase é de adaptação”.

A novidade atraiu gente não só da capital como de outras cidades. Moradora de Maricá, a aposentada Marina Maria da Conceição, de 77 anos, foi ao dentista no Centro e aproveitou para dar um passeio de VLT. Ela foi toda elogios para o serviço.

Queda de energia provoca interrupção de uma das viagens do VLT em direção ao Aeroporto Santos Dumont – Foto do leitor Renan Gonzalez Garcez / WhatsApp do GLOBO

— É uma novidade. Todo mundo tem curiosidade de conhecer. Os bondes de antigamente eram uma carroça. Este aqui é bem mais seguro e moderno.

Depois que o VLT — inaugurado oficialmente anteontem — parou por falta de energia, houve críticas nas redes sociais. Chegou a circular a informação de que o bonde saíra dos trilhos, mas o descarrilamento foi desmentido tanto pela prefeitura quanto por passageiros que estavam na composição. O analista de TI Renan Gonzalez Garcez, que registrou duas fotos do momento, contou que a interrupção foi repentina:

— O VLT estava bem cheio, porque é uma novidade. Ele estava em baixa velocidade e, de repente, parou. Pensei que fosse sinal fechado. Depois de um tempo, desligaram o ar e a luz. Então, informaram que não daria para continuar e solicitaram o desembarque das pessoas, que ocorreu de forma organizada.

Para o engenheiro de transportes Giovani Manso, professor da UFRJ, independentemente de ter sido uma falha na operação ou no fornecimento de energia, os operadores do bonde deveriam estar preparados para o problema.

— Esse é o tipo de falha que precisa estar prevista, com um banco de capacitores, uma espécie de bateria que dá autonomia de até 30 minutos para o VLT circular. Se faltar energia, o banco de capacitores vai aguentar até o bonde chegar a um local seguro — explicou o especialista, que não estranhou a falha no primeiro dia útil de operação.

Otimista, o especialista em transporte público Marcio Barbosa, professor da Fundação Getulio Vargas, acredita que esta fase inicial servirá para que a prefeitura tenha conhecimento pleno do que está sendo oferecido:

— É um sistema que está começando a funcionar agora. Não é uma falha relevante, porque é o primeiro dia. Tanto que a prefeitura está tendo o cuidado de operar o VLT numa faixa restrita de horário.

De acordo com o secretário especial de Concessões e Parcerias Público-Privadas da prefeitura, Jorge Arraes, o problema da queda de energia aconteceu porque a subestação Cinelândia não foi acionada automaticamente após o sistema de proteção elétrica do VLT entrar em ação. Esse sistema protege a comunicação elétrica entre o trilho e o conector do bonde que faz a transferência de energia. Toda vez que há uma sobrecarga ou alguma interferência na rede, a “blindagem” é acionada automaticamente.
— O sistema de proteção fez o papel dele, que é desarmar a subestação mais próxima quando percebe alguma sobrecarga. Mas, a subestação anterior (Cinelândia) deveria ter sido acionada automaticamente, o que não aconteceu. Pedi um relatório à concessionária, e hoje saberemos o motivo da falha — explicou Arraes, lembrando que na fase de testes problemas semelhantes aconteceram. — Isso aconteceu inúmeros vezes e, muitas delas, de maneira forçada. Esse é um problema previsível, mas que não tem que ser corriqueiro. Os VLTs possuem supercapacitores, que dão uma autonomia ao veículo de até 30 minutos. No entanto, o trecho onde a composição parou é único, com uma rampa que exige um esforço maior da bateria.

Houve atraso no início e no fim da operação no primeiro dia útil. Marcada para ser das 12h às 15h, aconteceu das 12h12m às 15h18m. Durante esse tempo, os bondes ficaram superlotados. A princípio, só dois VLTs fariam o trajeto de oito paradas, entre a Praça Mauá e o Aeroporto Santos Dumont. Mas um terceiro trem acabou sendo posto nos trilhos, para atender à grande demanda. As viagens duravam cerca de 25 minutos e, tirando a paralisação já no fim, transcorreram sem grandes transtornos.

Em quase todos os cruzamentos, agentes de trânsito orientavam os motoristas, tentando impedir que os veículos passassem na frente do bonde. Diante das composições, um batedor de motocicleta abria caminho. Mesmo assim, pedestres e carros chegaram a cruzar os trilhos bem próximo ao VLT. Nesses momentos, os condutores tinham que frear bruscamente. Ciclistas e ambulantes também usaram livremente a pista com trilhos para se locomover, sem ser abordados por fiscais.

A segunda linha do VLT, entre a Central do Brasil e a Praça Quinze, deve ser inaugurada no segundo semestre, com a entrega de mais dez estações. Já a terceira linha, da Central à Cinelândia, só deve ser aberta em 2017, com a conclusão das obras na Avenida Marechal Floriano. Serão, no total, 28 quilômetros de trilhos, 32 bondes (com capacidade para transportar 300 mil pessoas diariamente) e 31 paradas.

Até o mês passado, estavam previstas 32 estações, mas uma delas, a José Bonifácio, foi extinta do projeto. Segundo o secretário Jorge Arraes, a decisão teve um único motivo: no local onde a parada ficaria, a calçada é muito estreita, e o acesso para pessoas com deficiência não seria possível.

Até o 30 deste mês, os passageiros poderão viajar de graça, mas, a partir de 1º de julho, terão de validar a passagem, voluntariamente, dentro do VLT. A tarifa será a mesma dos ônibus municipais: R$ 3,80. Os horários de funcionamento, assim como o trajeto até a Rodoviária Novo Rio, serão ampliados, em média, a cada semana, em oito etapas. De acordo com o planejamento da prefeitura, durante os Jogos, a primeira linha funcionará das 6h à meia-noite, inclusive nos fins de semana, com oito VLTs, que circularão a intervalos de 15 minutos.

ESTREIA ADIADA DUAS VEZES

A data de inauguração do VLT foi adiada duas vezes este ano. Primeiro, a operação começaria até o fim de abril. Depois, a prefeitura transferiu para 22 de maio, quando sequer as obras haviam sido concluídas. Na época, a Secretaria municipal de Transportes afirmou que era preciso dar mais tempo para pedestres e motoristas se acostumarem às mudanças viárias no Centro da cidade.

O Ministério Público também havia ajuizado uma ação civil pública determinando que o VLT só entrasse em funcionamento quando o sistema de sinalização sobre os passeios e vias públicas fosse plenamente instalado, testado e aprovado. Segundo o MP, o transporte ainda não oferecia segurança adequada aos passageiros e pedestres.

Na quinta-feira, após audiência pública, a Justiça negou o pedido do MP, mantendo a inauguração para domingo. A magistrada destacou ainda que há riscos em qualquer lugar onde haja tráfego de veículos e pedestres, mas que podem ser reduzidos com a instalação de sinalização adequada. Ela também disse na decisão que a implementação do VLT exige uma mudança de comportamento por parte do cidadão.

Em março, um ônibus que fazia manobra bateu em um dos VLTs, estacionado junto ao terminal Padre Henrique Otte, na Central. Não houve feridos. Já em abril, ainda em fase testes, também houve falta de energia nos trilhos na Avenida Rio Branco, na altura da Rua Sete de Setembro. Na viagem, acompanhada pelo GLOBO, o bonde precisou ser desligado e aguardar 15 minutos até voltar a circular.

Fonte: O Globo, 07/06/2016

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