A ópera dos aumentos dos Combustíveis

Esse mega aumento nos preços dos combustíveis não é novidade para quem vem lá de meados do século XX, como eu. Em 1973 veio o 1º choque do petróleo – até então inimaginável – promovido pela toda poderosa OPEP-Organização dos Países Exportadores de Petróleo (predominantemente formada por países árabes), que elevou abruptamente os preços do barril em mais de 400% em pouco meses. Recentemente, em terras brasilis o hidrocarboneto fracionado também aumentou 400%, contando a partir de 2010, é claro.

Assim como todo o Mundo naquele ano de 1973 o Brasil foi pego com as calças na mão, pois era bastante dependente de petróleo importado. A população amargou enormes prejuízos sofrendo, inclusive, restrições terríveis no abastecimento, que foram agravadas pelo racionamento de combustíveis que limitaram a mobilidade geral.

Seis anos depois, em 1979, veio o 2º choque do petróleo, mas desta vez o Brasil não sofreu tanto porque estava obtendo grande sucesso na implantação de combustíveis alternativos graças ao programa do Proálcool, que estimulou à produção de veículos movidos à base desse combustível renovável, além de obrigar a adição deste à gasolina.

Na década de 1970 o Brasil estava vivendo uma grande expansão Industrial, sobretudo um boom na Indústria automotiva e de autopeças. Entretanto, o preço dessa expansão foi muito alto, pois significou a erradicação de 1/3 de toda malha ferroviária existente até então (caímos de 37 mil km de trilhos para 25 mil). Em nome do progresso, o fim dos trens abria espaços para uma maior mobilidade autônoma do automóvel e do caminhão. Tanto assim que o Brasil tornou-se a 6ª maior frota de automotores do mundo, com mais de cem milhões de veículos, ficando atrás dos EUA, China, Japão, Rússia e Alemanha.

Por outro lado, apesar das dimensões continentais do Brasil, ocupamos a indigesta 79ª posição no ranking mundial de extensão da malha ferroviária, liderada pelos EUA, China, Rússia e Canadá, que são países continentais que ocupam o topo dessa lista. Tem algo errado aqui. Não é à toa que somos, há muitos anos, os campeões mundiais de mortes nas estradas, ao passo que o transporte de passageiros sobre trilhos é o mais seguro do mundo.

Apesar de hoje o Governo Federal demostrar que está dando prioridade na expansão da malha ferroviária, contando com a adição de 19 mil km, suportados por 76 projetos que ultrapassam 226 bilhões de reais em investimentos capitaneados pela inciativa privada através do programa Protrilhos, duas coisas devem ser consideradas: primeiro, que ainda não se tratam de obras de implantação, mas somente Estudos & Projetos, sendo que alguns estão duplicados; ou seja, tem mais de um interessado num mesmo trecho.

Em segundo, são todos projetos para ferrovias de cargas voltadas para exportação de commodities agrícolas e minerais: soja, café, milho e minério de ferro principalmente.

Infelizmente não há previsão de trens de passageiros nesse brilhante modelo desenvolvido pelo Ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, que quebrou o antigo paradigma de que obras ferroviárias são exclusividade do Governo Federal.

No Brasil de hoje praticamente tudo que está na sua mão, na sua casa, no mercado, no bar da esquina, na Amazon.com, no Mercadolivre, etc., veio de caminhão movido à combustível diesel (25% de aumento).   

Resumo do primeiro Ato dessa Ópera: não basta investir em ferrovias que são apenas corredores de exportação de commodities, que vão beneficiar somente os seus produtores e a balança comercial. É preciso que a ferrovia transporte passageiros e carga geral, como é assim no restante do mundo civilizado, sobretudo na Europa.

Resumo do Segundo Ato: dos 29 mil km da nossa malha ferroviária que foi concedida à iniciativa privada em 1996, somente 16 mil km estão em efetiva operação. Os restantes 13 mil encontram-se abandonados ou subutilizados. Mas poderiam estar sendo operados por pequenos trens levando passageiros, turistas e caga geral. Não dá para entender por que as atuais concessionárias ferroviárias ainda não devolveram essas linhas ociosas para que o Governo as licite para novos operadores?  Será que as concessionárias tem medo da livre concorrência?

Resumo do Terceiro Ato: a conta do aumento dos combustíveis vai pesar geral no bolso de todo Mundo. A solução para esse dilema é ampliar a oferta dos transportes sobre trilhos pra que este modo atenda também aos pequenos produtores do comércio, do agro e da indústria, bem como, para a população das mais de oito cidades brasileiras que hoje são altamente dependentes do modo rodoviário. Já passou da hora de quebrar esse paradigma.

Autor: Antonio Pastori – Conselheiro da Aenfer, mestre em Economia Empresarial e pós-graduado em Engenharia Ferroviária.

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