O governo prepara novos mecanismos para afastar dos investidores o temor de um eventual “calote” da estatal Valec nas concessões de ferrovias. Os Ministérios dos Transportes e da Fazenda trabalham na construção de uma solução, que deve ser a escolha de um ativo da União a ser dado como garantia dos pagamentos futuros.
O modelo proposto para as concessões ferroviárias prevê que as empresas privadas construirão e farão a manutenção das novas linhas férreas, mas a Valec comprará toda a capacidade de carga. Dessa forma, mesmo na hipótese de a ferrovia ser pouco utilizada, o concessionário faturará como se ela estivesse operando com lotação de 100%.
Ainda assim, o mercado está desconfiado. Os empresários querem garantias de que a estatal terá recursos para pagar a eles ao longo dos 35 anos da concessão. “Existe o risco Valec”, disse o presidente da Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários (ANTF), Rodrigo Vilaça. Ele questiona como será possível confiar na capacidade administrativa da estatal. Ela é responsável pela construção da Ferrovia Norte-Sul, que é alvo de processos no Tribunal de Contas da União (TCU) por superfaturamento e erros de projeto.
Há um mês, o Estado informou sobre um estudo elaborado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) que aponta para a mesma direção. O trabalho diz que, num cenário de crise fiscal, que não está colocado hoje mas pode surgir no futuro, a Valec poderia sofrer fortes restrições orçamentárias ou, até mesmo, ser privatizada.
“Vamos mitigar totalmente esse risco”, informou o presidente da Empresa de Planejamento e Logística (EPL), Bernardo Figueiredo, que admite ter recebido ponderações de empresas sobre o problema. Mas a insegurança não seria em relação à Valec, e sim em relação aos recebíveis, ou seja, como eles receberão os pagamentos durante o contrato.
O instrumento adicional em estudo pelo governo é a definição de um ativo que garantiria os pagamentos da Valec. Figueiredo observa que existe um fundo garantidor das Parcerias Público-Privadas (PPP). É justamente um dinheiro que serve para honrar pagamentos ao setor privado que o governo, por alguma razão, deixe de fazer.
Contratos. Além do “risco Valec”, o presidente da ANTF aponta também para a insegurança jurídica das concessões ferroviárias. “Como confiar num contrato de 35 anos, se eu estou na metade do prazo da minha concessão e eles já mudaram as regras?”, questiona Rodrigo Vilaça. A entidade reúne os atuais concessionários de ferrovias.
A principal queixa da ANTF é a adoção do modelo aberto de ferrovias, tecnicamente chamado de “open access”. Por ele, os trens devem ter livre acesso a todas as linhas, independentemente de quem seja concessionário. Até agora vigorou o modelo vertical, no qual a concessionária controla quem utiliza a linha férrea.
O presidente da EPL rechaça a avaliação de que houve ruptura de contratos. “O direito de passagem está nos contratos atuais”, diz Figueiredo. “Se há descumprimento, ele ocorreu no passado.”
Fonte: Agência Estado, 10/03/2013