A crise nos transportes públicos do Rio parece estar longe de encontrar uma luz no fim do túnel em se tratando da Supervia. Como se não bastassem queixas de usuários por atrasos praticamente diários na operação dos trens provocados por furtos de equipamentos de sinalização, a Mitsui (acionista majoritária da concessionária) informou ao estado não ter mais interesse de prosseguir no negócio. A avaliação é que as contas não fecham, apesar de hoje a empresa cobrar uma das maiores tarifas do país (R$ 7,40) e ainda receber subsídios do estado para viagens pelo Bilhete Único Intermunicipal (R$ 5).
Mesmo diante das incertezas, Floriano Azevedo Marques, especialista em contratos de concessão e professor de direito administrativo da Universidade de São Paulo (USP), não vê risco para o usuário ficar sem transporte se o estado demorar a encontrar um substituto para a Supervia:
— O concessionário não tem prerrogativa de paralisar ou piorar o serviço devido ao desequilíbrio do contrato — explica Floriano. — Sobre a rescisão, existem dois caminhos. Pode haver um acordo entre as partes, ou o concessionário pode requerer a rescisão judicialmente. Isso porque não se pode obrigá-lo a seguir na prestação do serviço tendo prejuízo.
O problema maior, avaliam os especialistas, está no modelo de concessão do transporte público carioca. Por isso, diz o economista Claudio Fristchak, encontrar um novo parceiro para operar os trens metropolitanos, não será fácil:
— Todo o sistema metroferroviário do país sofreu e ainda sofre com queda de demanda de passageiros com a pandemia da Covid 19. No caso do Rio, há outra dificuldade para manter uma operação equilibrada. Como não há integração tarifária, os custos operacionais são maiores.
E não é só isso. Para o engenheiro Marcus Quintella, diretor da FGV Transportes, a complexidade da segurança pública no Estado é outro agravante.
— A operação dos trens do Rio também enfrenta dificuldades por problemas que o Estado não consegue resolver. Existe um sério problema de segurança pública que se reflete na qualidade dos serviços prestados. Isso é visível, por exemplo, quando o sistema opera com atrasos devido a furtos constantes de equipamentos da rede — avaliou
Quem assumir a concessão terá que administrar um sistema formado por 270 quilômetros de trilhos que cobre 12 cidades da Região Metropolitana, entre as quais Rio de Janeiro, Duque de Caxias e Nova Iguaçu. Ao todo, o sistema conta com 104 estações e cinco ramais nos quais operam 201 trens. Pelas bases da concessão, todo esse patrimônio tem que ser devolvido ao estado ao término do contrato.
Hoje, os trens da Supervia transportam cerca de 320 mil passageiros por dia. O movimento está bem abaixo do período pré-pandemia (650 mil). E bem longe dos 1,2 milhões de usuários que chegou a transportar nos anos 1980, quando a operação ainda era pública.
A Supervia Concessionária de Transportes Ferroviários S./A, controlada por um grupo espanhol, assumiu a operação em 1º de novembro de 1998, numa malha ferroviária que ligava 11 municípios da Região Metropolitana do Rio. Neste momento, o contrato era pelo prazo de 25 anos. Em julho daquele ano, o consórcio comprou o direito de assumir a Companhia Fluminense de Trens Urbanos (Flumitrens) por R$ 280 milhões, um ágio de 671,42% no leilão.
O contrato teve como contrapartida o investimento de R$ 177 milhões em reformar e ampliação do sistema. Em cinco anos, a capacidade de transporte diário de 300 mil para dois milhões de passageiros. Na época, o gasto mensal do governo era de R$ 60 milhões para cobrir o déficit operacional.
Quatro dias após assumir o serviço, a Supervia já tinha registrado quatro acidentes, um deles com o descarrilamento de vagões com 800 passageiros a bordo. Na época, a empresa disse que apenas 10% dos 200 quilômetros da malha da rede até então ofereciam total segurança.
Em fevereiro deste ano, o valor da passagem subiu de R$ 7 para R$ 7,40, ajuste previsto no contrato de concessão. Ao mesmo tempo, o governo do Estado subsidia uma diferença de R$ 2,40 por passagem para segurar a tarifa nos atuais R$ 5, através da tarifa social para os passageiros habilitados no Bilhete Único Intermunicipal (BUI), implementação já prevista no Regime de Recuperação Fiscal e na Lei Orçamentária de 2022, como política pública de redução do impacto do aumento tarifário na população.
A vigência da renovação da concessão, assinada em novembro de 2010, começaria a contar a partir de 31 de outubro de 2023, caso o contrato não fosse interrompido.