É ponto pacífico o prejuízo causado pela paralisação das obras do metrô da Gávea. O que a recente decisão do Tribunal de Contas do Estado liberando o repasse de verbas do Tesouro para a concessionária da Linha 4 coloca em pauta é outra questão: o Estado do Rio de Janeiro não tem nem nunca teve recursos para fazer frente ao custeio integral das obras de construção da Linha 4 do metrô, tendo contraído empréstimos na casa de R$ 8 bilhões para este fim e exorbitado o seu limite de endividamento.
Até agora, as obras da Linha 4 foram integralmente custeadas pelo estado. Enquanto isso, a concessionária, que nada gastou, obtém remuneração pela operação do serviço. Por isso, o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ) se opõe — não à retomada da obra —, mas sim a que o estado, tendo investido mais de R$ 10 bilhões na Linha 4 e nada recebendo, desfalque ainda mais os cofres públicos com novos custeios, com claro desequilíbrio em benefício das empresas.
Não há dúvida de que outras medidas alternativas ao integral custeio público podem ser adotadas para dar continuidade às obras. Cabe ao administrador zelar pelas finanças públicas, adotando solução que melhor atenda ao interesse coletivo, sem jamais desconsiderar o menor gasto de dinheiro público.
O estado enfrenta os desafios impostos pelo déficit superior a R$ 10 bilhões na Lei Orçamentária Anual 2018. Portanto, o custeio do final da obra precisa refletir o melhor resultado para a equação composta da necessidade de retomada da construção, o histórico da linha 4 e a menor onerosidade para o Tesouro, mantendo em quadro o reequilíbrio fiscal.
Não se pode admitir que o Executivo estadual acene, de um lado, com a falência de recursos para cortar gastos dirigidos à realização de políticas públicas essenciais — como educação, saúde e segurança — e, de outro, gerencie a continuidade da obra da Linha 4 em desrespeito ao seu próprio planejamento orçamentário e à ordem de prioridades constitucionais, manipulando sua atividade financeira em flagrante prejuízo à sociedade fluminense, que vivencia graves restrições.
É preciso ainda voltar à história da construção da Linha 4 para lembrar ilegalidades praticadas em prejuízo das finanças públicas e em benefício das empresas. Estas, em grande parte, também são enfrentadas pelo MPRJ em ação ajuizada em 2017 para a devolução ao Tesouro de mais de R$ 3,17 bilhões relativos a superfaturamento e sobrepreço na execução da obra, na qual figuram como réus o ex-governador Sérgio Cabral, três ex-secretários de Transportes, fiscais e empresas envolvidas com práticas criminosas apontadas em diversas ações penais conduzidas pela força-tarefa da Lava-Jato.
É importante, sim, retomar as obras e concluir a Linha 4. Mas essa meta não pode ser cumprida a qualquer custo, sacrificando os princípios que regem a governança pública e as obrigações oriundas do reconhecimento do estado de calamidade financeira. Se não, a conta chegará mais tarde para todos os cidadãos fluminenses. E virá ainda mais cara.
Fonte: O Globo, 17/01/2018