Maria Fumaça completa 30 anos do primeiro passeio entre Bento Gonçalves, Garibaldi e Carlos Barbosa
Objeto de fascínio de crianças e curiosidade de adultos, a Maria Fumaça completa, neste mês, 30 anos do seu primeiro passeio, mas a história das locomotivas movidas a vapor começa muito antes e com outro propósito, o de transportar vagões carregados de carvão mineral.
A Maria Fumaça, na verdade, são duas locomotivas, a Mikado 156 e a Jung 4, que se revezam para atender a alta demanda de turistas que, desde 1993, passeiam por Bento Gonçalves, Garibaldi e Carlos Barbosa. A mais antiga, fabricada nos Estados Unidos em 1941, tem o número 156 gravado em seu bico e, antes de ser destinada aos passeios turísticos, puxava vagões de carga e de passageiros em Tubarão, atendendo, assim, cidades do litoral de Santa Catarina. Produzida na Alemanha, em 1954, a Jung 4 está parada há quatro meses para manutenção, segundo a direção da Giordani Turismo, empresa criada para operar a concessão. Antigamente, a locomotiva puxava vagões carregados de carvão mineral extraído das minas da Companhia Siderúrgica Nacional, também no Estado vizinho.
A família Giordani coordena o serviço em Bento Gonçalves desde os anos 1990, quando foram abertos os editais de trens turísticos no Brasil.
— Eu trabalhava na Vasp (extinta Viação Aérea São Paulo) e voltei para abrir uma agência de turismo. Aí foi quando surgiu a oportunidade de assumirmos a operação da Maria Fumaça. Diziam que eu levaria meu pai, Leonel, à falência, já que fomos os únicos interessados em administrar. O pai sempre foi muito visionário e acreditou, embarcou na ideia, e aí começou o processo de restauração das locomotivas — relembra Susana Giordani.
O início não foi fácil, segundo ela. Com vagões e a caldeira deteriorados, faltavam também as peças necessárias para fazer as locomotivas andarem. Para isso, o então mecânico e chapeador Leonel, patriarca da família e proprietário da empresa que também detém a concessão do transporte público de Bento, arregaçou as mangas.
— Administrar a locomotiva era considerado um negócio péssimo pela falta de peças disponíveis para reposição. Um produto que ninguém dava bola, ficou quase sete anos parado depois da antiga Ferrovia do Vinho ser abandonada — lembra Leonardo Giordani, filho de Leonel.
Com as máquinas sendo reformadas era preciso restaurar também os trilhos. Para isso, cada município por onde o trem passaria doou 500 dormentes, peças colocadas na via férrea para assentar os trilhos, antes que a malha ferroviária fosse privatizada em 1997.
— Antes da privatização ainda operávamos com maquinistas cedidos pela Rede Ferroviária Federal. Tínhamos a operação dentro do trem, com apresentações terceirizadas, e éramos nós da família que recepcionávamos os turistas e trabalhávamos nas bilheterias — conta Andreia Zucchi, diretora administrativa da Giordani Turismo.
Para fazer a locomotiva sair da inércia e percorrer os 23 quilômetros que separam as estações dos três municípios, Bento Gonçalves, Garibaldi e Carlos Barbosa, são necessários hoje 900 quilos de briquete (serragem prensada) e quatro mil litros d’água. Mas nem sempre foi assim. No início, a Maria Fumaça operava com carvão mineral, que depois seria substituído por madeira de reflorestamento.
A operação demandou muito investimento e o retorno financeiro veio a ocorrer, segundo a família, somente anos depois, com o aumento da oferta de passeios, antes realizados somente aos finais de semana.
— Os primeiros anos foram só investimento sem retorno. Isso só começou a mudar quando os passeios começaram a ser vendidos por agências de turismo — lembra Andreia.
Na alta temporada, nos meses de julho, novembro e dezembro, a Maria Fumaça puxa até oito vagões com capacidade para 50 pessoas cada. São passeios embalados por música típica e também com opções de gastronomia e degustação de vinhos a bordo.
Música é o que não falta nos passeios da Maria Fumaça
Experiência movimenta 70 artistas
Degustação de bebida é tradição nas paradas nas estações
Na foto, maquinista Sérgio Gonçalves
Além do fascínio de um passeio com um veículo antigo, equipes proporcionam diversões variadas
“O trem é minha família”, diz artista
Mais do que reviver o passado ao embarcar em um trem, a Maria Fumaça oportuniza experiências aos turistas com atrações que movimentam 70 artistas. São eles os responsáveis pelas apresentações de música a bordo, sempre às quartas, sextas, aos sábados e domingos.
Uma das primeiras artistas a fazer parte da história da Maria Fumaça foi a cantora Inês Rizzardo, que em 1994 estreou na estação de Garibaldi e desde lá segue embalando os turistas com música italiana:
— O trem é minha família. Lá passam milhares de pessoas com histórias maravilhosas. Saí da colônia com 23 anos para abrir um salão de beleza, mas foi a Maria Fumaça que me fez decidir pela música e passar a estudar canto.
Enquanto Inês movimenta o passeio com música, cabe a Juliano Agostine de Moraes, 38, fazer a manutenção diária das máquinas. Natural de Vacaria, Moraes se mudou para a Serra em função da profissão do pai, ferroviário. Ele cresceu em uma casa ao lado da estação de Bento Gonçalves, junto da Maria Fumaça, e tinha oito anos quando o trem realizou o primeiro passeio. Desde lá, Moraes desempenhou diversas funções:
— Nesses mais de 20 anos, comecei fazendo serviços gerais e passei a ser maquinista. Hoje, sou responsável pela manutenção. Sempre tem manutenção a cada passeio e o melhor de tudo é oportunizar essa vivência de andar de trem para as pessoas.
A Maria Fumaça trafega a uma velocidade média de 28 km/h e, por lei, não pode ultrapassar os 30 km/h. Para isso, o maquinista, o auxiliar e o encarregado por abastecer a caldeira precisam controlar a liberação do vapor gerado por ela.
Serviço do passeio
Embarque: Estação Férrea de Bento Gonçalves
Duração: três horas
Valor: R$235 (crianças até 5 anos não pagam).
O bilhete dá acesso ao Parque Temático Epopeia Italiana, que reproduz cenários e conserva a história da imigração na Serra. O parque fica ao lado da Estação.
Fotos: Neimar De Cesero / Agencia RBS
Fonte: gauchazh.clicrbs.com.br