Como de hábito, levei mais de uma hora para percorrer os 25 quilômetros que separam a minha casa, na Barra da Tijuca, ao escritório, no Centro do Rio. A velocidade média, como se pode constatar, ficou abaixo dos 20 km/h. Como não há metrô, trem ou barcas ligando a Barra ao Centro, minha única alternativa seriam os ônibus, que gastam, no barato, mais de uma hora e meia para fazer o mesmo percurso.
Há apenas dois anos, em condições normais de temperatura e pressão, eu costumava levar, no máximo, 40 minutos no trajeto de casa para o trabalho. De lá para cá, o número de automóveis nas ruas do Rio de Janeiro cresceu exponencialmente, enquanto a infraestrutura viária tem se deteriorado a olhos vistos.
Um dos princípios basilares da ciência econômica nos diz que “incentivos importam”. Tal princípio é facilmente demonstrável através das curvas de demanda. Sempre que algum produto fica mais caro, seu consumo diminui e vice-versa. Pois bem: sucessivos governos federais – no afã de manter o consumo em alta e incentivar o crescimento econômico a qualquer preço – têm incentivado a aquisição de carros, seja através da isenção de IPI, seja concedendo crédito farto nos bancos públicos, seja mantendo o preço dos combustíveis artificialmente baixos. Como era de se esperar, a “nova classe média brasileira” foi às compras com voracidade, enchendo as ruas das grandes e médias cidades de carros e motocicletas.
Até aqui, nada demais, além, é claro, do sufoco em que se encontra a Petrobras, obrigada a bancar os preços baixos dos combustíveis. O problema é que os demais entes da federação, especialmente os governos dos maiores municípios brasileiros (falo especificamente de Rio de São Paulo), não entraram na dança do governo federal e resolveram infernizar a vida dos proprietários de veículos, recusando-se a incrementar a infraestrutura viária das cidades.
Picados pela mosca da “mobilidade urbana”, os prefeitos das maiores cidades do país resolveram tirar o pouco espaço dos carros e entregá-lo aos ônibus e às bicicletas, principalmente através das famigeradas pistas seletivas. Além disso, ao invés de construir pontes e viadutos, como fazem os americanos, insistem em derrubar os poucos existentes, como fez recentemente o prefeito Eduardo Paes, no Rio de Janeiro, na tentativa de transformar a megalópole carioca na nova Amsterdã dos trópicos. Tudo isso, sem que a cidade maravilhosa disponha de transportes públicos alternativos minimamente decentes. O lema desses prefeitos é o mesmo de um ex-prefeito de Bogotá, para quem democracia significa “um ônibus que passa em boa velocidade enquanto um carro está parado no engarrafamento.” O resultado, como não poderia deixar de ser, é o caos.
Amsterdã é uma cidade pequena, linda, tranqüila e altamente civilizada. Seus metrôs, pequenos trens de superfície, ciclovias, canais navegáveis e ônibus funcionam perfeitamente, tornando os automóveis, em muitos casos, itens supérfluos. Em menor grau, o mesmo pode ser dito de Paris ou Londres. Entretanto, o Rio de Janeiro apresenta muito mais similaridades com cidades americanas, como Miami, do que com aquelas aprazíveis cidades européias. Sem dizer que, na Europa, não existem incentivos governamentais para a aquisição de veículos. Lá, ao contrário do que ocorre aqui ou nos EUA, não só os carros são muito caros, mas também o combustível é caríssimo.
Então, aqui no Rio de Janeiro, ao invés de se investir em obras viárias para adaptar a cidade ao volume cada vez maior de veículos, como ocorre em Miami, por exemplo, o prefeito decidiu que o carro é o grande vilão, e ai de quem insistir. Ficamos então com o pior de dois mundos: muitos carros nas ruas, nenhum investimento viário e transportes coletivos absolutamente horrorosos. E salve-se quem puder…
João Luiz Mauad é administrador de empresas
Fonte: O Globo, 20/12/2013