O governo fez um redesenho geral do pacote de concessões de ferrovias, que foi anunciado há seis meses. Nos próximos dias, sai a versão preliminar (minuta) do primeiro edital de concessão, que passará por audiência pública e ainda poderá sofrer alterações: a construção de um trecho de cerca de 530 quilômetros entre o município de Açailândia (MA) e o porto de Vila do Conde (PA). Na prática, trata-se de um prolongamento da Ferrovia Norte-Sul, hoje operada pela Vale entre Açailândia e Palmas (TO).
Diante do ineditismo do novo modelo que será aplicado nas ferrovias – ainda pouco compreendido pelo mercado -, esse trecho funcionará como uma espécie de projeto-piloto para o ambicioso plano de concessões. As regras usadas no lote Açailândia-Vila do Conde serão as mesmas das demais licitações. O mercado está ansioso por conhecer essas regras. Por isso, o governo optou por lançar somente um edital no primeiro momento, a fim de discutir os detalhes do novo modelo com investidores privados e ter um termômetro que indique a necessidade de futuros ajustes.
O pacote original de concessões previa 12 lotes, que somavam 10 mil quilômetros de extensão, em duas fases. Os seis primeiros lotes, com 2,6 mil quilômetros, deveriam ter seus estudos divulgados em janeiro, e os leilões estavam previstos para abril. Esse cronograma sofreu um pequeno atraso. À exceção do trecho Açailândia-Vila do Conde, o governo estuda agora a possibilidade de fazer todo o processo de forma simultânea aos seis outros lotes, que serão leiloados no segundo semestre.
A meta ainda é assinar todos os contratos até o fim de 2013, mas o desenho dos lotes a serem concedidos também vai mudar, com a inclusão de dois trechos importantes: Palmas (TO)-Anápolis (GO) e Ouro Verde (GO)-Estrela D’Oeste (SP). Eles não vão ser construídos pela iniciativa privada. Ambos já estão em estágio avançado de execução pela estatal Valec. Ao todo, acrescentam 1.535 quilômetros de trilhos ao plano original do governo, que decidiu concedê-los à iniciativa privada, porque a Valec não tem experiência na operação.
As concessões desses dois trechos – ambos na Norte-Sul – não vão ser feitas de forma isolada, mas turbinando outros dois lotes, que devem ficar mais atrativos. O trecho Palmas-Anápolis fará parte do lote entre Lucas do Rio Verde (MT) e Uruaçu (GO). O trecho Ouro Verde-Estrela D’Oeste será incorporado ao lote que ia de Estrela D’Oeste a Maracaju (MS). As futuras concessionárias das linhas terão cinco anos para construir os novos trechos. Quando o uso da ferrovia para o transporte de carga atingir 70% de sua capacidade, será disparado um gatilho para a realização de obras de expansão – primeiro, com desvios ferroviários nos pontos mais críticos; depois, na medida em que esses desvios forem aumentando, com a efetiva duplicação das linhas.
Como já se sabia, a estatal Valec comprará a capacidade integral de carga das ferrovias, eliminando o risco de demanda das futuras concessionárias. Depois, revenderá no mercado o direito de passagem por essas ferrovias, por meio de oferta pública. O que ainda não estava claro era a forma de disputa das licitações.
Vencerá cada leilão quem oferecer, à Valec, a menor tarifa de trem por quilômetro percorrido. Esse sistema de disputa se assemelha ao das rodovias, no qual o governo fixa uma tarifa máxima de pedágio e os concorrentes apresentam propostas com um deságio sobre esse valor. Quanto maior o deságio, menos a Valec terá que desembolsar para a compra da capacidade de transporte das ferrovias. Com isso, diminui a despesa que tem no primeiro momento da concessão, antes de obter receitas com a revenda do direito de passagem.
O ex-presidente da Valec José Eduardo Castello Branco, que pediu demissão em setembro, já havia estimado em até R$ 4 bilhões por ano a despesa da estatal na compra de 100% da capacidade de transporte das novas linhas. Segundo ele, a despesa seria maior no início das concessões, já que depois a estatal irá recuperando o investimento com a revenda às empresas interessadas em transportar mercadorias ou passageiros.
No novo desenho do governo, a concessão do trecho Açailândia-Vila da Conde terá seu edital definitivo em abril, caso seja aprovado pelo Tribunal de Contas da União (TCU). O leilão seria realizado no fim do primeiro semestre. Não há previsão de mudar o prazo dos contratos – de 30 anos – nem de alterar substancialmente as condições de financiamento, como ocorreu com as rodovias, mas outros ajustes ainda poderão ser feitos.
Três lotes de pequena extensão em São Paulo – o trecho norte e o trecho sul do Ferroanel, além do acesso ferroviário a Santos – talvez não saiam mais como concessões isoladas. O governo avalia a possibilidade de turbinar outros lotes com esses corredores. O trecho sul do Ferroanel, por exemplo, poderá entrar na mesma concessão da ferrovia entre São Paulo e Rio Grande (RS).
Fonte: Valor Econômico, 13/02/2013