Editorial: O nó da mobilidade urbana

Os dados levantados pelos estudos feitos periodicamente sobre as dificuldades de deslocamento nos grandes centros urbanos mostram que esse problema continua um dos mais graves enfrentados pelo País, pois têm sido tímidos os esforços para melhorar o transporte coletivo. Os brasileiros de todas as regiões, com destaque para a Sudeste, parecem condenados a pagar, ainda por um bom tempo, um alto preço pelo atraso histórico na ampliação, principalmente, do sistema metroferroviário, resultado da falta de visão dos governantes.

Trabalhos apresentados durante o evento Fóruns Estadão Regiões – realizado pelo Grupo Estado com a participação de representantes do governo e da iniciativa privada – mostram que os quatro Estados do Sudeste terão de investir R$ 589,6 bilhões nos próximos cinco anos em infraestrutura, com destaque para a mobilidade em suas regiões metropolitanas. Embora essa seja a região mais rica do País, responsável por 55,4% do PIB nacional, é um esforço considerável. Mas que ainda fica longe do que é necessário para resolver o problema com a brevidade desejada pela população.

Um estudo feito pelo Ipea, com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2012, revela dados impressionantes. É de 30 minutos o tempo médio que o brasileiro gasta apenas para chegar ao trabalho. A média sobe para 40 minutos nas áreas metropolitanas, e na Região Sudeste chega a 43 minutos. Valores que devem ser multiplicados por dois para completar o tempo gasto diariamente para ir e voltar do trabalho.

O porcentual de brasileiros das metrópoles do Sudeste que gastam mais de uma hora em seus deslocamentos diários é o dobro do das outras grandes cidades do País. Dos moradores das regiões metropolitanas de São Paulo, Rio e Minas, 21,3% levam mais de uma hora para chegar ao trabalho. Esse índice cai para 11,5% em sete metrópoles de outras regiões.

Esse dado negativo está longe de ser uma exclusividade das áreas mais ricas. Infelizmente, ele está cada vez mais presente também nas grandes cidades do Norte e do Nordeste. Segundo um dos responsáveis pelo estudo do Ipea, Carlos Henrique Ribeiro de Carvalho, isto se deve ao acentuado crescimento da frota de veículos nessas regiões, nos últimos anos, que ocorreu, “sobretudo, nas classes mais pobres”. Um exemplo disso é a região metropolitana de Belém, onde o tempo para chegar ao trabalho aumentou 35,4%, passando de 24,3 minutos em 1992 para 32,8 minutos em 2012. Outro é Salvador, onde o aumento foi de 27,1%.

A precariedade do transporte urbano afeta, além das várias regiões, as diferentes camadas sociais. A população de baixa renda, principalmente porque a maior parte dela mora na periferia, longe dos locais de trabalho, é evidentemente a mais prejudicada. Em seguida vem a classe média que usa o transporte coletivo. E as pessoas que têm condições de usar o transporte individual também não escapam do tormento diário da demora para ir e voltar do trabalho, porque ficam presas nos congestionamentos que só fazem crescer. Andar de carro para chegar mais rápido já não é uma solução, e o será cada vez menos, à medida que mais pessoas insistirem em apelar para ele.

O que é preciso fazer para resolver o problema é sabido há muito tempo: implantar ou ampliar, conforme o caso, a rede de metrô e de trens de subúrbio e intermunicipais nas regiões metropolitanas e, como isso demanda tempo, melhorar a curto prazo o serviço de ônibus. O primeiro caso exige investimentos muito maiores que os que vêm sendo feitos, para recuperar o atraso histórico, num esforço conjunto de municípios, Estados e União. O segundo exige determinação das prefeituras para enfrentar o poderoso grupo de empresas que dominam o setor, ganham muito e oferecem serviços de má qualidade.

Essas são escolhas difíceis, que exigem dos governantes coragem e compromisso com o futuro, sem o imediatismo e a miopia dos interesses eleitorais.

Fonte: O Estado de S. Paulo, 22/11/2013

2 comentários em “Editorial: O nó da mobilidade urbana”

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