Transporte público no Rio: especialistas defendem autoridade metropolitana para solucionar tarifa cara e falta de integração
O Globo – A criação do que é chamado de autoridade ou entidade metropolitana é vista como fundamental por especialistas e representantes de concessionárias para dar uma reviravolta no caos que está o transporte público da região. Mas a instituição teria que ser, dizem, uma estrutura autônoma, independente, e não uma pasta vinculada ao governo do estado ou à Prefeitura do Rio, como as já implantadas, que nunca funcionaram efetivamente. Uma das chaves para resolver o entrave do desequilíbrio tarifário é a interlocução na gestão de municípios e estados, aponta Márcio D’Agosto, doutor em engenharia de transportes pela Coppe/UFRJ.
— Os poderes públicos têm que estar alinhados para integrar esse sistema e não atuar como concorrentes. Uma sugestão que a gente tem dado é estruturar e fortalecer uma instituição metropolitana para o transporte. O sistema impacta vários municípios, então tem de ter uma ação conjunta entre essas cidades e o estado, e articular para que todos sejam beneficiados — afirma D’Agosto, que cita ainda exemplos internacionais. — Isso que é feito na maioria dos países da América do Norte. Cidades como Boston, Washington e Nova York, nos Estados Unidos, têm órgãos metropolitanos de transporte.
Política única de subsídios
Outro defensor da autoridade metropolitana, o presidente do MetrôRio, Guilherme Ramalho, lembra Madri. A cidade decidiu manter, pelo menos até o fim de junho, medida implantada após a pandemia que reduz 60% no preço dos passes mensais e 50% no valor do cartão multiviagem.
— Lá, eles reduziram o preço da passagem para fomentar a utilização de transporte público. Ampliaram, investiram em transporte. O planejamento do transporte é todo integrado, feito dentro de uma junta metropolitana. As linhas de ônibus são complementares ao sistema de metrô e trens. Os ônibus da Região Metropolitana não entram na cidade, param em bolsões de integração em volta de Madri — descreve.
Ramalho destaca ainda a necessidade de oferta de um transporte público mais abrangente e de uma nova política de subsídios:
— Existe um distanciamento de preços entre os modais, que está desincentivando o uso de transporte não poluente e de massa. A gente resolve isso criando um planejamento metropolitano, tendo uma política de subsídio universal e única, que não gere distorções e dissonâncias entre os modais, criando uma tarifa única metropolitana integrada, para permitir que as pessoas se desloquem na metrópole de acordo com o seu interesse de viagem. Isso vai permitir que a gente tenha uma cidade mais limpa e melhor.
Professor doutor do Departamento de Engenharia Industrial da PUC-Rio e organizador do Comitê Científico do Rio de Transportes, Rafael Martinelli Pinto destaca que o Rio de Janeiro tem um desafio muito grande porque possui uma das maiores regiões metropolitanas do mundo. Acrescenta que é preciso principalmente planejamento e lembra que as soluções envolvem tanto a integração de modais como tarifária:
—Tem que haver uma cooperação entre as prefeituras do Grande Rio e o governo do estado. E a gente precisa de algo como uma entidade metropolitana que cuide, que tenha essa visão em cima do transporte, com as prefeituras do Grande Rio e com o governo do estado trabalhando juntos.
Sobre a questão tarifária, Martinelli cita soluções adotadas em outras cidades, que é a integração temporal, ou seja, o pagamento de uma tarifa única durante um intervalo de tempo para pegar qualquer transporte público dentro de uma cidade, que é o cenário comum em metrópoles, como Montreal e Paris. Ele lembra que em Hamburgo, na Alemanha, há um sistema de divisão por zonas, em que se paga uma determinada tarifa fixa para circular dentro de cada uma delas, independentemente do número de veículos que usar.
Pedágio urbano
Outros bons exemplos, acrescenta ele, são Nova York e Paris, com suas dezenas de linhas de metrô e muitas de trens. Nova York, inclusive, criou este mês pedágio urbano para quem quiser circular no trecho mais congestionado de Manhattan.
— No Rio, não se tem um cartão que sirva para vários dias. Acho bem interessante poder comprar o bilhete de um mês e rodar o quanto quiser. Não é uma tarifa barata em algumas cidades, mas você deixa de ter a preocupação de ficar pagando a tarifa — afirma.
Já Cintia Machado de Oliveira, professora da Coppe/UFRJ, ressalta que “hoje não tem uma pessoa ou um órgão que pense o transporte de forma integrada”.
— É cada um por si — diz. — O importante é todo mundo estar no mesmo sentido para restaurar a confiança do usuário, atrair pessoas para o transporte público, tirar essa pressão dos congestionamentos e ir pontualmente nas questões que cada um consegue gerenciar. Pensar no custo, na segurança, na priorização.
Fonte: https://oglobo.globo.com/rio/, 27/01/2025
Foto: Assessoria Especial de Comunicação Social do Ministério das Cidades