RIO – A violência atingiu em cheio os cerca de 700 mil usuários diários do transporte coletivo ferroviário do Rio de Janeiro. Levantamento feito a partir de dados obtidos através da lei de acesso à informação, revela que, entre janeiro e maio deste ano, 2.993 trens sofreram atrasos ou foram suprimidos( cancelados ou tiveram a circulação interrompida ) por conta da ocorrência de tiroteios ou operações policiais ao longo dos 270 quilômetros da malha ferroviária que corta o Rio e outros 11 municípios.
Significa dizer que, em média nestes cinco meses , viagens sofreram atrasos, cancelamentos ou interrupções por 20 vezes ao longo de cada dia, por conta de problemas de segurança pública.
O ramal de Santa Cruz, que liga a Central do Brasil à Zona Oeste do Rio, aparece como o mais atingido pela violência no período, de acordo com os dados fornecidos pela Agetransp ( Agência Reguladora de Serviços Públicos Concedidos de Transporte). Nada menos que 1.583 viagens sofreram atrasos ou foram interrompidas por conta do problema.
Nesta quarta-feira, um tiroteio voltou a assustar os passageiros que usam o ramal. Às 5h10, na altura de São Cristóvão, três bandidos anunciaram um assalto, num dos vagões de uma composição que saiu da Central para Santa Cruz Um inspetor penitenciário que estava no trem reagiu e matou um suspeito. Outros dois fugiram. João T. Nunes, de 64 anos, foi atingido por estilhaços e atendido por bombeiros. Ele não quis ir a um hospital. O caso foi registrado na Delegacia de Homicídios da Capital.
Em segundo lugar no ranking dos passageiros mais afetados pela violência estão os que usam o ramal de Japeri, que sai do Centro do Rio para a Baixada Fluminense. Ao longo do período analisado, 537 viagens tiveram atrasos ou foram canceladas. Em terceiro lugar, aparece o ramal de Saracuruna, com 489 cancelamentos ou atrasos. Em seguida aparecem, os ramais de Saracuruna ( 489 ), Deodoro ( (341) e Belford Roxo (43).
Os dados que apontaram Santa Cruz como o ramal que mais sofreu com a violência, fazem parte de um total de 10.037 justificativas, apresentadas pela SuperVia a Agetransp, por conta de atrasos e supressões anotadas, entre janeiro e maio de 2018. De acordo o documento, os problemas de segurança pública representaram 29% do total de atrasos justificados apresentados pela concessionária.
Mesmo sem saber da existência do levantamento, parte dos passageiros do ramal de Santa Cruz já tem conhecimento de que o trecho é sujeito a atrasos e cancelamentos de viagens.
Um estudante de 19 anos, que usa mora em Santa Cruz e usa diariamente o trem para chegar ao Centro do Rio, sentiu os efeitos do problema, há duas semanas.
—Ando de trem de segunda a sexta-feira e todo o dia tem atras. Há duas semanas passei por um susto grande. Desembarquei na estação tancredo neves e um tiroteio estava acontecendo. Eu e os outros passageiros corremos e ainda bem que ninguém ficou ferido —disse o estudante, que teve o nome preservado pela reportagem por medida de segurança.
Já as amigas e estudantes Suryane Monteiro,de 20, e Ingrid Monteiro, de 23, reclamam que o Ramal de Saracuruna/Gramacho, além dos constantes atrasos, está sempre cheio no horário da manhã.
— Está sempre com algum tipo de atraso. Nesta quarta-feira mesmo, o trem que costuma passar às 7h07 passou às 7h10. Veio cheio e a gente teve de vim em pé. É sempre assim — disse Suryane, que embarca sempre na estação da Penha e desembarca em São Cristóvão, onde faz um curso técnico.
A reportagem procurou o gabinete da intervenção federal, a Secretaria de Segurança e a Polícia Militar para comentar o assunto. Apenas a PM se pronunciou sobre o caso. Segundo a nota, “ as forças da corporação seguem atuando diariamente no árduo trabalho de executar o patrulhamento no Rio e os marginais têm atacado os policiais durante a execução de suas atribuições. Abaixo a íntegra do documento.
“A Assessoria de Imprensa da Polícia Militar informa que as forças da Corporação seguem atuando diariamente no complexo e árduo trabalho de executar o patrulhamento ostensivo em todo o território do estado do Rio de Janeiro. Diante desses contínuos esforços, grupos de marginais da lei insistem nas tentativas de impor seu domínio territorial e atacam covardemente os policiais durante a execução de suas atribuições. Diante de tal cenário de enfrentamento, os confrontos armados, muitas vezes, tornam-se inevitáveis. Porém, a Corporação segue trabalhando de maneira incessante para minimizar tais incidentes, condicionando sua atuação a ações pontuais e com base em trabalhos de Inteligência. Para o sucesso e a evolução dessa estratégia, a colaboração da população através de denúncias que levem à prisão dos envolvidos nesses episódios é crucial. Nossos canais seguem de maneira permanente à disposição: Central 190 / Disque Denúncia: (21) 2253-1177. O anonimato é garantido.”
Procurada, a SuperVia disse que a segurança pública é uma atribuição do governo estadual, que atua nos trens e estações por meio dos seus grupamentos militares. Abaixo, a íntegra do documento.
“A SuperVia reforça que a segurança pública é uma atribuição do Governo do Estado, que atua nos trens e estações por meio dos seus grupamentos militares. A concessionária lamenta que a insegurança que atinge todo o estado seja também observada no sistema ferroviário, atrapalhando a operação dos trens, da qual dependem milhares de pessoas, e colocando em risco a integridade de passageiros e funcionários.”
Fonte: O Globo, 30/08/2018
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