O governo vai lançar mais pressão sobre as atuais concessionárias de ferrovias. Depois da decisão de exigir a devolução de trechos que estavam subutilizados pelas operadoras, agora o alvo são as regras para a cobrança do transporte de cargas.
O Valor apurou que a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), que fiscaliza e regula a setor ferroviário, vai reduzir o teto das taxas que podem ser praticadas pelas empresas de transporte. Essa queda terá índices diferentes conforme o tipo de insumo transportado, mas, em média, o valor máximo vai encolher 25%.
Segundo uma fonte que participou diretamente da elaboração da nova resolução, o corte já está definido e a nova regra entrará em vigor até o fim do mês que vem. Com a medida, o governo quer reduzir a “gordura” que hoje existe nas margens de lucro praticadas pelas atuais concessionárias. Ao pressionar o teto tarifário concedido a essas empresas, avalia-se que elas serão obrigadas a investir mais pesadamente em tecnologias e gestão de negócios que levem ao aumento da produtividade, caso queiram manter a mesma taxa de retorno que alcançam hoje.
A informação sobre a mudança tarifária foi recebida com surpresa e preocupação pelo presidente da Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários (ANTF), Rodrigo Vilaça. Procurado pelo Valor, o representante das concessionárias de ferrovias disse que sabia da intenção do governo em rever as tarifas praticadas até agora, mas não tinha ideia de que essa queda no índice poderia chegar a 25%.
“Vamos ter que discutir esse assunto. Certamente essa redução coloca uma pressão muito forte sobre as empresas. Nós estamos falando de um setor que já investe pesado, todos os anos, e que trabalha com margens razoavelmente estreitas”, disse Vilaça. “Esperamos que o governo nos convide para tratar mais profundamente desse assunto.”
Pelas regras atuais da concessão ferroviária, as empresas do setor recebem do governo uma tabela com o teto tarifário que podem aplicar em cada tipo de produto que transportam. Dentro daquele limite, as companhias têm total liberdade para praticar o preço que julgarem mais competitivo.
A fórmula que a ANTT usou para estabelecer o novo teto tarifário leva em conta uma combinação de fatores, entre eles os custos logísticos apresentados pelas concessionárias, a distância percorrida para fazer o transporte do produto, o plano de investimentos assumido pela companhia e a capacidade de oferta de serviço. “A ideia não é reduzir o lucro de ninguém, mas pressionar por mais investimento. Quem quiser manter o lucro, terá que investir mais”, diz a fonte.
A alteração no teto tarifário faz parte das novas medidas que o governo desenhou para o setor de ferrovias, as quais incluem o fim da exclusividade que as empresas detêm hoje sobre as malhas que assumiram na década de 90, com o fim da Rede Ferroviária Federal (RFFSA).
O novo pacote de concessões ferroviárias anunciado na semana passada pelo governo incluiu, conforme adiantou o Valor, a devolução de uma série de trechos que, atualmente, estão subutilizados pelas empresas. Essa devolução vai exigir um acerto de contas entre as concessionárias e a União, já que essas companhias passarão a ser responsáveis por uma porção de malha inferior àquela assumida no passado. “Não dá para largar o osso e ficar só com o filé. Certamente haverá indenização”, disse a fonte.
A Ferrovia Centro-Atlântica (FCA), controlada pela Vale, está entre as concessionárias que vão devolver parte de seus trechos. O governo já negociou com a companhia a linha que liga Rio de Janeiro e Vitória e a malha entre Belo Horizonte e Salvador.
A ANTT estima que, dos 28 mil km de ferrovia que foram concedidos na década de 90, apenas 23 mil km possuem hoje algum tipo de operação comercial, embora a maior parte dessas linhas ainda tenha grande potencial para ampliar as atuais taxas de transporte de carga.
Com o objetivo de ampliar a transparência em investimentos e na gestão das malhas realizados pelas concessionárias, a agência reguladora também vai exigir um plano trianual de investimentos de cada companhia.
A ANTF destaca que, enquanto a União injetou R$ 1,39 bilhão no setor entre 1997 e 2011, as concessionárias desembolsaram R$ 28,6 bilhões no mesmo período. Só no ano passado, foram aplicados R$ 4,6 bilhões na melhoria e expansão das linhas, um resultado 153% superior ao que estava previsto para o período. O volume geral de carga transportada pelos trilhos nos últimos 14 anos cresceu 140,5%. No ano passado, foram movimentadas 290,5 bilhões de toneladas por quilômetro útil (TKU) sobre trilhos. Para este ano, as concessionárias estimam que o volume atinja 320 bilhões de toneladas.
Fonte: Valor Econômico, 21/08/2012