Os metrôs e trens urbanos do país acumularam um rombo de R$ 8 bilhões em 2020, segundo relatório da ANPTrilhos (Associação Nacional dos Transportadores de Passageiros sobre Trilhos), que reúne tanto operadores privados quanto estatais do setor.
A situação, que já é dramática, ainda deve piorar, diante do novo agravamento da pandemia e da necessidade de novas medidas de isolamento social.
Desde fevereiro, o fluxo de passageiros, que vinha em uma lenta retomada, voltou a cair, afirma Joubert Flores, presidente da entidade. “No ano passado, a movimentação de passageiros vinha em um crescimento médio de 8% ao mês. Agora, piorou novamente, embora não tanto quanto no início da crise”, diz. Os dados do primeiro trimestre do setor ainda não foram consolidados.
No acumulado de 2020, a queda na movimentação foi de 48,5%, o que representa 1,6 bilhão de passageiros a menos. Se considerado apenas o período de março a dezembro, no qual houve pandemia no Brasil, a redução é ainda maior, de 56%.
O Metrô de São Paulo, maior empresa do setor, respondeu por uma parcela grande das perdas: a rede deixou de transportar 546 milhões de pessoas em 2020, cerca de um terço do total. O impacto econômico foi grande. Considerando apenas a receita tarifária, a companhia paulista perdeu R$ 910 milhões, queda de 45% de seu faturamento no ano. O lucro de R$ 342 milhões em 2019 foi revertido em prejuízo de R$ 877 milhões.
Para cobrir o rombo na operação, o governo paulista teve que aportar R$ 1,6 bilhão no Metrô e na Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) em 2020, segundo Alexandre Baldy, secretário de Transportes Metropolitanos de São Paulo. Ele avalia que é cedo para dimensionar qual será o tamanho o déficit de 2021, mas calcula que seja de, no mínimo, R$ 400 milhões.
“Começamos 2021 relativamente bem. Até fevereiro, vimos uma recuperação na movimentação de passageiros acima do esperado. Mas a piora da situação acabou impactando negativamente”, afirma Baldy.
Neste momento, a movimentação no sistema é de apenas 32% da demanda regular, o que representa custo adicional de R$ 2 milhões por dia para o governo paulista, segundo o secretário. O fluxo está especialmente baixo porque a capital paulista decidiu decretar feriado emergencial de dez dias – desde a última sexta-feira até o dia 4 de abril – para tentar conter o ritmo de contaminação da pandemia na cidade.
Diante de tantas incertezas, a ANPTrilhos prefere não traçar mais projeções de quando haverá uma recuperação do setor – as últimas previsões da entidade foram completamente frustradas, afirma Flores. Inicialmente, a associação calculava que, ao fim de 2020, 70% da movimentação já teria retornado. No cenário atual, não há expectativa de que essa meta seja alcançada nem mesmo ao fim deste ano.
“Aprendemos que a curva de retomada será lenta, pelo avanço do trabalho remoto, do desemprego e do receio que se criou na população de usar o transporte público”, diz ele.
Para Baldy, a perspectiva é que o fluxo de passageiros transportados volte ao patamar anterior à pandemia apenas em 2023. “É a projeção traçada em vários países do mundo, e nós corroboramos essa expectativa.”
A situação mais crítica continua sendo a das concessões metroferroviárias do Rio de Janeiro, que têm sofrido com os impactos da pandemia sem qualquer reequilíbrio contratual ou apoio financeiro por parte do Estado, que vive uma grave crise fiscal.
No caso das concessionárias de São Paulo e Bahia, a queda na movimentação é igualmente grave. Porém, a situação das operadoras privadas é mais tranquila – diferentemente da situação no Rio, os contratos dessas regiões são mais novos e já incluem mecanismos automáticos de mitigação de riscos e aportes dos estados, o que têm garantido o caixa para a continuidade das operações em meio à crise.
No ano passado, o Congresso chegou a aprovar um pacote de apoio federal ao setor de transporte público (que incluia metrôs e ônibus), no valor de R$ 4 bilhões. O projeto, porém, foi vetado pelo presidente Jair Bolsonaro. Desde então, a ANPTrilhos busca alternativas de socorro, mas até o momento não houve avanços, segundo Flores. Sem perspectiva de recursos da União, o setor começa a buscar outras saídas, como a criação de linha de crédito para capital de giro. “Não é o ideal, mas estamos buscando soluções para manter a prestação dos serviços”, diz ele.
Fonte: valor.globo.com, 30/04/2021