Os trens e metrôs bateram recorde negativo de passageiros transportados no ano passado, o primeiro no qual o país teve de conviver com a pandemia da Covid-19, e também não aumentaram a oferta de linhas ou quilometragem das rotas já existentes.
De cerca de 11 milhões por dia útil em 2019, o total caiu para 5,8 milhões no ano passado, segundo relatório anual da ANPTrilhos (Associação Nacional dos Transportadores de Passageiros sobre Trilhos).
Com isso, a queda na quantidade de passageiros que utilizaram os sistemas em 2020 chegou a 46,7% em comparação com o ano anterior, a maior redução já registrada.
Se for considerado apenas o período de restrições adotadas por conta da pandemia do novo coronavírus no ano passado -março a dezembro-, o desempenho é ainda pior e chega a 55,9% de retração em relação ao mesmo intervalo de 2019.
A maior queda no fluxo de passageiros em trens e metrôs durante a pandemia foi registrada no Rio de Janeiro, onde foram transportados 252,6 milhões de passageiros entre março e dezembro, redução de 57% em relação ao ano anterior.
Só na SuperVia, concessionária que administra 270 quilômetros do sistema ferroviário no Rio e em outras 11 cidades da região metropolitana, entre março do ano passado e fevereiro deste ano a perda financeira chegou a R$ 452 milhões, graças à redução de mais de 83 milhões de passageiros transportados.
Em São Paulo, a queda foi de 55,4%, com 1,3 bilhão de passageiros transportados no mesmo período. Já no Nordeste, o resultado foi 52% inferior ao de 2019, com 146,3 milhões de passageiros. O levantamento considera todos os sistemas de transporte sobre trilhos no país, exceto o Metrofor (CE), o de Teresina e o VLT (Veículo Leve sobre Trilhos) da Baixada Santista.
Presidente da ANPTrilhos, Joubert Fortes Flores Filho disse que o setor chegou a registrar crescimento de 8% no fim do ano, mas o avanço da pandemia fez com que 2021 iniciasse com redução de 4% na demanda e a curva está estagnada de forma negativa desde então, sem sinais de que vá melhorar nos próximos meses.
“Não chegamos a transportar mais de 50% mesmo quando a economia estava retornando. Temos uma perspectiva demorada de retorno, porque há um nível de desemprego maior e muitos estão trabalhando remotamente, pois isso é quase uma situação obrigatória no contexto em que vivemos”, afirmou.
De acordo com ele, como muitas empresas descobriram que o sistema de home office pode ser mais barato, a projeção é de que nem todos que estão trabalhando remotamente voltarão ao sistema presencial quando a pandemia permitir.
“Não acredito que neste ano vá recuperar [o fluxo de passageiros], nem ano que vem.”
A redução na demanda, segundo a associação, gerou perdas de R$ 8 bilhões em receita tarifária entre março e dezembro, num fenômeno que provocou reações distintas entre os sistemas de metrôs, trens urbanos e VLTs no país.
Enquanto nas operadoras públicas o deficit acaba de alguma forma absorvido pelo estado, nas concessionárias não necessariamente isso acontecerá. Há casos, como os das concessões do Rio de Janeiro, que os contratos são antigos e não preveem mecanismos de reequilíbrio econômico-financeiro. Outros, mais recentes, já têm cláusulas do tipo.
Por conta do cenário, o setor de transporte ferroviário de passageiros esperava que um pacote de auxílio de R$ 4 bilhões aos sistemas de transporte público resultasse em ao menos cerca de R$ 140 milhões às concessionárias que atuam no país, mas a proposta foi vetada pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido).
“Esse auxílio não era para fazer frente aos R$ 8 bilhões [de perda de receita], já que a proposta do pacote global era de R$ 4 bilhões. Isso sem incluir ônibus que, se inclusos, elevaria o valor para R$ 16 bilhões. O objetivo não era cobrir o prejuízo, mas permitir que as empresas tivessem caixa para sustentar a operação até que o cenário se reequilibre.”
As concessionárias dos sistemas alegam que foi impossível reduzir os custos de operação na mesma proporção e que, para atender a demanda -respeitando a taxa de ocupação determinada pelos órgãos governamentais-, operaram com oferta de 600 mil lugares/hora nos horários de pico para atender demanda inferior a 350 mil.
Com isso, elas afirmam que o desequilíbrio gerou a maior crise já enfrentada pelo setor de transporte de passageiros sobre trilhos no país e atingiu todas as operadoras, sem exceção.
Há em operação 1.116,5 quilômetros de trilhos no país, com 48 linhas, os mesmos números existentes no ano anterior. O sistema metroferroviário tem 627 estações no país, das quais 3 foram inauguradas em 2020, no Distrito Federal.
As concessionárias, que atendem 71 municípios de 10 estados e o Distrito Federal, empregam 38,4 mil funcionários, sendo 30,6 mil próprios e 7,8 mil terceirizados. Na pandemia, perdeu 3% da mão de obra.
Os sistemas estão presentes em quatro das cinco regiões brasileiras: Sul (Rio Grande do Sul), Sudeste (São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais), Centro-Oeste (Distrito Federal) e Nordeste (Bahia, Alagoas, Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará).
Fonte: Folha de São Paulo/ Blog Sobre Trilhos, 20/04/2021