O Ministério Público Federal (MPF) em São Paulo afirma que a Rumo, antiga América Latina Logística (ALL), abandonou, saqueou e sucateou 198 quilômetros de trilhos entre Santos, no litoral, e Cajati, no interior do estado. A companhia, cuja exploração da Malha Paulista foi concedida em 1996, diz hoje ser inviável operar composições de trens no trecho.
Um requerimento, assinado na quinta-feira (16) pelo procurador da República Thiago Lacerda Nobre, pede, por meio de conciliação, uma solução definitiva à Justiça Federal para que possa interromper o prejuízo da inatividade da ferrovia, que chega a R$ 160 milhões. Em paralelo, a empresa já quer a renovação de concessão do Governo.
segundo o MPF
(Foto: Divulgação/Prefeitura de Itanhaém/Arquivo )
Uma investigação realizada pelo MPF constatou que o abandono do patrimônio público, que por mais de meio século foi utilizado para o transporte de passageiros entre as regiões da Baixada Santista e do Vale do Ribeira, começou efetivamente em 2002. Na ocasião, o trecho era controlado pela extinta Ferroban, que se incorporou à ALL.
Segundo a apuração, vagões e locomotivas foram desviadas para outros ramais, apesar da carga existente sustentar a operação. Em 2006, entretanto, a Procuradoria verificou que se iniciou um processo de sucateamento “escandaloso” na ferrovia, embora o contrato de concessão assegurasse a efetiva prestação de serviços no ramal.
O procurador afirma que os trilhos foram retirados “deliberadamente” para serem usados em outros ramais da concessionária na Malha Paulista, pelo estado. Além disso, pátios de manobra foram extintos, talas e pregações foram retiradas, e as estações, que faziam parte até do cenário turístico das cidades, foram destruídas.
“O patrimônio público que estava sob a guarda da ALL [hoje Rumo] foi dilapidado, saqueado e sucateado”, afirmou Nobre. Em 2014, a Procuradoria já havia ajuizado uma Ação Civil Pública para que a concessionária cumprisse com suas obrigações. A Justiça deu 90 dias para a empresa apresentar um plano de recuperação da via.
A ordem foi ignorada e, em recurso em instância superior, protelou a situação. Entretanto, a companhia, em juízo, afirmou posteriormente que a não emissão de licença do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) impediria qualquer tipo de execução planejada por ela na ferrovia.
Na nova manifestação à Justiça, cujo processo original tramita na 2ª Vara Federal de Santos, o procurador afirma que o Ibama justifica o não licenciamento do empreendimento por aguardar o posicionamento de outros órgãos federais. As análises são essenciais para a execução do Estudo de Impacto Ambiental e o Relatório de Impacto Ambiental.
Em uma vistoria recente a trechos da ferrovia em Itanhaém, o próprio Thiago encontrou áreas federais ocupadas e até exploradas como plantações. Segundo ele, o valor de mercado do quilômetro de linha férrea é de US$ 200 mil. “É necessário que o Ibama e a empresa sejam chamadas a se manifestar em juízo e cumpram com suas obrigações para recompor a ferrovia”, diz.
Ferrovia, abandona e saqueada, tornou-se plantação clandestina e foi ocupada (Foto: Thiago Lacerda Nobre/MPF)
Lacerda Nobre requereu uma audiência de conciliação para possibilitar, enfim, a exploração correta e efetiva da rodovia. “O objetivo é solucionar o litígio de maneira célere e eficaz, zelando pelos cuidados necessários, uma vez que a cada ano que se passa a degradação é notória”, escreveu o procurador, ao solicitar o encontro ao juiz com as partes.
Atualmente, os mais de 10 municípios pelos quais os trilhos passam pleiteiam a reativação da ferrovia para utilização de transporte de passageiros. Uma reunião em Itanhaém, no início do mês, entre prefeitos e parlamentares, discutiu a possibilidade de extensão do Veículo Leve sobre Trilhos (VLT), que já opera em Santos.
A Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) informou que a concessão da Rumo no trecho vigora por mais 10 anos. A empresa pleiteia, antecipadamente, mais 30 anos de contrato para exploração da Malha Paulista. Ela tem como base uma lei de 2016, considerada inconstitucional pela Procuradoria Geral da República, em Brasília.
Em resposta, a Rumo afirma que, após estudos técnicos, econômicos e ambientais, foi constatada a inviabilidade de realizar o transporte de cargas no ramal ferroviário. “A exploração do referido trecho deve se dar em outro modelo de negócios, como, por exemplo, VLTs ou trens turísticos”, declarou.
A companhia ainda explicou ao G1, por meio de nota, que a exploração comercial não se enquadra nos moldes do contrato de concessão assinado no fim dos anos de 1990 pela firma, que visa à movimentação de cargas em larga escala. Entretanto, não comentou prejuízos, e se colocou à disposição para soluções.
Fonte: G1, 17/08/2018