Veja o que aconteceu no segundo dia do NT Expo Xperience

O segundo dia do evento 100% digital voltado para o setor ferroviário, a NT Expo Xperience, começou nesta quarta-feira, 25, com um painel ao vivo, que contou com a participação de operadores do transporte de passageiros sobre trilhos de São Paulo e do Rio de Janeiro. A moderação da conversa ficou com o presidente executivo da Associação Nacional dos Transportadores de Passageiros sobre Trilhos (ANPTrilhos), Joubert Flores.

Flores começou a conversa pontuando que a demanda de passageiros nos sistemas de metrôs, trens urbanos e Veículo Leve sobre Trilhos (VLT) de todo o Brasil sofreu um forte impacto em razão da pandemia de Covid-19. Ele também traçou um paralelo dos últimos 22 anos em relação ao avanço das concessões de operações do transporte de passageiros sobre trilhos à iniciativa privada. ”A experiência positiva que desonerou os estados e possibilitou investimentos no ambiente privado, no cenário atual de pandemia, expõe certas fragilidades que precisam ser repensadas”, comentou Joubert.

No estado do Rio de Janeiro, a redução de passageiros nos sistemas de trens e metrôs deixou as concessionárias privadas à beira de um colapso. O presidente da SuperVia, concessionária de trens urbanos, Antonio Carlos Sanches, explicou que a situação no Rio é mais complicada, porque os contratos de concessões à iniciativa privada são antigos e não preveem subsídios públicos para a operação, ou seja, as empresas devem se manter sozinhas, o que cria uma dependência quase que, exclusiva, da receita obtida pelas tarifas dos bilhetes.

”Tínhamos 600 mil passageiros por dia antes da pandemia. Atualmente estamos com 360 mil. Em receita, calculamos uma perda de R$ 250 milhões este ano. Acredito que a movimentação de passageiros só voltará ao nível ‘normal’ em 2022”, disse Sanches.

A situação crítica é semelhante no MetrôRio, empresa que faz a operação das linhas de metrôs da cidade em um regime de contratação também sem previsão de nenhum subsídio público. ”A queda da demanda de passageiros está em 56%. A empresa deixou de transportar 80 milhões de passageiros e o prejuízo acumulado deve chegar a R$ 450 milhões neste ano”, afirmou o presidente do MetrôRio, Guilherme Ramalho.

Para ambos, a reversão do status atual só será possível com uma combinação de medidas pensadas, de curto a longo prazo. Para agora, seria necessário um aporte financeiro emergencial providenciado pelo governo estadual do Rio, que permitisse o equilíbrio financeiro entre custos e despesas. E, no médio e longo prazo, a repactuação e modernização dos contratos, com mecanismos de custeio de tarifas que considerem a flutuação da demanda, políticas de financiamento para investimentos e a organização, regulação e integração do transporte coletivo metropolitano.

Ramalho destacou que o cenário de pandemia exige uma ação decisiva do poder público, com a tomada de decisões no tempo certo. ”Estamos sobrevivendo às custas de aportes de acionistas e de negociação com os fornecedores, uma situação gravíssima, que não se sustentará por muito tempo. No Rio, precisamos aproveitar a oportunidade para discutir políticas públicas voltadas para a mobilidade urbana” disse.

Já Sanches, ressaltou que a integração intermunicipal dos transportes coletivos é a chave para a otimização do nível do serviço prestado à população. É difícil tratar de mobilidade urbana sem considerar a necessidade de constituir a figura de uma autoridade metropolitana, responsável por organizar e otimizar a circulação dos diferentes modais do transporte coletivo. Hoje há uma concorrência entre trens e metrôs com ônibus na mesma região, por exemplo. Essa competição não é vantajosa para ninguém”, disse.

Para trazer a visão de operações privatizadas de outros estados, o painel recebeu o diretor de Mobilidade da CCR, Luís Valença. A empresa é um braço do grupo CCR responsável pela operação na ViaQuatro (Linha Amarela) e Via Mobilidade (Linha 5 Lilás) do metrô de São Paulo e também do metrô de Salvador, na Bahia. Segundo Valença, em razão da atual crise sanitária da Covid-19, a empresa estima uma perda de receita na ordem de R$ 650 milhões até o fim do ano.

Ele apontou que a pandemia jogou luz em modelos de concessões diferentes, como os conduzidos pela CCR em São Paulo e na Bahia, que foram estabelecidos por PPPs (Parcerias Público-Privadas). ”É um modelo que cria um ambiente sinérgico positivo, com mecanismos de mitigação da demanda previstos em contratos”, afirmou.

Valença disse que é preciso ampliar a rede ferroviária de transporte de passageiros no Brasil, que hoje ainda tem uma participação modesta: de cerca de 15% na matriz de transportes coletivos. Só que para que isso aconteça é necessário que o investimento privado na infraestrutura ferroviária seja mais atrativo. ”O maior entrave é o respeito ao contrato. São investimentos de longa duração, que vão passar por diversos governos, por isso precisam de segurança jurídica, com contratos claros e bem escritos, que não tenham brechas de interpretação”, finalizou.

Isonomia tributária

Seguindo a programação da NT Expo Xperience, a atenção voltou-se para a tributação que incide sobre a indústria nacional ferroviária. Para abordar o tema, aconteceu um painel com a moderação do diretor técnico do Sindicato Interestadual da Indústria de Materiais e Equipamentos Ferroviários e Rodoviários (Simefre), Paschoal de Mário, e a participação do presidente da CAF Brasil – fabricante de trens para o sistema ferroviário -, Renato Meirelles e o presidente da Associação Brasileira da Indústria Ferroviária (Abifer), Vicente Abate.

A questão central pontuada na conversa online foi a luta das entidades, Abifer e Simefre, para equilibrar a competição entre a indústria nacional e os fabricantes estrangeiros. A reivindicação é por isonomia tributária. Isso porque alguns estados brasileiros têm aplicado a imunidade tributária na importação de trens, o que leva a uma concorrência injusta com o produto nacional.

O presidente da CAF Brasil explicou que o objetivo é que os fabricantes, em solo brasileiro, sejam protegidos pelo parágrafo 4º do art. 42 da lei 8.666, de 1993, que onera os tributos de imposto de importação e o Pis/Cofins para os trens que são importados. ”A desvantagem atual na conta total de tributação da indústria nacional é de 27,31%”, disse.

Ele destacou o déficit da indústria ferroviária nacional, que há sete anos não é contemplado com nenhum edital de grande volume. E lembrou também que a indústria tem a capacidade de fabricar 1.200 vagões de carga e passageiros e é responsável por 12 mil empregos no país. ”Precisamos de um planejamento de longo prazo, que dê visibilidade e previsibilidade ao mercado nacional”.

O presidente da Abifer fez coro às palavras de Meirelles e salientou que a ociosidade da indústria ferroviária encontra-se em aproximadamente 90%. Uma das possibilidades para melhorar este cenário são as aguardadas licitações da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) para 34 trens, e do Metrô, de outros 44, em São Paulo. ”É uma expectativa otimista no longo prazo, com frutos apenas para 2022”.

A procura por novas tecnologias que facilitem o dia a dia e melhorem a experiência dos usuários dos sistemas de transporte de passageiros sobre trilhos ao redor Brasil é algo constante e no eixo Rio-São Paulo não é diferente, até porque administrar a locomoção das duas cidades mais populosas do país é um desafio. Por isso, as companhias responsáveis pelas operações dos trens urbanos nas capitais paulista e carioca seguem em busca de inovações a todo tempo.

É o que acontece nas empresas que gerem os tradicionais metrôs de ambas as cidades, como o Metrô de São Paulo, que traz uma nova tecnologia de pagamento de passagens. Quem contou um pouco mais sobre isso – durante participação na NT Expo Xperience, evento totalmente digital voltado ao setor ferroviário – foi o gerente de execuções financeiras da companhia, Edvaldo Pedreira Sobrinho.

”Desde 2005, seguimos inovando nas formas de cobrança e pagamento de passagens pelos usuários. Na ocasião, lançamos o Bilhete Único, uma modernização do habitual modelo adotado, que até então utilizava apenas o bilhete magnético como via de acesso ao sistema. Depois, em 2012, veio o BOM (Bilhete Ônibus Metropolitano), cartão aceito, de forma integrada, em todos os meios de transporte metropolitanos da cidade. Agora, estamos trazendo também uma quarta forma de pagamento, através da tecnologia de QR Code, que visa agilizar o processo de cobrança em nosso sistema e oferecer uma nova opção aos nossos usuários. O lançamento do recurso está previsto para ocorrer no primeiro trimestre de 2021”, anunciou Sobrinho, em painel exclusivo sobre novas tecnologias de bilhetagem na mobilidade urbana sobre trilhos, realizado na NT Expo Xperience nesta quarta-feira (25).

Novidades também foram apresentadas pela especialista de planejamento estratégico do Metrô Rio, Ingrid Rocha, que exibiu as últimas inovações da companhia neste sentido, como o pagamento de passagens por aproximação. ”Lançamos este modelo em abril de 2019 e desde então nossos passageiros podem efetuar o pagamento de suas passagens simplesmente pela aproximação de qualquer acessório que esteja dotado da tecnologia, como cartões de crédito, celulares, relógios, entre outros. Já em outubro deste ano, levamos o mesmo sistema para as linhas de ônibus do Metrô na Superfície (MNS), uma extensão do metrô realizada por meio de duas linhas de ônibus especiais”, destacou.

Já o diretor de operações do VLT (Veículo Leve Sobre Trilhos) Carioca, Paulo Ferreira, contou sobre as inovações em bilhetagem adotadas para este meio de transporte. Segundo ele, o modelo de cobrança e pagamento escolhido é inédito na cidade. ”Nossas estações são abertas, não possuem catracas e a validação das passagens ocorre diretamente nos trens do VLT, quando os usuários encostam o bilhete nos leitores que ficam dentro dos vagões. Para realizarmos o controle de acesso e de fluxo de passageiros, contamos com um sistema integrado, que possui câmeras acima de cada porta dos trens, que registra e contabiliza a entrada e saída de qualquer pessoa nos vagões”, concluiu.

Formação de profissionais

A exigência de mão de obra qualificada para preencher as oportunidades que surgem no setor ferroviário brasileiro segue sendo uma exigência recorrente do mercado. Por essa razão, o assunto foi um dos destaques deste segundo dia de NT Expo Xperience, com o painel ”Formação dos profissionais metroferroviários: novos tempos para a interação empresa/universidade”, que contou com a participação de três importantes nomes do segmento.

Foram eles: o professor do Instituto Militar de Engenharia do Rio de Janeiro, Luiz Antônio Silveira Lopes; o coordenador dos cursos de pós-graduação em engenharia metroferroviária do Centro de Pesquisas Ferroviárias (CEPEFER), Manoel Ferreira Mendes; e o professor de engenharia de transportes da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP), Telmo Giolito Porto. Sob mediação do professor do Instituto Mauá de Tecnologia, Eduardo Linzmayer, os convidados discutiram sobre a necessidade de se investir mais em especializações dedicadas ao setor ferroviário nacional, algo que consideram estar em falta no mercado brasileiro.

Para Lopes, infelizmente, o Brasil conta com poucas instituições de ensino voltadas ao setor nos dias atuais, o que avalia ser um ponto negativo para o país. ”Justamente agora que o Brasil está entrando em uma nova série de construções de ferrovias, em renovações de concessões e em atrações de novos investimentos para o setor, o que irá gerar muitas oportunidades de emprego. Nosso objetivo, agora, deve ser a criação de um centro de pesquisa especializado, onde a formação acadêmica para os profissionais do setor terá que ser prioridade”, pontuou.

Mendes concordou e defendeu a importância de instituições neste sentido. ”Essas instituições têm um papel fundamental na preparação de profissionais do setor, ainda que sejam poucas, como a USP, a UNICAMP, o Instituto Mauá de Tecnologia e o próprio CEPEFER, do qual faço parte, que, aliás, foi criado exatamente para tentar aproximar um pouco mais as empresas da capacitação profissional. Inclusive, debates como esse são cruciais para despertar a atenção do mercado e dos estudantes quanto a relevância de uma maior integração entre empresas e universidades”, ressaltou.

Porto corroborou. ”Não apenas as empresas, mas também as concessionárias de transporte sobre trilhos, tanto de cargas quanto de passageiros, estão pouco presentes nas universidades. Assim como as universidades também fazem pouco para atraí-las. É necessário uma maior integração e parceria entre ambos os lados para que possamos avançar neste quesito e captar então os talentos e profissionais. As pesquisas mais recentes de mercado mostram que os jovens estão interessados no setor ferroviário, do mesmo modo que trabalhadores que já passaram por ele desejam voltar”, completou.

As ferrovias sob a ótica do agronegócio

Outro destaque desta quarta-feira de NT Expo Xperience foi o painel sobre a influência do agronegócio no setor ferroviário brasileiro, que contou com a presença de mais três nomes relevantes do mercado: o diretor executivo do Movimento Pró-Logística de Mato Grosso, Edeon Vaz Ferreira; o consultor de inteligência estratégica do Instituto de Engenharia de São Paulo, Jorge Hori; e o engenheiro eletrônico sênior e consultor de sistemas metroferroviários, Sergio Lombardi.

Segundo Ferreira, o debate sobre este tema é fundamental, já que o agronegócio nacional é um dos responsáveis pelas maiores movimentações de cargas do setor ferroviário brasileiro. ”Principalmente de 2013 para cá, quando a movimentação de cargas pelo modal atingiu mais de 10 milhões de toneladas por ano”, disse.

Diante deste cenário, Hori alerta para a necessidade da realização de novos investimentos no setor e de uma nova estratégia logística capaz de atender aos anseios do agronegócio de maneira mais eficaz. ”Por exemplo, atualmente, enfrentamos muitas dificuldades com relação ao escoamento de grãos para os portos do país, que não encontram rotas ferroviárias adequadas para recebê-los, por mais que o modal tenha se mostrado a melhor e mais acertada alternativa em muitas ocasiões. Hoje, o Brasil precisa pensar em uma logística mais eficiente para esse grande mercado que é o agronegócio”, afirmou.

Para finalizar, Lombardi defende o Projeto Brasil, documento elaborado pelo Instituto de Engenharia que contém uma proposta técnica de ocupação sustentável do território nacional pela ferrovia associada ao agronegócio. O estudo propõe o investimento na ampliação do transporte ferroviário, com integrações hidroviárias e rodoviárias que viabilizem o escoamento eficiente de grãos e outros produtos do agronegócio pelo modal. ”Para viabilizá-lo, precisamos, primeiro, ter uma infraestrutura adequada. Depois, um material rodante de qualidade. E, por fim, um sistema bem planejado e implementado, com tudo definido de forma clara”, concluiu.

Sistema de sinalização da Thales

Ainda no bloco da manhã da NT Expo Xperience, o diretor de Desenvolvimento de Negócios da Thales América Latina, empresa francesa que comercializa sistemas de informação e serviços para as indústrias aeroespacial, de defesa, transportes e segurança, Thomaz D’Agostini Aquino, fez uma apresentação sobre o sistema automatizado de sinalização CBTC Verde – Controle de Trens Baseado em Comunicação – desenvolvido pela companhia, que pode ser um ativo importante na descarbonização do setor.

O objetivo principal do mecanismo é melhorar a eficiência energética, redução dos custos operacionais e das emissões de CO² (dióxido de carbono) no sistema metroferroviário. Aquino explicou que os sistemas urbanos sobre trilhos são naturalmente ecológicos, mas, ainda assim, produzem 60 milhões de toneladas de CO² por ano. ”É parte do compromisso global com a sustentabilidade da Thales ajudar os clientes que utilizam o CBTC a alcançar 15% de redução no total de energia utilizada na tração dos trens”, afirmou.

Como exemplo de implantação exitosa do CBTC Verde, o executivo falou sobre o metrô de Nova York, nos Estados Unidos. O consumo de energia do sistema americano é de 1,8 bilhões kWh por ano, com a redução de 15% no consumo de energia de tração, a economia potencial de custos é de US$ 25 milhões e 100 mil toneladas na emissão de CO².

Aquino aproveitou a apresentação também para salientar o investimento anual da Thales de 2,5 bilhões de euros em pesquisa, desenvolvimento e inovação, o que representa cerca de 20% da receita obtida pela companhia.

NT Expo Xperience, 26/11/2020

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