Há 13 anos, a cidade de Campinas, a 93 km de São Paulo, estava tão perto quanto hoje de ter um trem que levasse passageiros à capital paulista. O governo federal estava com um edital aberto para a construção do trem-bala, com a expectativa de que a primeira viagem pudesse ocorrer a tempo da Olimpíada no Rio. Deu tudo errado.
Hoje o edital aberto é para outro trem, o Intercidades, com promessa de trajeto até São Paulo em cerca de uma hora.
O trem-bala tem céticos até dentro do governo federal, mas o prefeito de Campinas, Dário Saadi (Republicanos), não desistiu dele. A empresa TAV Brasil foi autorizada a construir e operar uma linha de alta velocidade pela ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) em fevereiro, em um projeto que exclui a cidade do interior paulista do traçado.
Médico urologista, Saadi enfrenta problemas na saúde municipal: três bebês morreram na maternidade municipal neste ano, motivando a abertura de um inquérito do Ministério Público que investiga as condições sanitárias da unidade, e o prefeito recorreu ao governo estadual para ampliar a quantidade de leitos pediátricos.
O prefeito sonha, ainda, com uma marca mundial para a terceira maior cidade do estado. Ele quer terminar o mandato tendo viabilizado a criação de um novo polo tecnológico que, em suas palavras, seja referência na América Latina. É um empreendimento que promete transformar a paisagem pacata dos bairros no entorno das duas maiores universidades da região.
O que o senhor achou da retirada de Campinas do traçado do trem bala pela TAV Brasil? A proposta do TAV [trem de alta velocidade] é um pouco embrionária, inicial. Acreditamos que, neste momento, o mais viável é o Trem Intercidades. Vamos continuar fazendo esforço para que Campinas seja incluída [no projeto do trem-bala], se o projeto avançar. Nos parece que ainda não tem uma estruturação financeira, nem estudo de viabilidade muito concreto.
A partir do momento que esse estudo avançar, certamente Campinas tem chance de ser incluída, não só por ser uma cidade de 1,2 milhão de habitantes, mas porque só a microrregião tem 3,3 milhões.
Alguém explicou o motivo pelo qual a cidade foi retirada do projeto? No nosso entendimento, é um primeiro estudo técnico que tirou Campinas. Uma fase de estudos, de estruturação de um possível formato econômico. Mas passar por ali [no eixo São Paulo-Rio] e não entrar em Campinas é perder público, perder tudo. A gente acha que essa proposta pode ser alterada se o projeto caminhar.
O Trem Intercidades está com o edital aberto e a previsão de que haverá um resultado até novembro… O governador Tarcísio [de Freitas, do Republicanos] está muito empenhado, ele é um apaixonado pelo modal ferroviário. E está muito seguro de que o processo finaliza até o final do ano. Já estamos fazendo a revitalização de um grande barracão bem próximo ao local em que chega o Trem Intercidades, uma revitalização no pátio ferroviário. Estamos com muita esperança de que realmente seja concluído.
E com o Trem Intercidades, Campinas ainda vai precisar do trem-bala? Vamos ter que discutir. É claro que, para nós, ter mais possibilidades de transporte é importante. Vamos continuar discutindo o trem de alta velocidade mesmo quando o Intercidades se tornar realidade. Não estamos falando só de uma cidade nessa discussão sobre modal de transporte. São milhões de habitantes, há um potencial muito grande. É por isso que acho que, com o amadurecimento do projeto, vai chegar uma hora que [o grupo TAV Brasil] vai ter que discutir com Campinas. Do ponto de vista da sustentação de um sistema tão caro, vai ter que incluir uma região metropolitana de 3,3 milhões de habitantes.
A previsão é que a passagem do Trem Intercidades de Campinas a São Paulo custe R$ 64, enquanto o ônibus hoje custa cerca de R$ 45. Vai ser uma opção realmente competitiva? Sim, a diferença não pode ser muito grande, para não inviabilizar [a viagem de trem]. Tem muita gente de Campinas que trabalha em São Paulo. Para uma viagem eventual, R$ 20 ou R$ 30 a mais não afetam tanto. Se for todo dia, isso sim afeta o usuário do sistema. Então, a gente espera que o processo de licitação possa reduzir um pouco o preço, para não ficar tão diferente [o valor da passagem de trem e ônibus].
Fonte: Folha de São Paulo, 19/05/2023