Estação ferroviária tombada é saqueada no Centro do Rio

O espaço da charutaria, as plataformas e até as antigas bilheterias ainda estão lá. Tudo parece do mesmo jeito como funcionou de 1998 até 2001, ano em que a Estação Barão de Mauá, na Leopoldina, serviu pela última vez como ponto de partida para milhares de passageiros dos trens do ramal de Gramacho. Dois detalhes denunciam a passagem do tempo.

 

Na foto, Helio Suêvo, engenheiro especialista em ferrovias, na estação da Leopoldina
Na foto, Helio Suêvo, engenheiro especialista em ferrovias, na estação da Leopoldina Foto: Márcio Alves / Márcio Alves/Extra/Agência O Globo

Tombado pelo Instituto estadual de Patrimônio Cultural (Inepac) e pelo Instituto de Patrimônio Histórico e Cultural Nacional (Iphan), o prédio da Leopoldina está agora repleto de infiltrações e rachaduras. Além disto, a rede aérea da estação — mais de dez quilômetros de fios de cobre — foi inteiramente retirada dos postes de eletrificação por pessoas ainda não identificadas. Entre os materiais que desapareceram, estão 6.344 metros de cabo mensageiro, que, segundo a Associação de Engenheiros Ferroviários (Aenfer) serve para energizar as composições. Também sumiram 4.486 metros de fios de contato, também usados na rede área, um transformador e 11 sinais de tráfego. Um deles foi levado junto com uma base de concreto que o protegia. Os equipamentos furtados eram usados no trecho que fazia a ligação da estação com as oficinas Alfredo Maia e Francisco Sá, localizadas no pátio da Barão de Mauá. A retirada dos equipamentos é descrita num relatório de 2007, produzido pela Agência Reguladora de serviços Públicos Concedidos de Transportes (Agetransp). O documento, que faz parte de um processo que tramita na Justiça Federal ao qual o EXTRA teve acesso, não especifica a data exata da retirada dos equipamentos. Mas faz referência a duas outras vistorias, em 2002 e 2004, ocasiões em que já teriam constatado a falta dos equipamentos.

Na foto, postes sem os cabos da rede aéreaa que foram retirados por pessoas não identificadas
Na foto, postes sem os cabos da rede aéreaa que foram retirados por pessoas não identificadas Foto: Márcio Alves / Márcio Alves/ Extra/Agência O Globo

Uma investigação foi aberta pela Agetransp, mas até hoje não se sabe quem retirou os cabos e sinais da estação, que é de propriedade compartilhada pelo estado e pela União. Mas, até hoje, nem governo federal, nem estadual e tampouco a SuperVia, que explorou a operação de trens ali até 2001, foram penalizados pelo sumiço. A concessionária alega que, após encerrar a serviço na Barão de Mauá, só voltou a ter responsabilidade sobre parte da estação em 2012. O estado nega e diz que a SuperVia nunca deixou de ser responsável pelo local. Em 2001, por exemplo, estado e concessionária assinaram um acordo de cooperação para, entre outras coisas, criar no local um centro comercial cultural. Nada saiu do papel. Hoje, a fachada da estação está pichada. Camelôs tomam conta da calçada em frente à Barão de Mauá, onde há ainda um ponto de ônibus e forte cheiro de urina. A situação do local entristece quem já trabalhou ali. — Eu me sinto envergonhado em ver o estado da estação. Nós ferroviários ficamos tristes — diz o diretor da Aenfer, o engenheiro Hélio Suêvo, que trabalhou durante cinco nos na estação antes de se aposentar.

Hélio Suêvo disse lamentar o estado em que se encontra a Barão de Mauá
Hélio Suêvo disse lamentar o estado em que se encontra a Barão de Mauá Foto: Márcio Alves / Márcio Alves/Extra/Agência O Globo

Apesar de inoperante para o transporte ferroviário, a Estação Barão de Mauá vinha sendo, desde o ano passado, fonte de lucro para a SuperVia com a exploração de um outro tipo de atividade. De acordo com o Ministério Público Federal, a concessionária vinha alugando o espaço tombado para realização de festas, cobrando até R$ 45 mil por eventos. Tudo sem autorização dos órgãos de proteção ao patrimônio histórico. As festas eram realizadas na gare, em meio aos antigos trens que ainda estão no pátio, aguardando remoção para o museu ferroviário. Só no o último mês de outubro, segundo relatório da Justiça Federal, já havia dois eventos agendados para serem realizados na estação. Um deles seria um baile funk: “Errejota, o baile funk é foda”. O outro seria uma festa de dia das bruxas. As duas festividades foram canceladas por ordem da Justiça. Levando em conta as precárias condições da estação, no dia 20 de outubro, o juiz Paulo André do Espírito Santo, da 20ª Vara Federal, expediu liminar proibindo a SuperVia de ceder ou alugar o espaço para realização de eventos. O juiz também fixou uma multa de R$ 100 mil por cada festa realizada, caso a concessionária desobedeça à proibição judicial

Gare da Estação da Leopoldina também foi utilizada para realizar festas e bailes
Gare da Estação da Leopoldina também foi utilizada para realizar festas e bailes Foto: Márcio Alves / Márcio Alves/Extra/Agência O Globo

A Agetransp alega que a investigação do sumiço dos cabos não foi concluída porque um inventário definitivo do sistema ferroviário foi feito só após o desaparecimento e não incluiu o equipamento desaparecido. Embora o estado afirme que SuperVia nunca deixou de ser responsável pela área, a concessionária informa que, após 2001, tomou posse efetiva da estação Leopoldina em 2012. Já o Iphan afirma que analisa um pedido para a limpeza das fachadas da Barão de Mauá. O Inepac diz que a reforma da estação está sendo tratada na Justiça Federal e que o tombamento histórico não compreende a rede elétrica aérea da estação Barão de Mauá. Fonte: Jornal Extra, 03/12/2015 Por: Marcos Nunes

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