Agência Infra – O lançamento do Plano Nacional de Ferrovias está pendente de validação do ministro dos Transportes, Renan Filho, e do presidente Lula, segundo informou na última quinta-feira (27) o secretário da pasta, Leonardo Ribeiro, que apresentou as bases do projeto durante o primeiro Painel de Referência da Comissão de Solução Consensual da Ferrovia Malha Sudeste, da MRS, realizado pela SecexConsenso (Secretaria de Controle Externo de Solução Consensual e Prevenção de Conflitos) do TCU (Tribunal de Contas da União), em Brasília.
O plano vem sendo anunciado pelo ministério desde o ano passado, mas encontra dificuldades de alinhamento entre diferentes órgãos do governo, segundo apurou a Agência iNFRA, especialmente no que tange a quanto de recurso será usado para investimentos no setor e como ele será distribuído entre os projetos.
Ao longo do tempo, o ministério tem falado em diferentes números de quanto estima obter com as revisões que está fazendo nos contratos de renovação antecipada de ferrovias assinados no governo passado que a atual gestão entendeu que foram renovados por valores aquém do devido.
Esses recursos seriam aportados em projetos de concessão de novos trechos ferroviários como forma de viabilizar economicamente o contrato. No entanto, nos processos de repactuação em que o dinheiro já entrou, os recursos foram direcionados ao Tesouro Nacional. O setor defende que o dinheiro fique alocado nas ferrovias, mas há uma briga interna no governo pelo dinheiro e por onde ele será alocado.
Segundo o secretário disse no evento, o plano terá como fonte de recursos o OGU (Orçamento Geral da União) ou o adicional de vantajosidade decorrente da repactuação de contratos renovados. Em linhas gerais, o plano deverá apresentar soluções logísticas, com medidas diferenciadas por contrato ou por trecho ferroviário.
O secretário, no entanto, ressaltou que avanço via OGU tem limitações, citando risco de contingenciamento, postergação das entregas, maiores custos logísticos e o uso do mecanismo de DRU (Desvinculação de Receitas da União), que poderia vir a reduzir recursos para o setor. Mas o plano também trabalha com a possibilidade de auxílio com conta vinculada para preencher o chamado “gap de viabilidade” dos projetos.
Ele listou que o plano trabalha com modelos diferente para implantação de projetos, como o chamamento público, investimento adicional (no caso do trechos Cariacica a Anchieta, no Espírito Santo), empréstimo subsidiado via FDNE (Fundo de Desenvolvimento do Nordeste) para a Transnordestina, obra pública (Fiol 2, Ferrovia de Integração Oeste-Leste 2), investimento cruzado no Mato Grosso (Fico 1, Ferrovia de Integração Centro-Oeste 1), repactuações contratuais, prorrogações antecipadas e leilões.
De acordo com Ribeiro, o plano se concentra em três pilares. O primeiro deles passa pela busca de obtenção de recursos próprios para o setor, por meio do reinvestimento dos recursos provenientes das repactuações de contratos, de modo que não haja uma dependência de recursos do Tesouro.
O segundo se refere à criação de um banco de projetos para ampliação e otimização da malha ferroviária. E o terceiro aspecto trata do avanço normativo e das diretrizes de política pública voltadas para atrair o investimento privado.
Segundo o secretário, o plano nacional divide o país em quatro eixos – Nordeste, Norte, Sudeste e Oeste – com soluções específicas para cada um deles. Ele ainda contempla as chamadas shortlines, linhas férreas mais curtas, em trechos já existentes, que podem ser implementadas por meio de chamamento público. E também linhas novas a serem implantadas, caso dos ativos da Cedro e Arauco.
Na apresentação, o secretário disse que o governo federal tem atuado no setor de ferrovias principalmente em três frentes: aperfeiçoamento dos normativos, estabelecimento de incentivos públicos para destravar investimentos privados e a elaboração de projetos a partir de EVTEAs (Estudos de Viabilidade Técnica, Econômica e Ambiental).
Em relação às políticas em curso, o secretário disse que a pasta está validando a primeira Política de Outorgas Ferroviárias e que trabalha, em paralelo, na validação das Políticas de Material Rodante, Política Nacional de Transporte Ferroviário de Passageiros, regulação de devolução de trechos e faixa de domínio, além da interoperabilidade.
Conta vinculada
Segundo Carlos Rafael Simões, auditor-chefe da AudPortoFerrovia do TCU, o uso do mecanismo de contas como destino para o excedente de recursos financeiros decorrentes das repactuações de contratos de concessão de ferrovias, firmados na SecexConsenso, ainda não é um consenso no entendimento do tribunal, sendo um tema que traz algumas preocupações.
“Mesmo aqui no tribunal a gente não tem um consenso pleno. A gente tem processo aberto sem decisão de mérito sobre contas vinculadas. Por isso a importância de a gente se debruçar sobre isso dentro da comissão”, disse.
No entendimento de Ribeiro, se os recursos forem usados conforme proposta do governo, a pasta estaria alocando-os de forma eficiente, à medida que houvesse um procedimento licitatório combinado ao uso do instrumento. “Nós estaríamos alocando recursos na medida do necessário, pois, quando nós fazemos recursos no gap de viabilidade, a gente está antecipando receitas daquele estudo, as despesas, trazendo tudo a valor presente. E isso traz uma eficiência na aplicação dos recursos”, defendeu.
Coordenadora da SecexConsenso, Gabriela Farias afirmou que a secretaria tem como objetivo principal otimizar os contratos por meio da verificação de alocações ineficientes, promovendo mudanças na execução das obrigações do contrato, visando o interesse público. Ela afirmou que há diversos mecanismos à mesa sendo discutidos, como contas vinculadas, fundos públicos, saldos de outorga livres e investimentos cruzados.
A procuradora da ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres), Silvia Leão, avaliou que a discussão sobre a destinação dos recursos no caso da MRS é mais simples e passa pela criação de uma conta de destino para os recursos. “Eu acho que a gente precisa fatiar as questões. Eu tenho aqui um problema do consenso para resolver, um montante, um recurso, uma verba que eu tenho que dizer onde a concessionária se compromete a depositar. E eu tenho um mecanismo de contas [na ferrovia], sim, que a gente sabe que está na Malha Oeste”, disse, ressaltando que no caso da Malha Oeste há expectativa tanto de repactuação como de um novo leilão, caso o acordo não prospere.
Davi Barreto, diretor-presidente da ANTF (Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários), disse ser favorável ao mecanismo de contas vinculadas. Ele fez uma ressalva ponderando que a execução do investimento por uma empresa que não vai operar a malha não é eficiente.
Luis Baldez, presidente da Anut (Associação Nacional dos Usuários do Transporte de Carga), falou da oferta de capacidade. Ele disse que há no setor empresas dispostas a utilizar mais as ferrovias. Segundo ele, muitas empresas estão interessadas em linhas troncais, sob duas condições básicas para isso se viabilizar: que o dinheiro fique no trecho e que a interoperabilidade fique assegurada.
Repactuação da MRS
Gustavo Bambini, diretor institucional da MRS, disse que por parte da empresa não há qualquer objeção de que os recursos fiquem na ferrovia. No entendimento da empresa, o Plano Nacional traz uma otimização ao mesmo tempo em que mantém compromisso em relação ao volume e à quantidade de obras que a companhia terá de fazer.
“Também somos entusiastas da ideia de que, em vez de otimizar o plano e pagar o adicional de vantajosidade diretamente aos cofres da União, que a gente possa, de fato, encontrar o melhor mecanismo para que esses recursos fiquem nas ferrovias, seja por intermédio do instrumento da conta vinculada, com todos os problemas que a gente ainda tem para enfrentar e chegar numa visão final.”
Trechos não operacionais
O secretário da SecexConsenso do TCU, Nicola Khoury, propôs uma reflexão sobre a devolução de trechos não operacionais. “Às vezes um grupo vai devolver um trecho que para outro grupo pode fazer sentido”, afirmou. Ele também informou que o trabalho da secretaria se estende para além do fechamento do acordo. “Vamos dar atenção ao pós-acordo.”
Fonte: Agenciainfra.com, 31/03/2025