Vale e governo buscam solução para ferrovias

Valor Econômico – O governo federal e a Vale retomaram, nas últimas semanas, conversas para tentar resolver o impasse sobre as concessões ferroviárias operadas pela mineradora, as Estradas de Ferro Carajás e Vitória-Minas. Segundo fontes, que pediram anonimato, há interesse das duas partes em chegar a um consenso, porém ainda há muita divergência sobre o valor final a ser pago pela mineradora.

Pessoas a par do tema citam dois encontros já realizados e afirmam que um terceiro deverá acontecer nos próximos dias. O primeiro deles se deu entre o ministro Renan Filho (MDB-AL) e representantes da Vale durante a COP30, em Belém. Há duas semanas, uma nova reunião foi realizada em Brasília. Apesar da reaproximação, fontes dizem que não há uma mesa de negociação formalmente aberta.

Neste ano, uma tentativa de acordo entre governo e Vale, no âmbito da câmara de consenso do Tribunal de Contas da União (TCU), fracassou no fim de agosto. Após meses de discussão, o prazo máximo para a repactuação se encerrou, sem que as partes chegassem a um meio-termo.

Depois disso, a mineradora chegou a pedir ao órgão a reabertura das conversas, o que foi negado, dado que as normas não permitem a retomada nesses casos – agora, eventuais propostas de acordo deverão ser discutidas no TCU fora do âmbito da Secex Consenso (Secretaria de Controle Externo de Solução Consensual e Prevenção de Conflitos).

Nesse contexto, surgiu dentro do governo a proposta de decretar o fim da renovação antecipada da concessão da Estrada de Ferro Carajás, firmada em 2020 pela mineradora, e a realização de uma nova licitação do trecho. Fontes afirmam que não há decisão tomada a respeito do tema.

No governo, há áreas mais duras que defendem a ideia, inclusive na Casa Civil. Porém, na visão dos defensores de um caminho mais consensual, essa decisão seria drástica e difícil, mas possivelmente seria uma forma de pressionar a Vale em uma negociação. Ainda não há análise jurídica sobre essa possibilidade, e os estudos de viabilidade de um novo leilão não estão tramitando junto a órgãos técnicos que costumam trabalhar nas análises, afirmam fontes.

Neste momento, o governo está finalizando uma nota técnica com uma proposta de como prosseguir com as discussões, diz uma delas.

A Vale firmou a renovação antecipada das concessões ferroviárias em 2020, na gestão de Jair Bolsonaro (PL). O aditivo prevê a extensão contratual até 2057, em troca do pagamento de outorga de R$ 11,8 bilhões e outros R$ 12,9 bilhões em contrapartidas (em valores divulgados à época).

Porém, a partir de 2023, o novo governo apresentou questionamentos aos valores pactuados e passou a cobrar um adicional.

Após negociações duras, no fim de 2024 as partes divulgaram um acordo preliminar que trazia as bases gerais da repactuação do aditivo, com previsão de um aporte de R$ 11 bilhões da Vale, dos quais R$ 4 bilhões já foram pagos ao Tesouro. Porém, uma série de outras pendências continuaram em aberto, e não houve consenso sobre o valor final.

A negociação envolve as duas concessões da Vale, mas cada uma enfrenta divergências de naturezas distintas, afirmam as fontes.

No caso da Estrada de Ferro Carajás, a disputa se dá em torno do cálculo da base de ativos da concessionária. O governo aponta que o montante calculado na renovação de 2020 gerou um pagamento muito aquém do justo, considerando o retorno da empresa com a operação até 2057. Com isso, cobra um valor de compensação.

Já na Vitória-Minas, a obrigação assumida pela Vale foi a construção de um trecho da Ferrovia de Integração Centro-Oeste (Fico), entre Mara Rosa (GO) e Água Boa (MT). A obra, porém, se mostrou muito mais complexa e onerosa do que o previsto inicialmente, o que também tem gerado discussões.

Nas negociações, a mineradora tentou se livrar da obrigação de fazer o trecho completo, entregando apenas uma parte. Porém, a possibilidade não está mais em discussão, disse uma fonte. Internamente, a empresa avalia que está em dia com suas obrigações. Já o poder público aponta que as obras terão atraso e a companhia precisará responder por isso.

Apesar do impasse, pessoas envolvidas afirmam que há disposição de se chegar a um acordo, que interessa aos dois lados. Uma delas avalia que, até o fim deste ano, será possível chegar a um acordo.

Fontes do setor público avaliam que a Vale terá de ceder em parte, porque precisará de uma flexibilização dos cadernos de obrigações das concessões ferroviárias. Além disso, apontam que o interesse em manter boa relação com o governo federal vai além do setor de transportes. Ao mesmo tempo, as fontes ponderam que o governo também quer concluir a negociação o quanto antes, dado que os valores adicionais da empresa deverão viabilizar novos projetos que a equipe quer leiloar em 2026.

Procurados, o Ministério dos Transportes, a Casa Civil e a Vale não comentaram o tema.

Fonte: Valor Econômico, 03/12/2025

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