A concessionária de ferrovias Transnordestina Logística S. A. (TLSA), controlada pela Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), recebeu ao longo de 2015 oito aportes de recursos do governo federal que somaram R$ 420 milhões. Os valores, oriundos do Tesouro Nacional, foram aplicados por meio da empresa pública Valec, responsável por construir e explorar ferrovias. O montante representa quase um quinto do total investido pela estatal no ano passado.
Os dados foram levantados pelo Valor por meio do Portal da Transparência do governo federal. O aumento de capital na concessionária ferroviária, realizado em parcelas depositadas de junho a dezembro de 2015, se soma a outro aporte feito no ano anterior. Em 2014, a TLSA já havia recebido R$ 400 milhões do governo por meio da Valec, que é sócia no bilionário empreendimento.
Em troca, a participação da Valec no capital social da Transnordestina vem aumentando. Passou de 8,2% do total das ações no começo de 2014 para 25,6% ao fim daquele ano. Ao fim de 2015, subiu para o patamar atual de 31,96% do total de ações. Por ora, a Valec continua sem participação nas ações ordinárias, papéis que conferem direito a voto.
A capitalização da Transnordestina pela Valec, informou ao Valor o presidente da empresa, Ciro Ferreira Gomes, que foi governador do Ceará e ministro, faz parte do acordo firmado com o governo anos atrás para implantar a obra, com desenho de 1,75 km, cortando os estados de Pernambuco, Ceará e Piauí.
Segundo Gomes, a estatal pode atingir até 49% do capital total da TLSA em ações preferenciais. Mais cerca de R$ 170 milhões da estatal estão previstos para este ano. A Valec tem dois representantes no conselho da empresa, participa de tomada de decisões e tem direito a vetos, informou.
O executivo, que está à frente da empresa de logística da CSN desde fevereiro de 2015, disse que, por algumas razões e condições de dificuldades do país, há um atraso de repasse de quase R$ 1,8 bilhão à obra. São recursos principalmente do BNDES (R$ 501 milhões), Fundo de Desenvolvimento do Nordeste (FDNE), que é ligado à Sudene, com R$ 800 milhões, e do Fundo de Investimento do Nordeste (Finor), com R$ 360 milhões.
Enquanto isso, informou Gomes, a CSN busca sócios locais e do exterior para aportar ao menos R$ 2 bilhões na Transnordestina, o que poderá mudar a configuração societária atual da concessionária. Ele disse que faz parte do compromisso da CSN de buscar recursos que completem a diferença entre os R$ 7,5 bilhões definidos na reestruturação do projeto (em 2011) e seu valor atualizado, de R$ 11,2 bilhões.
De acordo com os dados arquivados na Comissão de Valores Mobiliários (CVM), atualmente a CSN detém a maioria das ações da Transnordestina, com 56,91% do capital total. Considerando apenas ações ordinárias, a participação da siderúrgica é de 99%.
A Valec disse que a decisão de aportar R$ 420 milhões no ano passado “foi baseada em pareceres favoráveis de diversos órgãos do governo federal”. “O projeto, considerado estratégico para o governo brasileiro, consta do programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e guarda consonância com atribuição precípua da Valec, que é a de promover o desenvolvimento do sistema de transporte de cargas sobre trilhos”, informou, em nota, por meio de sua assessoria.
Segundo a Valec, do montante aportado, R$ 200 milhões já foram subscritos e os outros R$ 220 milhões encontram-se “na condição de Adiantamentos para Futuro Aumento de Capital”.
Conforme publicou o Valor nesta semana, os pagamentos da Valec a construtoras locais caíram 26% em 2015, para R$ 2,26 bilhões. Segundo a estatal, a queda no ritmo das obras e, consequentemente, na realização de pagamentos às empresas “devem-se às restrições orçamentárias atuais”.
Atualmente, disse Gomes, a Transnordestina tem 600 km de trilhos prontos, outros 600 km em obras e mais cerca de 600 km em fase de contratação. E que os atrasos se devem a vários fatores, entre eles atrasos nos repasses de recursos de órgãos federais e desapropriações de áreas não realizadas – próximas do porto de Suape (PE), principalmente, e que estão a cargo do governo federal.
Para o presidente da TLSA, são contingências de uma obra normal e dessa magnitude. “Não posso passar o trem por cima de 1,2 mil famílias”. No caso de Suape, disse estar negociando com o governo estadual uma variante da linha para chegar ao porto e resolver essa questão. Em Pecém, porto cearense que fica em outra ponta do traçado da ferrovia, informou que 96% das desapropriações já foram realizadas.
Gomes disse que a ferrovia tem enfrentado vários problemas em sua execução. Aponta o rompimento do contrato de construção que estava com a Odebrecht, que durou um ano, o atraso no fluxo de dinheiro dos órgãos federais e o atraso nas desapropriações.
O presidente da TLSA afirma que não há nenhuma chance – “nem remota” – de perda da concessão da Transnordestina. “Nunca houve um caso no país”. O Tribunal de Contas da União (TCU) pode determinar que a ANTT (agência do setor) abra processo de caducidades da concessão. “Mas isso não vai acontecer”, disse Gomes.
Fonte: Valor Econômico, 02/03/2016