Difícil de metrô, pior de ônibus: chegar ao Parque Olímpico pode ser prova de obstáculos

RIO DE JANEIRO (Reuters) – Chegar ao coração dos Jogos Rio 2016 deverá ser uma tarefa desafiadora para turistas e torcedores cariocas mesmo se a ampliação do metrô da cidade estiver em operação, mas a maratona pode ser ainda pior se as autoridades tiverem que recorrer a um plano B sem metrô que ampliará o número de ônibus nas ruas e poderá paralisar o trânsito.

Projetada para levar o sistema metroviário à Barra da Tijuca, que concentra a maior parte das instalações esportivas, a Linha 4 tinha previsão de conclusão no dia 1º de julho, mas atrasos provocados por problemas técnicos na obra e falta de recursos adiaram a abertura para 1º de agosto, apenas quatro dias antes da cerimônia de abertura.

Se inaugurado, o metrô olímpico funcionará apenas de forma limitada, tanto em capacidade quanto em intervalo dos trens, o que pode deixar torcedores esperando por longos períodos. Além disso, só chegará à entrada da Barra, a cerca de 15 km do Parque Olímpico, um trecho de quase 30 minutos que precisará ser concluído por meio do corredor de ônibus conhecido como BRT.

A um mês da abertura dos Jogos Olímpicos nesta terça-feira, ainda não é possível saber com certeza qual será tempo real do trajeto completo, com ou sem metrô, o que só será conhecido de fato em 1º de agosto, quando os primeiros passageiros realizarem a viagem.

“Como está hoje, se inaugurar, a estação da Barra só vai funcionar de forma precária, só para a família olímpica. Com essa situação, não vai ter impacto positivo nenhum”, avaliou o engenheiro de transportes Marcus Quintella, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV). “Estão preparando uma situação paliativa, que é a extensão de BRT, que é uma das coisas mais absurdas do projeto.”

Além da capacidade limitada e da necessidade de integração com ônibus, a operação do metrô pode não ser totalmente segura durante a Olimpíada devido a uma redução no período de testes decorrente de atrasos, segundo levantamento do Tribunal de Contas do Estado do Rio. Segundo o tribunal, a previsão inicial era que a fase de testes deveria durar cerca de um ano, mas o período foi encurtado para apenas dois meses.

R$10 BILHÕES E 6 ANOS

As obras do metrô começaram em 2010 e têm custo estimado em 9,7 bilhões de reais. Caso a Linha 4 não fique pronta a tempo, o plano B da Prefeitura do Rio prevê a criação de linhas de ônibus extras para fazer a ligação entre a zona sul e a Barra usando faixas seletivas. Isso tornará a viagem muito mais demorada e ainda pode afetar o restante do tráfego da cidade.

Enquanto de metrô o trecho Copacabana-Barra seria feito em 15 minutos, de ônibus o tempo para a mesma viagem é pelo menos três vezes maior -o que pode ser amenizado devido à transferência das férias escolares para agosto e com a decretação de três feriados em dias de provas de rua, considerados os mais críticos para o tráfego.

“Sem dúvida não é o mais confortável para o público, nem para a cidade”, reconheceu o diretor de operações do Rio para os Jogos, Leonardo Maciel. “O BRT não tem a capacidade de carregamento do metrô.”

Apesar de o governo estadual, responsável pelo metrô, garantir a inauguração a tempo para a Olimpíada, o prefeito do Rio, Eduardo Paes, disse no fim de junho que esperaria mais alguns dias para determinar se será necessário ou não lançar mão do plano alternativo, que inclusive já foi apresentado ao Comitê Olímpico Internacional (COI).

O governo estadual fluminense demonstrou confiança na semana passada de que entregará a obra a tempo para a Olimpíada, animado com a liberação de um crédito da União no valor de 2,9 bilhões de reais para socorrer o Estado, que decretou estado de calamidade pública em junho em decorrência de uma crise financeira.

Apesar de a verba federal ser especificamente voltada para gastos com segurança da Olimpíada, o governo estadual poderá remanejar seu Orçamento para arcar com os 500 milhões de reais que faltam para a conclusão da Linha 4, sendo 350 milhões para o pagamento de dívida com a concessionária responsável pelas obras e mais 150 milhões para o acabamento das áreas de entorno.

“Estamos certos e estamos seguros que iremos entregar a Linha 4 totalmente operacional após a realização de todos os testes para a utilização da população”, disse o secretário estadual de Transportes, Rodrigo Vieira, durante apresentação para a imprensa da estação do metrô na Barra da Tijuca, na semana passada.

CRATERAS E TATUZÃO

Além da questão financeira, parte das incertezas sobre a conclusão do metrô para a Olimpíada se deve a atrasos ocorridos durante a obra por causa de problemas com a máquina conhecida como “tatuzão”, que perfura o túnel para a instalação do metrô.

Em determinado trecho da obra o uso do equipamento provocou instabilidade no solo e ameaçou causar danos em diversos edifícios, o que abriu crateras em algumas ruas e forçou uma prolongada paralisação.

“O ‘tatuzão’ ficou parado em Ipanema quase 6 meses, isso em um cronograma de um sistema metroviário é fatal. É o tipo de atraso que em uma obra metroviária é muito difícil de recuperar, você não aumenta a velocidade do ‘tatuzão'”, disse o professor de Engenharia de Transportes da Coppe/UFRJ Ronaldo Balassiano, que trabalhou na preparação da cidade para os Jogos Olímpicos entre 2012 e 2014.

Segundo Balassiano, especialistas do COI acompanham desde o início as obras de mobilidade urbana que vêm sendo realizadas na cidade, e o metrô sempre foi motivo de alerta.

Enquanto persistem as dúvidas do lado de fora sobre a conclusão a tempo para os Jogos, cerca de 6 mil trabalhadores se dividem em até três turnos para terminar a obra, que alcançou 97 por cento de conclusão no chamado trecho olímpico.

“A gente vai estar trabalhando aqui ainda quando abrirem, mas já vai ter gente indo para os Jogos”, disse um dos operários.

Outro problema para se chegar ao Parque Olímpico, palco de 16 modalidades dos Jogos, não diz respeito às obras, e independe da conclusão do metrô. Moradores da cidade têm reclamado do preço de 25 reais para o chamado Riocard olímpico, que será a única forma de pagamento para o metrô e o BRT olímpicos, com validade para uso ilimitado em um período de 24 horas, independentemente se a pessoa fizer apenas duas viagens.

Em comparação, uma passagem regular de metrô custa 4,10 reais, enquanto o ônibus normal custa 3,80 reais.

Segundo o professor Quintella, da FGV, é possível que muitas pessoas acabem deixando de lado o transporte público para acompanhar a Olimpíada, mesmo com a proibição ao estacionamento de carros no Parque Olímpico e arredores.

“As pessoas da zona sul, onde está a grande potencialidade turística e hoteleira, vão ser altamente penalizadas se tiverem que chegar à Barra de transporte público”, afirmou Quintella.

“Vão ter que pegar metrô, descer, entrar num BRT e ir para o local de competição. É uma viagem lenta. Então não vai resolver nada, toda essa gente vai acabar indo de táxi, ônibus de turismo ou vans especializadas”, disse.

Por Pedro Fonseca

(Reportagem adicional de Rodrigo Viga Gaier e Caio Saad), 05/07/2016

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