Causou-nos surpresa e espanto o anúncio da construção de uma Ferrovia Transoceânica, que ligaria o Atlântico ao Pacífico, partindo do Porto do Açu (Rio de Janeiro) passando por Corinto (MG), Uruaçu (GO), Lucas do Rio Verde (MT), Porto Velho até o Peru.
O Ministério dos Transportes e do Planejamento deixaram de lembrar a Presidente Dilma que já existe uma ferrovia ligando o Atlântico ao Centro-Oeste. Aliás, a nossa Presidente esteve no ano passado em Rondonópolis inaugurando o Terminal da Ferrovia, onde prestou uma homenagem ao ex-senador Vuolo. Trata-se da antiga Estrada de Ferro Araraquarense, que foi incorporada a Fepasa, depois privatizada e hoje nas mãos da ALL/RUMO. Ferrovia moderna, de bitola larga, dormentes de concreto, ecologicamente correto e alta durabilidade, que já está em operação ligando o Porto de Santos, passando por São Paulo atravessando a ponte rodoferroviária sobre o Rio Paraná entre Rubinéia (SP) e Aparecida do Taboado (MS), Alto Taquari, Alto Araguaia, Itiquira e Rondonópolis. São quase 2 mil quilômetros de ferrovia que não podem ser ignorados.
Seria mais racional não só interligar a ferrovia dos portos de São Paulo (Santos) ao Rio de Janeiro (Açu e Sepetiba) e continuar a construção até Cuiabá fazendo uma bifurcação para Porto Velho (ligando a hidrovia do Madeira) e Cuiabá – Santarém (ligando a hidrovia do Amazonas) como prevê o projeto original.
O projeto da ferrovia São Paulo-Cuiabá foi enaltecido por Euclides da Cunha, há mais de 100 anos, como o caminho mais curto para ligar o Atlântico ao Pacífico. Em seu livro “Contrastes e Confrontos” o escritor já defendia naquela época a construção da ponte: “mercê de uma ponte de 800 metros sobre o grande rio, a travessia entre Jaboticabal e Cuiabá será feita folgadamente em 8 dias… se isso não acontecer, decididamente, porque nos falta um grande engenheiro, um grande empresário e um grande presidente”. Após 50 anos, o ilustre mato-grossense Vicente Emílio Vuolo abraçou esse ideal apresentando na Câmara dos Deputados o projeto 312-A, que incluiu no Plano Nacional de Viação a ligação ferroviária São Paulo-Rubinéia-Aparecida do Taboado-Rondonópolis-Cuiabá, por meio da construção da ponte rodoferrovia sobre o Rio Paraná. Esse projeto foi aprovado pelo Congresso Nacional e sancionado pelo Presidente Geisel, transformado na Lei nº 6.376/76. É importante salientar que a largura da ponte passou de 800 para 3.600 metros devido à construção da barragem de Ilha Solteira e a formação do grande lago.
O cuiabano, ex-senador Vuolo, nascido no Distrito de Coxipó da Ponte foi totalmente incompreendido na época. Foi chamado “louco”, “doido varrido” pelo projeto “utópico”. Chegaram a pixar os muros de Cuiabá. Era motivo de piadas! Mas, ele nunca se abateu. E, mesmo, lutando contra um câncer mobilizou políticos, empresários, trabalhadores dos três Estados (SP, MT e MS) com reuniões, simpósios, manifestos e encontros no local da ponte, numa luta suprapartidária. E viu, em vida, a chegada dos trilhos em Alto Taquari. Sua luta incansável pelos trilhos até Cuiabá teve o reconhecimento da AMOP (Associação dos Municípios do Oeste Paulista composta por 35 municípios) que conferiu o Título de Senador Honorário do Oeste Paulista. Foi denominada, também, por iniciativa do Deputado Wilson Santos, Ponte Rodoferroviária Senador Vuolo (parte ferroviária) Lei sancionada pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e Ferrovia Senador Vuolo o trecho que cruza o Estado de Mato Grosso, sancionado pelo ex-governador Dante de Oliveira.
Com um histórico de lutas e a partir da visão de futuro de alguns grandes brasileiros, a ligação entre o Atlântico e o Pacífico já está em construção. Não tem sentido algum fazer-se uma ferrovia paralela. Muito mais econômico e rápido seria concentrar esforços na conclusão da ferrovia que já está aí.
Vicente Vuolo é economista, cientista político e analista legislativo do senado federal.
Fonte: Revista Ferroviária, 29/05/2015
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