Na terça-feira, 6 de junho, a Medida Provisória nº 752, publicada em novembro de 2016 e responsável por regular a possibilidade de prorrogação e relicitação de concessões no setor de logística, foi convertida na lei nº 13448/2017. A lei versa sobre o destino de concessões de serviços públicos atualmente vigentes que estejam em fase de execução, na qual não há mais investimentos previstos no contrato, ou que tenham perdido a sustentação financeira.
Quando esses últimos contratos foram firmados, o Brasil vivia período de crescimento econômico com projeções animadoras. As concessionárias aeroportuárias, por exemplo, estimaram demandas altas que se mostraram frustradas especialmente no cenário de crise. A contratação de financiamento com bancos públicos e a taxa de juros reduzida também se tornou menos acessível. Somado a isso, a realização de modelagens insatisfatórias e os escândalos de corrupção arrematam o cenário já dramático, levando à inviabilidade das concessões em suas configurações originais.
Ciente da situação e sensível à necessidade de alavancar a retomada do crescimento no país, o governo federal editou a MP nº 752 com o intuito de promover novos investimentos e garantir aqueles já em curso, assegurando e expandindo os serviços públicos logísticos. Nesse sentido, a lei abrange os setores ferroviário, rodoviário e aeroportuário, trazendo dois mecanismos de reorganização das concessões vigentes: a prorrogação (contratual ou antecipada) e a relicitação dos contratos, sendo que em qualquer dos casos os projetos devem ser aprovados no âmbito do Programa de Parcerias de Investimentos – PPI.
A prorrogação, aplicável apenas aos setores ferroviário e rodoviário, corresponde à dilatação do prazo do contrato de concessão em contrapartida à realização de novos investimentos pela concessionária. Os aeroportos, como ainda são contratos novos, ficaram afastados dessa possibilidade. Ainda assim, a resistência à devolução dos ativos levou a criação de outro mecanismo, a reprogramação do cronograma de pagamento das outorgas, constante da MP 779 e da Portaria nº 135/17 do Ministério dos Transportes.
A relicitação, por sua vez, contempla os três setores e significa a devolução amigável de uma concessão, mediante indenização e compromisso de renúncia dos integrantes da concessionária à participação da nova licitação do projeto, que poderá conter modificações em relação ao contrato original. O novo contratado poderá ser o responsável por arcar com indenizações eventualmente devidas à concessionária anterior, inclusive pelos valores devidos aos financiadores em decorrência da extinção antecipada da concessão. Ou poderá ser obrigado a assumir os financiamentos vigentes – desde que os bancos concordem com as novas condições de crédito. Nesse aspecto, a relicitação traz liquidez para a devolução da concessão, especialmente quando comparada com a caducidade, que costuma ser traumática para todas as partes envolvidas.
A lei nº 13.448 ainda traz outras interessantes modificações na legislação vigente, seja aprimorando dispositivos de aplicação geral, seja buscando ajustar antigas pendências setoriais, especialmente no modal ferroviário, merecedor de grande atenção, já que as concessões ferroviárias poderão ser renegociadas e reconfiguradas.
A lei, sob esse contexto, permite, por exemplo, a extinção dos contratos de arrendamento de ativos públicos e a alienação, pelas próprias concessionárias, dos ativos hoje de titularidade do Dnit. Há a previsão, ainda, da inclusão de ramais e a extensão de algumas linhas férreas no próprio âmbito das prorrogações. Por fim, o aspecto talvez mais esperado e arrojado da nova legislação é a previsão do investimento cruzado em distintas malhas, o que permitirá que os valores pagos em contrapartida à extensão dos contratos sejam utilizados para a expansão e a melhoria do próprio setor, seja pela construção de novos trechos, seja pela eliminação de gargalos logísticos (como o acesso a portos), que afetam a qualidade dos serviços ferroviários de maneira sistêmica.
Outras disposições, como a menção expressa à não incidência, sobre as concessões, dos limites para as alterações dos contratos previstos na lei nº 8666, e a flexibilidade da regra que garantia, necessariamente, a exclusividade nos contratos de concessão rodoviária e ferroviária (mecanismo alterado para se permitir o compartilhamento de infraestrutura, em especial no segmento ferroviário), não podem ser esquecidos. Essas duas mudanças, embora aparentemente simples, são de extrema relevância para toda a infraestrutura nacional.
É possível prever que esses mecanismos terão de ser aplicados com base em diálogo aberto e estruturado entre o poder concedente e as concessionárias, diferentemente do que se deu, por exemplo, no setor elétrico, em que as prorrogações foram impostas de forma unilateral.
Ainda assim, por serem complexas, a prorrogação e a relicitação podem ensejar discussão entre as partes. Por isso, a legislação reforça a sujeição das concessões à arbitragem, de maneira extremamente positiva. A arbitragem é um mecanismo célere que permite a discussão precisa sobre temas que não são corriqueiros ao Poder Judiciário, como os de infraestrutura, muito técnicos e complexos. Por isso, a arbitragem é um caminho natural para solucionar tais entraves, assegurando maior celeridade e especialidade para a solução de divergências.
Pelas inovações e pelos aprimoramentos que traz, acreditamos que a lei nº 13.448 foi juridicamente bem construída. Ela endereça alguns equívocos pretéritos e fornece soluções factíveis e bem amarradas para o futuro. O que todos esperamos, agora, é que as ferramentas criadas possam contribuir para equacionar as pendências nos setores tratados e sejam utilizadas no curto prazo para permitir que o Brasil volte a olhar para frente. O PPI segue sendo um sinal otimista de melhora do cenário da infraestrutura brasileira, o qual ainda precisa da contribuição de todos os agentes interessados.
Fonte: Valor Econômico, 03/07/2017
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