Uma das âncoras do plano de expansão do Porto Maravilha para o bairro de São Cristóvão, a restauração da antiga estação de trens Barão de Mauá (Leopoldina) está com as obras em ritmo lento, praticamente paralisadas, nas últimas semanas. Após negociar longamente com o Governo Federal para ter a posse da área, o prefeito Eduardo Paes decidiu na segunda-feira que vai suspender pagamentos à construtora Concrejato, responsável pelas intervenções avaliadas em R$ 72,3 milhões. Paes alegou que investiga denúncias de pendências trabalhistas da empreiteira, mas O GLOBO apurou com fontes próximas ao prefeito, que o motivo é outro. Após abrir os cofres em 2024, quando tentou a reeleição, ele precisou colocar o pé no freio nas despesas no início da nova gestão.
Sem receber desde o fim do ano passado, a empreiteira vinha cobrando faturas em aberto no valor de R$ 7,8 milhões. A discussão estava na esfera administrativa quando, segundo essas fontes, Paes ficou irritado ao interpretar, como uma forma de pressão, a iniciativa da empresa de retirar todas as telas que há meses foram instaladas para proteger as fachadas do imóvel. Nesta quinta-feira, parte das telas começou a ser recolocada. Procurada por dois dias, a prefeitura não respondeu às perguntas enviadas pelo GLOBO.
Dados da execução orçamentária do Município reforçam as informações das fontes que a questão é mesmo dinheiro. Segundo documentos da Controladoria Geral do Município (CGM), a prefeitura teve um déficit de arrecadação de R$ 690 milhões em 2024. As despesas chegaram a R$ 46,3 bilhões contra uma receita de R$ 45,6 bilhões. As contas só não fecharam no vermelho porque o município recorreu a R$ 682 milhões que havia poupado nos três primeiros anos da gestão passada (2021-2023), gerando superávit financeiro A necessidade de apertar os cintos foi reconhecida pelo próprio prefeito no início de janeiro, quando, por decretos, determinou aos secretários que renegociassem os contratos.
Paes também tomou outras medidas para tentar aumentar a arrecadação. Até o fim deste mês, estão abertas inscrições para contribuintes negociarem dívidas tributárias com o abatimento de multas. A Câmara de Vereadores também acabou de votar um novo projeto de lei que permite a regularização de puxadinhos, mediante o pagamento de taxas à prefeitura.
As críticas do prefeito ocorreram justamente na semana em que as obras completaram um ano, na última quarta-feira. O objetivo é concluir as intervenções até 6 de novembro de 2026, como parte das comemorações do centenário da estação. Teoricamente, se o projeto retomar o antigo ritmo, ainda há uma folga de cinco meses para cumprir a meta. No mesmo dia em que ameaçou suspender as obras, o prefeito participou da assinatura de um convênio com o Governo Federal para que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) desenvolva um projeto executivo para dar um destino para todo o terreno:
— O terreno inteiro tem 124 mil metros quadrados, incluindo a estação e a área da futura Cidade do Samba. O plano leva em consideração que existe um projeto para restaurar a estação da Leopoldina instalando equipamentos públicos no local. Esses estudos devem ser concluídos em nove meses —estima o chefe de departamento do BNDES, Flávio Papelbaum.
Entre as ideias da prefeitura está a construção de condomínios populares em parte do terreno. A ideia é tirá-los do papel mais rapidamente caso Rio e Niterói conquistem o direito de sediar os Jogos Pan-Americanos de 2031, já que essa área foi oferecida para ser a sede da futura Vila Pan-Americana. As duas cidades fluminenses disputam com Assunção (Paraguai), o direito de promover o evento.
O problema nos canteiros não afetou o cronograma das obras da Fábrica do Samba, localizada em outra parte do terreno da Leopoldina. O espaço abrigará os galpões das agremiações da Série Ouro, Grupo de Acesso do carnaval carioca, cujas intervenções estão a cargo de outra empreiteira.
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Foto: Hermes de Paula / Agência O Globo
— A gente quer saber o que está acontecendo. Marquei uma vistoria ao local nesta sexta-feira com representantes da Superintendência do Patrimônio da União (SPU). Nós impetramos uma ação na Justiça que determinou a restauração do espaço. A prefeitura, que não participava inicialmente do processo, se comprometeu a executar a obra — disse o procurador da República, Sérgio Suiama.
A ação começou a tramitar em 2013. Eram réus no processo: a Supervia (operadora dos trens) o governo do Estado e a Companhia de Engenharia de Transportes e Logística – Central, responsáveis pela gestão do prédio principal da estação. Em setembro de 2021, a 20ª Vara Cível da Justiça Federal condenou todos a promoverem a recuperação completa do imóvel, que estava sem uso desde 2002, quando as partidas dos trens passaram a se concentrar na Central do Brasil. Logo depois, o plano de restauração foi aprovado pelo Iphan e a prefeitura resolveu assumir a gestão do projeto.
Fonte: Jornal Extra, 13/06/2025