O Ministério Público Federal (MPF) enviou nesta quarta-feira (24) aos Ministérios da Economia e da Infraestrutura nota técnica contra a inclusão, nos contratos de prorrogação antecipada de ferrovias, de cláusulas prevendo acréscimos no pagamento do valor de outorga pelas concessionárias. O órgão analisou os aditivos já firmados e argumenta que esse tipo de previsão contraria a Lei nº 13.448/2017, que prevê a destinação dos recursos para investimentos nas malhas ferroviárias. A nota técnica lembra que o objetivo das prorrogações antecipadas é tornar o setor eficiente e competitivo, por meio de melhorias em infraestrutura, tecnologia e serviços, e não fazer caixa para o Tesouro Nacional. Elaborado pelo Grupo de Trabalho Transportes da Câmara do Consumidor e da Ordem Econômica do MP (3CCR), o documento será enviado também à Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT).
A nota técnica explica que a prorrogação antecipada de contratos de concessão de ferrovias foi criada pela Lei nº 13.448/2017 como forma de viabilizar novos investimentos nas malhas e ampliar a eficiência do setor. As ferrovias são consideradas estratégicas para o desenvolvimento econômico do país, já que facilitam escoamento da produção e aumentam a competitividade nacional. A prorrogação antecipada pode ser concedida às empresas que se comprometerem a realizar diretamente investimentos não previstos no contrato original, observando a incorporação de novas tecnologias e serviços, além da melhoria da infraestrutura das malhas operadas.
Apesar disso, segundo o MPF, os aditivos de prorrogação antecipada formalizados até o momento não observam o pleno cumprimento da exigência de novos investimentos. O contrato de concessão da Rumo Malha Paulista S/A, por exemplo, estipula o pagamento, a título de valor de outorga, de 155 parcelas trimestrais de R$ 88,9 milhões diretamente à ANTT. Para o MPF, a previsão de pagamento de outorga à União motivada apenas pela prorrogação antecipada contraria a lei.
Segundo a nota técnica, a medida destina ao Tesouro Nacional valores que deveriam ser utilizados pelas empresas para tornar as ferrovias mais eficientes e modernas. Assim, a cláusula configura “apropriação indevida de recursos destinados obrigatoriamente a investimentos na melhoria da infraestrutura de transportes, em flagrante contrariedade ao Art. 6 da Lei 13.448/17 e aos objetivos perseguidos pela política pública de estímulo à ampliação de investimentos na cadeia logística nacional”.
Outro problema apontado pela nota técnica é a existência de cláusulas prevendo o acréscimo no valor de outorga nos casos em que as empresas deixam de cumprir obrigações contratuais de investimento, como acontece nos aditivos de prorrogação da Malha Paulista e da Estrada de Ferro Vitória-Minas. Segundo o MPF, essa penalidade representa “forte desestímulo para que as concessionárias realizem os investimentos obrigatórios estipulados pelos respectivos aditivos contratuais”.
A nota técnica argumenta que, embora esteja prevista na lei, a obrigação de pagar adicional de outorga como penalidade pela não realização de obras de infraestrutura desestimula novos investimentos no setor, contrariando a própria finalidade da legislação. Muitas vezes, é mais vantajoso para as empresas pagar a multa a fazer os investimentos devidos nas malhas. Assim, a medida seria uma espécie de “premiação ao concessionário pela não realização do investimento, causando grave prejuízo ao atingimento do motivo fundamental que justifica a prorrogação contratual”.
A 3CCR lembra que “a realização de novos investimentos é o cerne que fundamenta a possibilidade de prorrogação antecipada das concessões ferroviárias”. A Lei nº 13.448/2017 criou o instituto justamente para reparar problemas e desafios históricos no setor, buscando viabilizar a realização imediata de novos investimentos em projetos de parceria e sanear contratos vigentes, quando a continuidade da concessão se mostrar inviável. Outro objetivo da prorrogação antecipada é viabilizar investimentos que se mostraram necessários, mas não estavam previstos no contrato original. Assim, as cláusulas que preveem acréscimo no valor de outorga – seja em razão da própria prorrogação antecipada da concessão, seja por motivo de inadimplemento de obrigação contratual – contrariam a legislação e devem ser retiradas dos aditivos.
Fonte: Abifer, 26/02/2021