RIO – Construída há 155 anos, a Central do Brasil passou por uma ampla reforma na década de 30, foi reinaugurada em 1943 e, de carona na reurbanização do Centro, a imponente estação ferroviária está prestes a receber novamente uma grande obra. O objetivo é restaurar e modernizar o lugar pelo qual transitam, diariamente, cerca de 600 mil pessoas. A Supervia, que tem a concessão da área, planeja erguer um centro comercial sobre as plataformas dos trens, fazer um estacionamento para 1.400 vagas e, ainda, um hotel de dez andares, com 220 quartos. Trata-se de uma proposta ambiciosa, que depende de um parecer favorável do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Todo o conjunto arquitetônico foi tombado em 2008, mas a empresa acredita num entendimento com o órgão. Tanto que a primeira etapa dos trabalhos já está em fase de conclusão e, se os planos forem confirmados, em agosto serão levantados os primeiros pilares do futuro shopping, que abrigará, entre outros estabelecimentos, lojas que hoje já ocupam a Central, como tabacarias, lanchonetes e até um estande de uma companhia aérea.
A previsão é de que a reforma completa da Central do Brasil termine em 2016. Quem passa pela estação atualmente ainda se depara com um ambiente desordenado, mas que já recebeu melhorias de conservação, como reforço na iluminação e limpeza das áreas revestidas com mármore e granito. Na cabeceira da plataforma 1, o ritmo é intenso na construção de uma nova cabine de sinalização — hoje, está instalada na plataforma 8. A mudança de lugar é necessária para que, futuramente, seja erguido o centro comercial.
— Vamos cobrir todas as plataformas. E, seguindo uma orientação do Iphan, estamos projetando uma área com cobertura de vidro, para que os passageiros continuem vendo o relógio da Central — diz o presidente da Supervia, Carlos José Cunha, acrescentando que o conjunto arquitetônico será restaurado. — Queremos reconstituir a iluminação natural da gare, que tem tijolos de vidro no teto. Com o tempo, foram cobertos. Recuperaremos gravuras que estão sob a pintura atual.
busca de parceiros para investimentos
Para botar a Central do Brasil nos trilhos, a Supervia prevê investimentos em torno de R$ 350 milhões. Parte dos recursos poderá sair de parceiros da iniciativa privada. A concessionária já apresentou seu projeto ao mercado e, segundo Cunha, há interessados. Professor titular da UFRJ e representante do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB) no Conselho de Planejamento Urbano da prefeitura, Flavio Ferreira teme que a proposta seja apenas especulação imobiliária. Para ele, a região não precisa de um empreendimento desse porte. O arquiteto chama a atenção para o prazo das obras, que terminariam às vésperas das Olimpíadas.
— Parece uma aventura. Mesmo num escritório grande de arquitetura, acho difícil tudo ficar pronto até 2016. E os passageiros? Vão sofrer com os trabalhos — alerta Ferreira.
O projeto da nova estação é da Raf Arquitetura e, segundo a Supervia, as principais intervenções serão feitas em horários de pouco movimento. Uma das primeiras medidas será ampliar o saguão da gare, que avançará 25 metros em direção às plataformas, com deslocamento das roletas. Segundo Cunha, as modificações seguirão um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) que será firmado com o Iphan.
— O TAC precisa de ajustes, mas está na fase final. Hoje não tenho preocupação quanto à liberação do projeto — afirma o presidente da concessionária.
Em uma nota, a superintendência do Iphan no Rio informou que se encontram sob análise do instituto dois projetos para a Central, “um referente a uma cobertura metálica para a plataforma e um grande projeto para ampliação do monumento, que ainda estão tramitando e não há parecer final”.
Professor da PUC-Rio, o arquiteto e urbanista Manuel Fiaschi acha o projeto interessante e o considera em sintonia com as estações ferroviárias de várias cidades do mundo.
— Terá um prédio novo, mas que parecerá irmão do já existente. Será de vidro, mas com o mesmo alinhamento, e aproveitará a área dos trilhos. Além disso, haverá um shopping totalmente integrado ao sistema de transporte público da cidade, ninguém precisará de carro para ir até lá — destaca Fiaschi.
No vaivém da Central, alguns passageiros embarcam na proposta de modernidade e torcem por melhorias.
— Ando de trem desde os 12 anos. O serviço melhorou, mas ainda há muito a ser feito. Torço para que o shopping dê certo e que parte do lucro seja aplicada na rede — diz Adilson Machado.
Trens lotados e protestos de passageiros — que, várias vezes, terminaram em quebra-quebra de veículos e estações, devido a maus-tratos por parte de seguranças e atrasos — são situações que fazem parte da história recente da Supervia. A empresa afirma que, além de planejar a grande reforma da Central do Brasil, está investindo na modernização do sistema. Até meados de 2014 deverão chegar 80 novos trens, que substituirão 50 composições sucateadas, ainda em uso.
— Queria solucionar os problemas de um dia para o outro, mas todas as medidas são de longo prazo — argumenta o presidente da concessionária.
Quando fala sobre a reforma da gare, o tom de Cunha é mais otimista. Ele aposta que a estação será mais uma atração turística da cidade:
— O turista que vier ao Rio para acompanhar as Olimpíadas de 2016 terá de reservar um dia para conhecer a Central do Brasil. Quem sabe até poderá se hospedar no novo hotel.
Fonte: O Globo, 28/01/2013 – Caderno Rio
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