Voltou a ser comentado, depois de 10 anos, a ideia de se implantar o Trem de Alta Velocidade, ligando as duas maiores cidades do País, agora na modalidade de Permissionário, projeto este liderado por um grande Consórcio privado.
Trago aqui pra reflexão dos leitores, alguns pontos importantes. Da forma proposta, como TAV, ligando O Bairro de Santa Cruz, no Rio, até o entroncamento das rodovias Carvalho Pinto e Tamoios, próximo de Guarulhos, sem se estender até Campinas, projeto de R$ 50 bilhões, – R$ 35 bi para obras civis, R$ 6 bi para desapropriações, R$ 9 bi para compra de 45 trens e infra estrutura rodante – executado em nove anos de Obras, fica economicamente inviável.
Deve-se melhorar o Projeto, em diversos pontos e conceitos, tornando-o viável. A começar por substituir o Trem de Alta velocidade, que atinge 400 Km/h, pelo Trem Regional, que opera a até 180 Km/h. Ainda se fosse a 90 Km/h, em média, já seria um enorme ganho para o Brasil.
Fundamental o Trem sair do Centro do Rio, Gares D. Pedro II ou Leopoldina, passar pela Estação da Luz e chegar no Centro de Campinas, com frequência a cada meia hora, nos dois sentidos. Ao longo do Vale do Paraíba, nos dois Estados, poderiam ter 4 ou 5 paradas. Com 60 milhões de passageiros/ano, além da venda de bilhetes, considerando-se outras receitas operacionais e não operacionais, pode-se chegar no ponto de equilíbrio do Projeto.
Outro mito que não encontra amparo técnico, é que não há dificuldade na engenharia ferroviária em vencer desníveis. Vide os trens suíços, inclusive nos Alpes. Aqui no Paraná, temos um trem de passageiros ligando Curitiba a Morretes / Paranaguá pela Serra do Mar, com 110 Km de extensão, percorrido em 3 h de puro deleite, por dentro da Mata Atlântica, na Serra do Mar, vencendo 940 M de desnível.
Aqui no Rio, o Trem do Corcovado sobe há 139 anos um desnível de 700 metros. Tecnologia do Séc XIX. Tem também o Trem de carga na Serra de Santos e o Trem da Montanha Capixaba.
Outros trens que venceram grandes desníveis funcionaram por aqui, com muito sucesso, por dezenas de anos. Só pra citar o mais famoso, a primeira ferrovia do Brasil, inaugurada pelo Visconde de Mauá em 1854, ligava a Capital Federal ao glamour imperial, nossa Petrópolis.
Claro, no Brasil não temos TAV. Mas nem precisamos! Se voltarem os trens regionais, rápidos, confortáveis e seguros, já estaremos muito bem servidos.
Existe ainda o leito ferroviário por onde passava o Expresso Santa Cruz e depois, já privatizado, o Trem de Prata. Está lá, com trechos percorridos por trens de carga. Esse leito pode ser compartilhado, trens de carga e passageiros, barateando muito os custos de implantação. Não há necessidade de um novo trajeto.
Para encerrar com essa minha reflexão, o Trem não é concorrente da Ponte Aérea, nem dos modernos leitos rodoviários. Ele é um modal distinto, diferente, que oferece ao passageiro, da sua ampla janela panorâmica, uma vista única e inigualável. Ganha-se muito tempo no embarque e desembarque, sempre Central, sem maiores burocracias. Quem já se sentou no vagao-restaurante de um trem, jamais esquece essa experiência.
Minha preocupação é que, partindo de conceitos errados e exagerados, vamos abrir mão desta nova chance de revitalizar esse modal espetacular que o Brasil, de forma inconsequente e criminosa, exterminou no final da década de 1950. Melhor faremos se nos dedicarmos a corrigir os pontos que inviabilizam o Projeto do que simplesmente condená-lo. Torço muito por esse trem que vai ser o símbolo do renascimento dos trens no Brasil!
Autor: Sávio Neves – Associado da Aenfer, engenheiro Mecânico, ferroviário, presidente da Associação Brasileira dos Operadores de Trens Turísticos e Culturais, presidente do Trem do Corcovado e ex-secretario Estadual de Turismo