Indústria de trens de passageiros vive ‘boom’

Valor Econômico – A indústria metroferroviária vive uma onda de licitações, impulsionada por contratações bilionárias e por Parcerias Público-Privadas (PPPs) de mobilidade urbana, que têm movimentado o mercado no país.

Na última semana, o governo paulista anunciou que os chineses da CRRC deverão instalar uma fábrica em Araraquara (SP) para atender projetos locais. Em paralelo, a francesa Alstom, principal fabricante no país, começa a se preparar para disputar diretamente licitações do governo paulista, como forma de garantir a contratação de seus trens e serviços, diante da competição maior.

Até mesmo a CAF, que segundo fontes do setor estava com sua produção no interior de São Paulo praticamente parada, voltou à atividade. A empresa fará a readequação de carros de VLT (Veículo Leve sobre Trilhos) que havia fabricado no passado para um projeto em Cuiabá (MT), que não saiu do papel, e agora serão destinados ao governo da Bahia, para uma nova operação em Salvador.

“É um momento especial para o setor. Nem na época da Copa do Mundo o mercado foi tão aquecido no país como está agora. Há realmente um ‘boom’ do setor metroferroviário que nunca vi. Isso não só no Brasil, mas na América Latina, com muitas linhas novas”, afirmou a diretora-geral da Alstom no Brasil, Suely Sola.

Hoje, a fábrica da companhia em Taubaté (SP) opera sem ociosidade, com projetos no Brasil e para exportação. A empresa já tem diversos projetos no radar para manter o ritmo de produção à medida que as encomendas atuais forem entregues.

Uma das licitações em estudo é a PPP das Linhas 10 e 14 de trens urbanos em São Paulo, que a Alstom avalia disputar em consórcio com um grupo de construção civil, segundo Sola. Em geral, a fabricante tem atuado nas concessões como fornecedora, porém agora poderá se tornar operadora direta. O governo paulista planeja licitar ainda neste ano a concessão – outra provável concorrente no leilão é a chinesa CRRC.

Segundo a executiva, a estratégia de entrar no capital do projeto busca elevar a probabilidade de o grupo ser o fornecedor dos trens e dos sistemas de sinalização. Além disso, ela avalia que as condições do edital são positivas, embora a empresa ainda esteja em diálogo com o Estado sobre sugestões de mudanças.

Na visão de uma fonte, trata-se de uma forma de a empresa se manter competitiva diante do avanço da chinesa no mercado brasileiro. A CRRC, que já conquistou PPPs em São Paulo e em Minas Gerais, decidiu instalar uma fábrica no país após vencer uma concorrência do Metrô paulista para fornecer 44 trens. O investimento será de R$ 50 milhões a princípio, o que foi visto no setor como uma indicação de que, por ora, a atividade será limitada, apenas com a montagem final no local.

Na visão de Vicente Abate, presidente da Associação Brasileira da Indústria Ferroviária (Abifer), a instalação da chinesa no país é importante, porque traz isonomia tributária com as empresas presentes no Brasil. “Quando trazem os trens completos e a importação é feita pelo governo, há isenção tributária, eles ficam mais competitivos. Mas, estando no Brasil, terão os mesmos benefícios e as mesmas agruras das demais fabricantes”, disse.

Hoje, a maior parte das oportunidades da indústria está em São Paulo. Além do leilão das linhas 10 e 14, outros projetos que deverão sair até 2026 são os aditivos de extensão das linhas 4 e 5 do Metrô, em negociação com a Motiva (ex-CCR); a extensão da linha 6, da Acciona; e o Trem Intercidades de Sorocaba, que deverá ter leilão no próximo ano. Adicionalmente, o governo deverá abrir em agosto as audiências públicas para a nova linha 16, que está sendo estudada pela Acciona, segundo o secretário de parcerias em investimentos do Estado, Rafael Benini.

“Além disso, nos próximos dez anos vai haver uma grande renovação da frota do Metrô de São Paulo. O ciclo de vida de um trem é de até 50 anos aproximadamente, e o Metrô completou 50 anos”, afirmou o secretário.

Em outros Estados, Abate cita também possíveis oportunidades de VLT em Curitiba, renovações de frota e expansões no Metrô de Brasília, compra de trens no sistema do Rio Grande do Sul e eventuais projetos no Ceará, entre outros. “Nossa expectativa é que esses sistemas de transporte vão avançar e, com isso, naturalmente a indústria terá um aumento das encomendas”, disse.

A Marcopolo Rail, cujo foco de atuação tem sido projetos de menor porte de VLT, trens regionais e turísticos, também enxerga um potencial de crescimento do mercado. A companhia, criada como uma nova divisão da Marcopolo em 2019, está finalizando a entrega dos trens para o “people mover” que irá conectar os trens urbanos de São Paulo ao aeroporto de Guarulhos, e deverá fornecer trens para o VLT de Teresina.

Hoje, a planta da empresa tem capacidade para produção de até 30 carros por ano, mas conforme novos projetos forem conquistados, a companhia planeja expandir a unidade, afirmou Petras Amaral Santos, gerente executivo da Marcopolo Rail. “Temos mapeado o mercado e já vemos a possibilidade de aumento de volume de produção”, disse.

Entre as oportunidades que interessam à empresa estão linhas entre cidades, como os projetos de Brasília-Luziânia, Salvador-Feira de Santana, entre outros.

Fonte: valor.globo.com, 05/08/2025

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