Acordo da Estação Gávea pode destravar projetos empacados para expansão do metrô, como ligação entre Estácio e Praça Quinze
O último plano diretor do metrô prevê mais de 178 quilômetros de trilhos — Foto: Márcia Foletto / Agência O Globo
A assinatura do Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), que garante a retomada das obras da Estação Gávea, paralisadas desde 2015 após suspeitas de superfaturamento, poderá destravar outros projetos empacados para a expansão do metrô. Durante solenidade ontem no Palácio Guanabara, o governador Cláudio Castro anunciou que o próximo trecho no radar é a ligação entre a Estação Estácio e a Praça Quinze, passando pela Carioca, apesar de o estado estar passando por um período de dificuldades financeiras e projetando déficit orçamentário de R$ 14,6 bilhões para 2025:
— Uma licitação que está no meu coração e no do Washington (Reis, secretário de Transporte) é a ligação entre Estácio e Praça Quinze. Ela é fundamental para o sistema. Talvez, neste momento, até mais importante do que a ampliação da Linha 4. Ela salvaria as barcas (o número de viagens caiu de 1,2 milhão por mês, em 2019, para 747.876, em 2023).
Segundo Reis, a intenção do estado é licitar a elaboração do projeto do trecho Estácio-Praça Quinze. No mesmo pacote, afirmou ele, serão relançadas concorrências, também para estudos, que foram canceladas por determinação do Tribunal de Contas do Estado (TCE): a Linha 3 (Praça Quinze-São Gonçalo, passando sob a Baía de Guanabara); e o trecho da Linha 4 entre o Jardim Oceânico (na Barra) e o Recreio dos Bandeirantes. A Linha 3, a propósito, já foi objeto de mais de duas dezenas de promessas, mudanças de traçado e anúncios de licitações para estudos e obras.
Metrô: Próximo trecho no radar do Governo do Estado é a ligação entre Estácio e a Praça Quinze — Foto: Márcia Foletto / Agência O Globo
Mais de 178km projetados
O último plano diretor do metrô, de 2017, somado ao Metrô Leve da Baixada (Pavuna-Nova Iguaçu) — prometido por Castro durante campanha para a reeleição — prevê mais de 178 quilômetros de trilhos, que não saíram do papel. Seriam mais 13 trechos. A execução de todos custaria mais de R$ 80 bilhões.
Entre especialistas, a ligação entre Estácio e Praça Quinze, complementando a Linha 2 (que hoje vai da Pavuna a Botafogo), é a mais urgente. A Associação Fluminense de Preservação Ferroviária estima que ela poderia aumentar em 400 mil a média diária de usuários do metrô, que hoje está em 627 mil passageiros por dia. A entidade também considera prioritário levar o metrô da Pavuna a Belford Roxo. Já cálculos do governo, que chegou a dizer que usaria parte dos recursos da concessão da Cedae no Metrô Leve da Baixada, 370 mil pessoas usariam o trecho entre Pavuna e Nova Iguaçu por dia.
Metrô do Rio tem 41 estações e 54,4 quilômetros de extensão
Governo prevê retomar obras da estação da Gávea
Presidente do Conselho Administrativo da Associação Nacional dos Transportadores de Passageiros sobre Trilhos (ANPtrilhos), Joubert Flores lembra que, em 1968, quando foi feito o primeiro traçado de linhas do metrô carioca, a ligação entre o Estácio e a Praça Quinze já integrava a Linha 2.
— Hoje, você faz a Linha 2 entrar na Central e ir até Botafogo. Mas parte desses passageiros poderia ir direto até o Centro da cidade. Existe demanda — diz ele.
Infográfico — Foto: Arte
Segundo Flores, a plataforma da Estação Carioca destinada à Linha 2 está 30% concluída. Fundador do Movimento Metrô que o Rio Precisa, Atilio Flegner chegou a visitar o local em 2015:
— A ligação entre Estácio e Praça Quinze desafogaria a Linha 2. As estações da Linha 2 foram projetadas para oito vagões de metrô, enquanto as da Linha 1 para seis. Mas os trens da Linha 2 têm que manobrar em Botafogo e, por isso, só podem ter seis vagões.
Morosidade no Rio
Joubert Flores critica a morosidade da ampliação do metrô carioca. Enquanto o sistema do Rio tem 41 estações e 54,4 quilômetros de extensão, o de São Paulo tem 104,4 quilômetros e 91 estações.
— O metrô de São Paulo começou a operar em 1974. O do Rio, em 1979. O do Rio tem praticamente o mesmo desenho desde 1968, com alguns acréscimos, devendo ainda muita coisa — analisa.
Engenheiro civil com mestrado em transportes, o deputado Luiz Paulo Corrêa da Rocha (PSD) lembra que, no governo da fusão dos estados do Rio e da Guanabara (1975-1979), o metrô fez uma pesquisa de origem e destino em toda a Região Metropolitana. A partir dela, prossegue, foi produzido o PIT (Plano Integrado de Transportes) Metrô.
— A primeira coisa que os gestores tinham que fazer era obedecer as prioridades do PIT Metrô e completar a Linha 2 Estácio-Carioca. A ligação Carioca-Praça Quinze existe desde o PIT Metrô e é prioridade também. Aí vêm as questões que não eram da proposta original e acabaram gerando problemas sérios. Agora, os palpiteiros, inclusive do governo, dizem que vão fazer X, Y, Z linhas. Aí eu me pergunto: com que dinheiro? Visto que o rombo orçamentário para o ano que vem é de R$ 14,6 bilhões, ou são ilusionistas ou não acordaram para a realidade — afirma o parlamentar.
Já o professor aposentado do Programa de Engenharia de Transportes da Coppe/UFRJ Ronaldo Balassiano se mostra cético em relação à expansão do metrô carioca:
— Para se fazer metrô, é preciso muito planejamento, além de dinheiro.
Enquanto a fila de projetos não anda, Cláudio Castro lembrou que as obras da Estação Gávea dependem da retirada da água do buraco, estratégia usada para evitar que a estrutura desmoronasse.
— Tudo o que está ali embaixo vai ter que se revisto. O primeiro passo é tirar a água. E as empresas vão nos passar um relatório real — disse ele. — Terei muito orgulho de poder inaugurar ainda no meu governo, mas só teremos a real dimensão da obra e do tempo necessário após a reavaliação.
Tatuzão: indefinição
Castro afirmou ainda que vai mexer no Tatuzão, máquina enterrada no Alto Leblon, que deveria perfurar o túnel até a Estação Gávea. Mas a assessoria da Secretaria estadual de Transporte e Mobilidade informou, posteriormente, que a Tunnel Boring Machine “está sob responsabilidade do consórcio que realizou a obra”. E o Consórcio Rio Barra, citado pelo governo, informou, por sua vez, que a atribuição é do estado.
Por enquanto, o prazo para início das obras na Gávea é de 60 dias. Conforme o acordo, a MetrôRio investirá R$ 600 milhões, tendo como contrapartida a unificação da concessão das três linhas de metrô (1,2 e 4) e a prorrogação do contrato até 2048. O estado fará o aporte de R$ 97 milhões, mas reservou R$ 300 milhões para “possíveis intercorrências”. Além da estação, será concluída a ligação São Conrado-Gávea, o que exigirá que o passageiro faça baldeação. O trecho de 1,2 quilômetro não perfurado, entre o Alto Leblon e a Gávea, permanece entre os projetos para o futuro.
Fonte: O Globo, 03/10/2024
Foto da capa: Agência O Globo