Autoridades rejeitam traçado do TAV sem Campinas

A Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) autorizou que uma empresa dê início à construção e exploração do projeto que pretende implementar o Trem de Alta Velocidade (TAV), mas, ao contrário das discussões e planejamentos anteriores, Campinas está fora do empreendimento. Isso enterra, a princípio, a ideia alimentada desde 2009 de que o município seria um dos pontos de partida de um eventual Trem-Bala. A TAV Brasil, empresa à frente do projeto, não incluiu o município na lista das 20 cidades que o trem passará no Estado de São Paulo e nem nas duas que terão estações, no caso São Paulo e São José dos Campos. Procurada, a empresa não explicou as razões da exclusão de Campinas do projeto. Informou apenas que fornecerá mais detalhes após a assinatura de contrato com a ANTT, ainda sem data para ocorrer. A ferrovia deste projeto, se concretizada, não passará por nenhuma outra cidade da Região Metropolitana de Campinas (RMC).

O prefeito de Campinas, Dário Saadi (Republicanos), e o prefeito de Jaguariúna, Gustavo Reis (MDB) – também presidente do Conselho de Desenvolvimento da RMC – se manifestaram e anteciparam que vão procurar conversar com a ANTT para que Campinas seja considerada e incluída no projeto.

 

“É um absurdo a Região Metropolitana de Campinas, que é a segunda maior do Estado e que tem uma população maior que a do Uruguai, ficar de fora desse projeto do Trem-Bala. Como presidente do Conselho de Desenvolvimento da RMC, vou procurar a diretoria da ANTT para a realização de uma reunião em que vamos pedir a inclusão de Campinas. Esse projeto é um desejo antigo de Campinas e região e trará maior mobilidade para as pessoas e mais desenvolvimento para a RMC, que já tem o Aeroporto Internacional de Viracopos como importante modal de transporte de passageiros e de cargas”, opinou o prefeito de Jaguariúna.

Dário afirmou que também vai solicitar uma reunião com a direção da ANTT e que vai entrar em contato com os deputados da região para que a cidade seja incluída no traçado do Trem de Alta Velocidade. Para o Prefeito, o porte da RMC justifica que ela seja contemplada no novo projeto.

O prefeito de Campinas ressaltou os esforços da Administração Municipal junto ao Governo do Estado de São Paulo para a implantação do Trem Intercidades (TIC), ligando Campinas a São Paulo. O edital de licitação do TIC deve ser publicado ainda neste semestre, de acordo com a previsão do Estado. A avaliação é que no curto e médio prazo, o TIC é o projeto mais viável e que beneficiaria milhares de pessoas que transitam diretamente entre Campinas e São Paulo. “É um projeto que conta com total apoio e entusiasmo do governador Tarcísio de Freitas”.

 

Especialistas opinam 

Doutor em Engenharia com foco em Mobilidade Urbana, Luiz Vicente Figueira de Mello Filho lembrou que a obra é extremamente elaborada e complexa, pensando, por exemplo, em todas as questões topográficas. Por isso, por mais que seja um primeiro passo, ainda há muita coisa para acontecer até a concretização. Embora reconheça que seria ótimo Campinas ter um Trem-Bala e toda uma estrutura ferroviária melhorada, o especialista vê que há um caminho alternativo com o Trem Intercidades.

“Eu penso que se nós tivermos um trem convencional, um trem moderno, que levaria um pouco mais de uma hora de São Paulo para Campinas, algo que já foi anunciado pelo Governo do Estado, ter essa construção, essa nova modalidade de transporte, seria de uma maneira muito mais rápida do que se nós migrássemos para um Tem-Bala. Se nós pensarmos, operacionalmente falando, em um trem que leva um pouco mais de uma hora de São Paulo para Campinas, e se a efetivação levar menos que dez anos para ser operacionalizada, ele é muito melhor do que se pensarmos em um Trem-Bala que vai levar décadas e fica uma dúvida se a gente consegue.”

Figueira de Mello Filho brincou que o “ótimo é inimigo do bom” ao lembrar que há esse projeto com um trem moderno, semelhante ao utilizado na Europa, e que não demandaria grandes mudanças na malha ferroviária ou nas estações de trem, ao contrário do Trem de Alta Velocidade.

“O investimento é baixo em relação ao Trem-Bala. Teríamos que fazer uma nova ferrovia, totalmente moderna. Eu acho que esse é o caminho, não estou sendo contra de maneira nenhuma, mas enquanto engenheiro, pensando na viabilidade do negócio, hoje seria muito mais viável concretizar uma linha de trem convencional, mas um trem moderno.”

Em outra análise, o presidente da Associação de Engenheiros e Arquitetos de Campinas (AEAC), Paulo Sergio Saran, lamentou a exclusão da cidade do projeto, tratando como uma “decisão infeliz” e que ignora o “alto potencial econômico e tecnológico” da RMC. Embora também considere que a implantação é complexa e cara, ele acredita que os benefícios são evidentes e que seria algo “extraordinário não apenas para a população de Campinas, mas para a região toda”. Ainda, Saran concorda com a mobilização de lideranças da região para que Campinas volte a ser considerada na criação do Trem-Bala.

“Deveria haver uma grande mobilização do poder público, das prefeituras de Campinas e região, que também seriam beneficiadas, e de todos os deputados estaduais e federais da RMC. Eu entendo que o custo dessa eventual extensão da linha para Campinas será altamente compensado pelas inúmeras vantagens dessa ligação, principalmente pelo aumento significativo do número de passageiros, o que vai refletir na diminuição do custo operacional”.

Para Saran, a possibilidade de mais cidades serem incluídas no projeto no futuro não é satisfatória. Ele lembrou que o Brasil está atrasado no transporte sobre trilhos, algo que deveria ser não do futuro, mas do presente – ou até do passado. “Nós já perdemos muito tempo, não dá para perder mais, para esperar e pensar que daqui uns anos possam incluir Campinas. Acredito que aí se torne inviável. A luta tem que ser agora, a inclusão de Campinas tem que ser agora”, concluiu.

Projeto anterior previa linha no canteiro da Bandeirantes

No início do desenvolvimento do projeto anterior, em 2009, havia a expectativa de que o Trem de Alta Velocidade ligasse Campinas ao Rio de Janeiro, passando por São Paulo. Uma das hipóteses era que Campinas pudesse ter uma linha construída no canteiro central da Rodovia dos Bandeirantes. Campinas teria uma estação em Viracopos e ligaria à sua área ferroviária da região Central ao aeroporto. Entretanto, não houve a adesão esperada dos interessados no leilão. Houve uma determinação da ANTT em 2012 de que o TAV teria que ser finalizado e entregue até o final do primeiro semestre de 2020, o que não aconteceu por diversos motivos, como a divergência entre os valores estimados pelo Governo Federal e pelas empresas e também a crise política e econômica da década passada.

Agora, o cronograma para a implantação do novo empreendimento, considerando que ele realmente comece este ano, prevê o início das operações ferroviárias para junho de 2032. A obra teria 378km, com a ferrovia tendo a velocidade máxima projetada de 350 km/h e o trem podendo superar os 300 km/h. Ainda são necessárias algumas etapas até a concretização. A aprovação não garante por si só que o empreendimento seja concluído. Outra diferença é que este projeto é para ser um investimento privado e a autorização para construção e exploração do TAV por parte da ANTT tem um período de vigência de 99 anos. O modelo de operação tem o objetivo de viabilizar investimentos do setor privado na construção de ferrovias sem que, para isso, haja a necessidade de se realizar leilão e pagamentos de outorga.

ANTT fará o acompanhamento dos projetos em todas as autorizações, mas as obrigações de obtenção dos licenciamentos junto aos órgãos competentes, o desenvolvimento dos projetos de engenharia e de viabilidade socioambiental, a busca de financiamento e a definição das etapas da obra serão de responsabilidade da empresa, segundo o governo federal.

Fonte: https://correio.rac.com.br/campinasermc/

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