O universitário Rodrigo Sampaio levou nesta segunda-feira duas horas e meia da casa de sua namorada, em Piabetá, em Magé, até a Praça Cardeal Arcoverde, em Copacabana. Não era horário do rush. Mesmo assim, para conseguir chegar no horário marcado, às 14h, Rodrigo utilizou três meios de transportes: uma van até a Rodoviária Novo Rio, um ônibus e, depois de permanecer 20 minutos parado em um engarrafamento na Avenida Rodrigues Alves, ele acabou optando por pegar o metrô na Central do Brasil. O percurso teria sido bem diferente, mais rápido, se o projeto de transportes para o Rio, idealizado por ele em parceria com o também estudante Pedro Geaquinto, saísse do papel.
Nesse caso, Rodrigo pegaria um trem expresso em Piabetá, passaria por oito estações até chegar à Central, onde pegaria o metrô para Copacabana. Pelos seus cálculos, não levaria nem uma hora. Isso porque a oferta de metrô da cidade seria bem maior, com 420 quilômetros de extensão e 320 estações distribuídas em 12 linhas — bem diferente do modelo atual, que tem 40 quilômetros de extensão. O estado ou a empresa privada que construísse a rede gastaria entre R$ 38 bilhões e R$ 60 bilhões, segundo os estudantes, aproveitando os traçados já existentes e adaptações do sistema de trens suburbanos. Por outro lado, o novo metrô contemplaria 12 milhões de usuários diariamente, em comparação aos atuais 645 mil passageiros. Também não haveria necessidade de ir de carro para o trabalho, e o trânsito fluiria.
Ex-presidente do metrô, Miguel Bahury, porém, afirma que o custo da rede poderia ser bem mais salgado. Ele calcula em US$ 100 milhões (cerca de R$ 220 milhões) o quilômetro subterrâneo a ser construído.
— Isso sem levar em conta as desapropriações, que encarecem muito a obra — diz. — Sempre defendi a expansão do metrô formando uma rede, e tudo é possível. Seul começou a construir seu metrô em 1974, e já tem 266 estações e 286 quilômetros.
O plano é detalhado no blog da dupla, Quero metrô! Criado em 2011, ele se propõe a discutir sugestões para a “melhoria definitiva do sistema metroviário metropolitano”. Teve mais de 80 mil acessos desde então. A ideia inicial do blog foi de Pedro, de 22 anos, que é estudante de engenharia química da Universidade Federal Fluminense (UFF).
— Tenho uma paixão por cidades, e o metrô é um grande símbolo da cidade grande. Eu queria poder ir para os confins da metrópole por meio de um transporte decente e isso, infelizmente, não existe no Rio — diz Pedro, que mora no Andaraí e perde horas de seu dia em deslocamentos até a universidade. Como sempre gostou de fazer mapas, resolveu criar o site. Logo percebeu que os seus amigos ou mesmo pessoas aleatórias da internet gostavam do que ele fazia:
— No começo, era só um passatempo, mas a discussão foi crescendo e tomei gosto pela coisa.
Os dois amigos se conheceram num fórum da internet, o SkyscraperCity, que discute infraestrutura e urbanismo. Morador do Encantado, Rodrigo, de 25 anos, estuda engenharia de metais na Universidede Federal do Rio Janeiro (UFRJ) e engenharia mecânica no Cefet. Assim como Pedro, é vítima dos engarrafamentos. Ele se interessou pelo tema quando passou a andar nos trens da Supervia diariamente em 2004:
— Logo no início, as vantagens do sistema, mesmo sucateado, chamaram minha atenção, porque eu levava de 20 a 30 minutos para chegar em casa.
Projetos antigos: suporte
Para traçar um plano tão complexo como o de interligar todo o estado ao metrô, eles utilizaram projetos já existentes. Alguns que nunca saíram do papel, como o trajeto original do metrô, de 1969; o Plano Agache (no caso de trens diretos/expressos); o plano do arquiteto Jaime Lerner (com os corredores transversais); e o Plano Diretor de Transportes Urbanos (PDTU), de 2002.
— A proposta da Linha 4 que defendemos é uma incorporação do projeto licitado em 1998 (mas passando pelo Jardim Botânico) com o corredor T-1, proposto na década de 80 por Jaime Lerner, fazendo uma ligação transversal entre Botafogo e a Central do Brasil — afirma Rodrigo.
Comparação com modelos de outras metrópoles foi inevitável
Quando passaram a estudar os sistemas de transporte de outras metrópoles — como Londres, Paris, Buenos Aires, Los Angeles, Madri, Hong Kong e Pequim —, as comparações com o Rio foram inevitáveis. Nessa época passaram a sentir uma certa “inveja” de algumas cidades e sistemas.
Ao fazer tais comparações entre o metrô do Rio e os de grandes cidades, eles chegaram à conclusão de que o principal problema do sistema carioca, além das poucas estações e de quase nenhuma integração, é a falta de planejamento.
— Costumo dizer que aqui no Rio tudo é para 2016. Diferentemente de São Paulo, onde há um planejamento a longo prazo de uma rede de transportes, no Rio parece não haver uma sinergia entre as esferas de poder envolvidas para se criar uma rede — conta Rodrigo — E quem sofre com essa falta de planejamento somos nós.
O Quero Metrô! prevê a criação de sete novas linhas que fariam toda a diferença: Deodoro-Carioca, Rodoviária-Recreio Shopping, Ribeira-General Osório, Arariboia-Largo da Batalha, Fundão-Jardim Sulacap e Bosque de Marapendi-Vilar dos Teles.
Pelo projeto, parte dos trilhos da Supervia seria adaptada para um metrô de superfície. As estações do metrô que já funcionam seriam mantidas.
Para eles, uma das grandes dificuldades para solucionar o transporte do Rio é a falta de ligações transversais, seja no metrô ou mesmo nas vias rodoviária, com exceção da Linha Amarela. Pedro cita exemplos de bairros da cidade que ficam muito próximos, como Tijuca e Vila Isabel, mas em que se perde um tempo enorme para ir de um para outro.
— No Rio, parece que todas as linhas terminam na Central. Pelo nosso projeto teríamos uma nova alternativa à Central com a estação da Leopoldina, diminuindo o gargalo. — diz Rodrigo. — Para funcionar precisa haver integração entre metrô, ônibus, trens e barcas.
Fonte: O Globo, 08/10/2013