Superlotação, atrasos, baldeação e interrupções constantes dos serviços. Esses são os principais problemas enfrentados pelos mais de 300 mil passageiros que recorrem todos os dias aos serviços dos trens da SuperVia nos seus deslocamentos e que, a partir desta terça-feira, vão pagar mais caro pela tarifa. O governo bateu martelo nessa sexta-feira definindo em R$ 5 o novo preço da passagem, que ficou 90 centavos abaixo dos R$ 5,90 estipulados inicialmente. Mesmo assim, quem usa o serviço diariamente só tem queixas. Atualmente, o valor é de R$ 4,70.
— Sempre optei pelo trem, pois ainda é o meio de locomoção mais rápido do que o ônibus. Porém, de um tempo para cá estamos à deriva com os serviços prestados pela SuperVia. São atrasos constantes e a baldeação que prejudica quem mora em Campos Elíseos, Jardim Primavera e Saracuruna e as pessoas que vão para Guapimirim e Inhomirim. Além disso, tem a falta de luz em trechos da via, roubo de cabos, cabos danificados e corte de serviços devido a manutenção, que na verdade não funciona. Uma grande falta de respeito com os usuários. É isso que enfrentamos todos os dias: trem cheio, serviço ruim e agora aumento de passagem — reclama Janete Monteiro,de 26 anos, que mora em Saracuruna e trabalha no Méier.
O novo valor deveria ter entrado em vigor no último dia 2, mas o aumento foi adiado por 20 dias. O reajuste estava definido desde o fim de dezembro, quando a Agetransp, agência reguladora dos transportes no estado, aprovou o aumento para R$ 5,90, que representava um impacto de 25,5% na tarifa em vigor, de R$ 4,70, gerando protesto dos passageiros. Agora, o reajuste ficará em 6,4%. Na ocasião, a própria agência reconheceu que o índice era elevado, e seu conselho diretor, em decisão inédita, recomendou ao estado avaliar soluções para minimizar o impacto para o usuário, levando em conta a pandemia.
Apesar da concessionária informar ter acumulado uma perda de quase metade dos passageiros, passando a transportar diariamente entre 320 mil e 340 mil passageiros, contra os 600 mil de antes da pandemia, a sensação de quem utiliza o serviço, principalmente nos horários de pico da manhã e da tarde, é de que pouca coisa mudou em relação à lotação. Em plena pandemia, passageiros reclamam de serem transportados espremidos dentro das composições.
— Não é possível, em época de pandemia com essas novas cepas (do coronavírus) aparecendo, a superlotação ainda acontecer, principalmente nos horários de pico, na ida e na volta. Fora desses horários nem tanto, mas também a superlotação se faz justamente nos horários que as pessoas têm que descer para trabalhar e voltar para casa. Então, eles deveriam ter uma solução, um plano estratégico para evitar isso — cobra a professora aposentada Lúcia Cabral Fernandes da Silva, de 65 anos, moradora do Jardim Primavera, em Duque de Caxias, e usuária do Ramal Saracuruna.
Para o marido dela, Paulo Rodrigues da Silva, de 68 anos, o principal problema é a necessidade de fazer baldeação em Gramacho, atrasando as viagens. Já Douglas Mendonça, de 32 anos, reclama das constantes interrupções do serviço. Somente nesta semana foram três no ramal Saracuruna, sendo duas no mesmo dia.
A primeira foi na quinta-feira. A circulação foi interrompida no trecho entre Gramacho e Saracuruna por volta das 4h20 e só foi normalizada às 13h50. As extensões Vila Inhomirim e Guapimirim também ficaram prejudicadas. Segundo a concessionária, o problema foi provocado pelo furto de um contrapeso de cerca de 500 quilos. A peça serve para manter a tensão dos cabos da rede aérea de acordo com a variação de temperatura.
Os problemas voltaram a se repetir nesta sexta-feira, quando ocorreu uma tentativa de furto dos mesmos equipamentos, durante a madrugada, prejudicando a circulação de trens no ramal. O problema foi sanado ainda no começo da manhã e o serviço regularizado. Mas, não demorou muito para ocorrer uma nova suspensão da circulação dos trens no mesmo ramal.
Desta vez, o motivo foi um outro problema recorrente e familiar para quem usa os trens: tiroteio nas proximidades da estação Manguinhos, por volta das 8h30. As partidas da Central do Brasil foram interrompidas e os trens circularam apenas entre as estações Bonsucesso e Gramacho, além do trecho Gramacho-Saracuruna.
— Pelo segundo dia seguido enfrentamos interrupção no ramal Saracuruna. Entendo que falhas ocorrem, mas a falta de ações da SuperVia e da Agetransp assusta qualquer usuário dos trens do Rio. Um domingo no mês a circulação é interrompida no trecho Saracuruna-Gramacho para manutenções de rede aérea, cabos de sinalização e linha férrea. Mas, além de não ter o serviço nesse dia, ficamos sem ele também uma ou duas vezes na semana pelos problemas que deveriam ter sido resolvidos na manutenção mensal — reclama Douglas, que criou um grupo nas redes sociais para alertar outros passageiros sobre essas as falhas no sistema e, assim, não serem surpreendidos apenas ao chegar na estação —hoje com o grupo percebemos um grande descontentamento dos usuários, quanto a essas interrupções. Com um serviço tão precário, não entendemos esse reajuste de 25% deliberado pela Agetransp.
Com uma malha viária de 270 km distribuídas por oito ramais e 102 estações, atravessando o Rio e mais onze municípios da Região Metropolitana, os trens da SuperVia cruzam também diversas comunidades, algumas conflagradas, fazendo com que a insegurança pegue carona nas composições. Do começo do ano até esta sexta-feira, a operação ferroviária já foi afetada quatro vezes por tiroteios próximos à linha férrea, segundo dados da concessionária. É apenas uma vez a menos que o mesmo período do ano passado.
No ano todo de 2020, foram 36 tiroteios que afetaram a circulação dos trens por 40 horas e 24 minutos. A SuperVia informou que nesses casos, os trens podem aguardar ordem de circulação em estações seguras ou a circulação do ramal pode ser parcial ou totalmente suspensa. A medida é para preservar a integridade física dos usuários e dos funcionários.
O vandalismo é outro problema que prejudica usuários e causa prejuízos para a concessionária. No ano passado, a SuperVia contabilizou, 2.816 ataques contra os trens, estações e via férrea. Os reparos dos materiais danificados geraram um custo aproximado de mais de R$ 2,2 milhões. Além da perda financeira, as ocorrências também causaram transtornos aos usuários, por provocarem interrupções temporárias da operação, inoperâncias de escadas rolantes e elevadores, falta de iluminação em alguns pontos, dentre outros.
Os furtos de cabos de sinalização e de energia foram responsáveis por 136 desses casos, o que representa um escalada de quase 15% em relação a 2019, que teve 119 ocorrências. Durante o ano de 2020, os criminosos extraíram 7.474 metros de fios, o equivalente a mais de dez vezes a extensão da Marquês de Sapucaí.
Problemas com a operação dos trens e acidentes resultaram na aplicação sete multas à concessionária em 2020, aplicadas pela Agetransp, e que juntas somaram mais de R$ 1,4 milhão. Uma delas, no valor de R$ 457.976,71 foi por conta de acidente que resultou na morte de um passageiro em Marechal Hermes, ocorrida em dezembro de 2016. Outra, no mesmo valor, foi referente a queda de um passageiro na via, em Honório Gurgel, também ocorrida em 2016. Mas, há penalidades também por problemas como mudanças de grades horária, sem prévio aviso à agência, entre outras. Em 26 de janeiro desse ano, a agência aplicou uma multa no valor de R$ 63.348,66, referente à quebra de pantógrafo, ocorrida entre São Cristóvão e Triagem, em dezembro de 2017.