Especialistas apontam queda no uso do modal e defendem revitalização
SÃO PAULO — O Brasil já teve 32 mil quilômetros de ferrovias, mas hoje apenas 14 mil quilômetros são operacionais. Um maior uso das ferrovias para o transporte de cargas poderia reduzir significativamente os custos, a emissão de gás carbônico e os acidentes no trânsito, que causam a morte de 37 mil pessoas por ano. O assunto foi um dos temas do evento “E agora, Brasil?”
— É preciso aproveitar a experiência passada, aprimorá-la e investir. Mas a ferrovia foi sendo deixada de lado — frisou o ex-ministro dos Transportes e presidente da Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias (ABCR), César Borges.
De acordo com Paulo Resende, da Fundação Dom Cabral, em 2002, o valor dos ativos de infraestrutura brasileira, incluindo as ferrovias, equivalia a 22% do PIB. Hoje está em 12%. Em termos de comparação, no Japão essa proporção é de 65%, e nos Estados Unidos, de 50%. E o governo Donald Trump já considera um grande gargalo a recuperação da infraestrutura americana, disse Resende:
— Ou seja, em 15 anos, mesmo com investimentos da iniciativa privada e dos programas do governo federal, nós tivemos uma desvalorização jamais vista entre as principais economias do mundo.
O diretor-presidente da Arteris, David Díaz, lembrou que na Espanha a maior parte das vias ferroviárias é deficitária em resultado operacional, mas a atividade cria muitos empregos. Na visão de Díaz, não dá para olhar a infraestrutura de forma isolada, “porque os projetos trazem muitos empregos e, a longo prazo, há um efeito multiplicador”.
Renovação antecipada
Na pauta do país para as ferrovias, o governo federal espera concluir ainda este ano a renovação antecipada de concessões, em troca de novos investimentos. Isso porque, sem a participação da iniciativa privada, a União não tem como investir nesse setor. A expectativa é concluir os projetos, que dependem do aval do Tribunal de Contas da União (TCU). Mesmo com a mudança de presidente, não seria possível reverter o processo. Em contrapartida, as empresas se comprometem a investir R$ 25 bilhões no setor ao longo dos contratos.
Serão renovados antecipadamente, por mais 30 anos, cinco concessões: Malha Paulista (Rumo), as ferrovias da Vale (Vitória-Minas e Estrada de Ferro Carajás), MRS (Malha Regional Sudeste) e Ferrovia Centro-Atlântica (FCA).
— O Programa de Parcerias de Investimento (PPI) tem condições de aprimorar as concessões de infraestrutura do passado — disse Adalberto Vasconcelos, secretário do PPI.
País ainda depende das rodovias
O impacto da paralisação dos caminhoneiros na atividade econômica, que pôde ser comprovado por meio de indicadores como inflação e produção industrial, reforça a necessidade de reduzir a dependência desse meio de transporte. O Brasil tem 195 mil quilômetros de rodovias, contra apenas 14 mil quilômetros operacionais de ferrovias, 9,3 mil quilômetros de hidrovias e 7,4 mil quilômetros de cabotagem.
Paulo Resende, da Fundação Dom Cabral, ressaltou que os números expõem a necessidade de diversificação dos modais. E disse que o governo tem “zero de conhecimento da função logística”:
— Não temos traços de multimodais no Brasil. Não temos nem a noção do que é a formação de um frete.
Estudo da Fundação Dom Cabral aponta que as as rodovias respondem hoje por 52,7% das cargas que circulam pelo país, contra 27,2% do modal ferroviário. As hidrovias e a cabotagem respondem, juntas, por 16,9%, e os dutos, por 3,2%. Mesmo que saiam do papel todos os projetos previstos pelo governo federal, a proporção será: 50,1% para rodovias; 31,2% para ferrovias; 16,1% para hidrovias e cabotagem; e 1,6% para os dutos.
O vice-presidente do Sindicato Nacional das Empresas de Navegação Marítima (Syndarma), Cleber Cordeiro Lucas, lembrou que não há incentivo governamental para a cabotagem, cujo custo de combustível é 20% maior que o da navegação de longo curso:
— Somos um modal energeticamente mais eficiente que as rodovias e emitimos menos CO2. Temos todos os elementos para ser algo incentivado.
A diversificação dos modais dará mais eficiência à matriz de transportes brasileira, concluiu David Díaz, diretor-presidente da Arteris.
Fonte: O Globo, 02/08/2018
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