Ao chegar há 23 anos no Japão, Adilson Tomio Tadocoro, nascido em Mogi das Cruzes (SP), arranjou emprego numa empresa de beneficiamento de arroz. Depois de quatro anos, resolveu fazer um curso de soldador. Daí foi um pulo para criar uma pequena empresa no segmento, com quatro empregados.
Hoje, a Tadocoro Mutsuki Kougyou (TMK) fabrica componentes para trens e participa da produção de 500 vagões por ano, tem 115 empregados e faturou 1,2 bilhão de iene (US$ 11 milhões) em 2018. E Tadocoro é apontado como um dos bem sucedidos dekasseguis, nome que se dá aos imigrantes descendentes de japoneses que buscam trabalho no Japão.
A sede da TMK fica em Fujisawa, a uma hora de Tóquio, e a fábrica em Yokohama. A expansão dos negócios continua. Para 2020, Adilson projeta crescimento de 50% no negócio, quando uma segunda fábrica passará a operar em Hiroshima.
Seu mercado é 100% japonês, num país onde trem e metrô são os principais meios de transporte da população. Para Tadocoro, uma diferença em relação ao Brasil é que o Japão protege as pequenas e médias empresas. Sugere ao Brasil fazer o mesmo.
Cerca de 60% dos empregados da TMK são brasileiros. O salário médio bruto anual é de 1,2 milhão de ienes (US$ 66 mil). Eles são recrutados na comunidade brasileira para produzir desenhos em 3D, soldar e montar trens.
“Há muitos brasileiros muito qualificados aqui, mas que não conseguem emprego melhor por causa do idioma”, contou Tadocoro, após um encontro de brasileiros com o presidente Jair Bolsonaro, em Tóquio, na semana passada. “Já comigo não tem barreira, utilizamos o português na empresa sem problema.”
Para o embaixador brasileiro no Japão, Eduardo Saboia, talvez o elemento mais especial da relação bilateral seja a dimensão humana. Além da conhecida presença dos nipodescendentes no Brasil, hoje mais de dois milhões, a comunidade brasileira residente no Japão ultrapassa 200 mil pessoas, praticamente todos regularizados junto ao governo local. É a terceira maior comunidade brasileira no exterior, só atrás daquelas nos EUA e no Paraguai. Os brasileiros formam o quinto maior contingente de estrangeiros no Japão, depois de chineses, sul-coreanos, vietnamitas e filipinos. Em 2020, haverá comemoração dos 30 anos da comunidade brasileira no Japão.
Mas o brasileiro mais famoso atualmente no Japão está longe da realidade dos dekasseguis. Trata-se de Carlos Ghosn, ex-presidente da Renault – Nissan – Mitsubishi, que foi preso em novembro de 2018, acusado de abuso de confiança e dissimular ganhos entre 2009 e 2017. Ele vive atualmente em residência vigiada na capital japonesa e corre o risco de até 10 anos de prisão.
O presidente Jair Bolsonaro contou em Tóquio que “pessoas importantes” no Brasil o procuraram para que ele pedisse junto ao governo japonês agilidade no processo de Ghosn. “Eu ouvi também outras pessoas que sugeriram não tocar nesse assunto porque poderia ferir suscetibilidades. E não vou interferir”. Ghosn, que tem também nacionalidade francesa e libanesa, recebe assistência do consulado brasileiro em Tóquio, segundo diplomatas.
Fonte: Valor, 29/10/2019