O governo prepara um novo desenho da rede ferroviária que faz parte do seu programa de concessões, com o objetivo de criar mais ligações entre as áreas produtoras e portos, além de permitir mais competição.
A ideia é que a Ferrovia Norte-Sul entre Tocantins e São Paulo seja concedida com a possibilidade de extensão até Mato Grosso.
Outra obra inacabada, a Ferrovia Oeste-Leste, na Bahia, poderia ser estendida para se conectar à Norte-Sul.
Nessa reconfiguração da malha ferroviária nacional, a principal área de produção de grãos do país, o Centro-Oeste, teria a possibilidade de escoar seus produtos por quatro portos diferentes, cada um deles com acesso por uma empresa ferroviária.
Atualmente, há um tronco ferroviário que vai de Mato Grosso a São Paulo, controlado pela Rumo (Grupo Cosan), e outro que segue do Tocantins para o Maranhão, em poder da VLI (Vale). Com as concessões, previstas ainda para este ano, as duas linhas existentes passam a estar ligadas.
Caso a Oeste-Leste se encontre com a Norte-Sul, haverá a possibilidade de saída por um terceiro porto, na Bahia, que poderá ser construído pela vencedora da concorrência caso o governo do Estado não conclua um projeto já autorizado.
Além disso, o governo também vai licitar uma ferrovia entre Mato Grosso e o Pará (Ferrogrão) como uma nova opção de acesso aos portos. Essa licitação, que deve sair primeiro, tem grande interesse das tradings de grãos (grandes vendedores) ADM, AMaggi, Bunge, Cargill e Dreyfus, que fizeram o projeto para a estrada de ferro.
PORTO DE SANTOS
Segundo Adalberto Vasconcelos, secretário do PPI (Programa de Parceria em Investimentos), órgão do governo que coordena os processos de concessões, as concessões novas e o processo de renovação das concessões antigas, da década de 1990, vão fomentar a competição.
Nas renovações será possível garantir que trens vindos de outras malhas ferroviárias vão poder passar pelas malhas já concedidas e acessar os portos. Hoje essa possibilidade existe, mas há restrições que dificultam a competição.
Segundo Vasconcelos, o primeiro ato em direção a essa reconfiguração será anunciado em breve. Houve um acordo entre as três empresas que hoje operam as malhas de ferrovias em São Paulo (Rumo, MRS e FCA) para que todos possam acessar o porto de Santos.
Esse acesso é considerado um gargalo, porque as empresas estão sempre em disputa para ter prioridade de entrada no principal porto do país, além da necessidade de fazer obras para a ampliação.
“Colocamos as três numa mesa e pedimos que apresentassem uma solução ou não haveria renovação de concessões. Elas já nos apresentaram uma resposta e estamos analisando”, disse.
Entre interessados nas concessões há algum ceticismo sobre a velocidade do governo para conseguir fazer com que essas três concorrências estejam prontas até o fim do ano e sobre as chances de renovação das concessões, devido a oposições apontadas pelo Ministério Público Federal e pelo Tribunal de Contas da União.
PROBLEMAS NA MALHA PAULISTA
A proposta de renovação do contrato da Malha Paulista de ferrovias vem sendo criticada por entidades do setor por permitir que a atual concessionária –a Rumo– mantenha, por mais dois anos, trechos sem utilização.
O projeto de extensão da concessão por mais 30 anos está em consulta pública na ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) e levou uma comissão de entidades de São Paulo a pedir alteração nesse item da proposta.
Dos quase 2.000 quilômetros de estradas de ferro em poder da Rumo em São Paulo, há 835 quilômetros não usados pela empresa, que abrangem os ramais de Colômbia, Piracicaba, Panorama e Cajati. Pelas regras do atual contrato, a Rumo –que assumiu a malha em 2013– deveria manter esses trechos em operação.
Há investigações do Ministério Público Federal e da própria ANTT que apontam que parte desses trechos foi abandonada e não teria condições de operar. A empresa tem a obrigação de devolvê-los em condições de uso.
O relator da MP que altera regras das concessões, senador Sérgio Souza (PMDB-PR), afirmou que poderá fazer emenda ao texto enviado pelo Executivo para garantir que as renovações de todas as concessões tenham solução prevista em lei para trechos abandonados.
A proposta em audiência pública estabelece prazo de dois anos para que a Rumo decida quais trechos vai operar e quais vai devolver.
A empresa defendeu esse prazo durante as audiências públicas justificando que é o tempo necessário para estudar a viabilidade econômica desses ramais, que hoje não seriam usados pelas restrições de tráfego na linha tronco da concessão, que vai da divisa com Mato Grosso do Sul ao porto de Santos.
O deputado estadual João Caramez (PSDB-SP), que coordena a Frente Parlamentar em Prol do Transporte Metroferroviário, defende que os trechos tenham a operação retomada imediatamente.
“Não tem sentido ficar abandonado por dois anos. Tem que ter uma solução imediata”, afirmou Caramez.
Jean Pejo, que coordena a Alaf (Associação Latino-Americana de Ferrovias), diz que não há motivos técnicos para que o estudo de viabilidade demore tanto. Segundo ele, as malhas que forem devolvidas ao governo podem servir a outros tipos de ferrovia com características diferentes da atual –que está voltada para carga agrícola.
Fonte: Folha de São Paulo, 02/04/2017