Apesar de a SuperVia alegar prejuízos com a queda no volume de passageiros, provocada pelas medidas impostas pela pandemia do novo coronavírus, quem utiliza os trens diariamente convive com uma rotina de superlotação, inclusive fora dos horários de pico. Usuários reclamam da desobediência aos intervalos e da necessidade de baldeações, que tornam as viagens mais longas em vagões cheios, desrespeitando as regras de distanciamento para evitar a contaminação pelo coronavírus.
O Sindicato dos Ferroviários diz que esses problemas são resultado da redução de frota em todos os ramais. Isso acontece, segundo o presidente do sindicado, Valmir Lemos, o Índio, porque pelo menos 800 dos cerca de três mil funcionários da concessionária tiveram que se afastar por integrarem o grupo de risco da Covid-19.
– Nossa preocupação foi proteger o trabalhador. Sabíamos que ia atingir a frota, não tem jeito – lamentou Índio, acrescentando que o afastamento dos funcionários com mais de 60 anos ou comorbidade foi em obediência a um termo firmado no mês passado entre o Sindicato e a SuperVia e cujo aditivo, garantindo a preservação dos salários, seria assinado nesta sexta-feira.
No entanto, Lemos não soube afirmar de quanto foi a redução da frota. Enquanto isso, quem depende do transporte diariamente sofre. A reportagem acompanhou uma viagem no ramal Japeri na manhã de quinta-feira e constatou que as composições circulam cheias, com passageiros em pé e espremidos uns contra os outros, num flagrante risco sanitário, uma vez que nem todos usavam máscara. Havia tanta gente nos vagões, que nem os camelôs, figuras comuns nos trens, tinham espaço para circular vendendo suas mercadorias.
– Pego o trem todos os dias, e ele nunca chega no horário. Passa sempre com atraso, o que faz com que as estações e os trens fiquem lotados. Além disso, tem a baldeação em Nova Iguaçu, fazendo com que os vagões fiquem ainda mais cheios. Acho que os trens estão circulando mais cheios do que antes da pandemia – diz a a recepcionista Juliana Morais, de 34 anos, que mora em Engenheiro Pedreira e trabalha em Nova Iguaçu, na Baixada.
Passageiros de outros ramais também se queixam dos mesmos problemas. O gestor de logística Douglas Mendonça, de 32 anos, utiliza o de Saracuruna. Na quinta-feira, por volta das 9h20, ele estava viajando em pé no trem que o levava de Gramacho para a Central. De acordo com informação da própria SuperVia, o pico matinal nesse ramal se concentra das 5h às 8h.
– A gente tem percebido um acúmulo maior de pessoas tanto nos trens como nas plataformas, assim como intervalos maiores. Acho que reduziram o número de composições. Talvez maquinistas estejam de férias ou em suspensão de contrato. Não tem como a gente saber. O certo seria aumentar a frota para promover um espaço maior entre as pessoas e não ter aglomeração – sugere o morador de Saracuruna, reclamando que a falta de um trem direto até a Central o obriga a fazer baldeação em Gramacho, onde já entra num trem lotado.
Além de disponibilizar informações sobre a queda de passageiros em sua página na internet, a SuperVia tem divulgado boletins diários, com informações sobre o dia anterior. O desta sexta-feira apontava uma perda de 308.812 passageiros ocorrida na quinta-feira, o que corresponde, segundo a concessionária, a uma redução de 51, 2% de usuários em relação a uma quinta-feira comum, antes da pandemia. No acumulado de 14 de março até agora, a perda total estava em 36.122.453 passageiros.
Secretaria diz que não há superlotação
Em junho, a SuperVia colocou em pratica mudanças no modelo de operação de trens dos ramais de Santa Cruz e Japeri. A medida, segundo a concessionária, tinha a finalidade de evitar aglomerações, diminuir os intervalos e proporcionar mais rapidez nas viagens na retomada das atividades. Com a mudança, os trens de Santa Cruz, por exemplo, passaram a atender todas as estações do ramal de Deodoro, sem o serviço expresso.
Passageiros se queixam que as viagens ficaram mais longas. As reclamações deram origem a uma vistoria no ramal, realizada por representantes da Câmara Técnica da Agetransp e integrantes da Comissão de Transportes da Alerj. Na ocasião, a Agetransp disse que a fiscalização no trecho teria acompanhamento diário para verificar não só o tempo de viagem, mas o intervalo entre os trens.
O deputado Dionísio Lins, presidente da Comissão, disse que, nesta segunda-feira, vai encaminhar um ofício à concessionária pedindo que seja enviado para o grupo da Alerj, no prazo de 72 horas, a grade com o horário dos trens de todos os ramais ativos e o número de composições que os atende:
– Estamos percebendo que vem aumentando o número de reclamações no que diz respeito à dificuldade de embarcar em trens e ônibus. Creio que esteja havendo uma redução de composições nos ramais em alguns horários. Se a concessionária afirma que houve redução no número de passageiros devido à Covid 19, é meio que incoerente ela também reduzir o número de carros, quando na verdade deveria aumentar para evitar aglomerações. Os usuários não precisam passar por esse constrangimento.
Apesar das queixas dos usuários, a Secretaria estadual de Transporte garante que a taxa de ocupação dos trens está abaixo de 50%, número determinado pelo estado durante a pandemia (decreto 47.108), e que no ramal Japeri, no pico da manhã, está em 40%. Segundo a pasta, os dados são enviados diariamente para a Agetransp.
A Agetransp afirma que “as mudanças realizadas no período da quarentena estão passando por um grande estudo técnico, onde serão verificados os impactos na prestação dos serviços e no atendimento aos usuários. Estão sendo analisadas desde as reduções de oferta e de demanda até o afastamento de pessoal por motivos de doença e de prevenção ao Covid-19”.
Confira abaixo as notas na íntegra.
Nota da Secretaria de Transporte:
“A Secretaria de Estado de Transportes informa que a taxa de ocupação dos trens está abaixo dos 50% determinados pelo Governo do Estado (decreto 47.108) durante a pandemia. No ramal Japeri, por exemplo, a taxa média de ocupação no pico da manhã está em torno de 40%. Esses dados são enviados pela Concessionária diariamente para acompanhamento. Cabe à Agência Reguladora (Agetranp) fiscalizar o cumprimento dessa lotação máxima (a Agetransp, inclusive, confirma que a taxa tem se mantido inferior a 50%).
Ressaltamos que não só a SuperVia, mas todo o sistema de transportes agoniza financeiramente por conta das necessárias medidas de isolamento nos últimos quatro meses que afastaram passageiros e despencaram com as receitas. Para não colapsar, o Governo do Estado tem mantido agendas constantes com representantes do setor, com diferentes estados que também enfrentam a mesma crise e com o Governo Federal. O objetivo é garantir verba federal para socorrer os modos de transportes, que alegam caixa disponível até agosto. A paralisação comprometeria fortemente a rotina da população e a retomada da economia.
Na próxima semana, deverá ser apresentado e aprovado na Câmara de Deputados um Projeto de Lei que destinará recursos para a mobilidade urbana nacional”.
Nota da Agetransp:
“Todas as mudanças realizadas no período da quarentena estão passando por um grande estudo técnico da Agetransp, onde serão verificados os impactos na prestação dos serviços e no atendimento aos usuários. Estão sendo analisadas desde as reduções de oferta e de demanda até o afastamento de pessoal por motivos de doença e de prevenção ao Covid-19.
No decorrer da quarentena, iniciada em março, os técnicos da Agetransp fiscalizam diariamente os ramais da Supervia e as linhas do Metrô Rio e da CCR Barcas. Em razão de relatórios prévios, já foram alteradas em oito vezes os intervalos nos ramais da Supervia (com redução). Inclusive, foram realizados ajustes necessários para que o funcionamento das concessionárias pudesse se adequar às regras vigentes com os decretos do Governo do Rio de Janeiro.
No trabalho de campo desta semana, os fiscais da Agetransp constataram falhas em quatro trens durante dois dias, o que provocaram atrasos em partidas e intervalos irregulares, além de trens mais cheios e passageiros à espera nas plataformas”.
Fonte: Jornal Extra, 25/07/2020
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